Transtorno pouco conhecido que une bulimia e diabetes pode ser perigoso
Pouco conhecida, a diabulimia é um transtorno que acomete, em sua maioria, mulheres jovens que têm diabetes tipo 1 e boicotam o tratamento com insulina para não engordar. Assim, elas agem de forma similar às que sofrem de bulimia -- e tentam compensar a ingestão alimentar com algo que leve à perda de peso, como a indução de vômitos, o uso de laxantes, ou a prática excessiva de atividade física.
Sinais de alerta
Recusa em seguir as orientações médicas para aumentar a dose de insulina |
Controle metabólico instável |
Hiperglicemia (constante) |
Dislipidemia (aumento dos níveis de triglicerídeos e colesterol) |
Perda de peso |
Cetoacidoses recorrentes (descompensação aguda do diabetes por hiperglicemia) |
A pessoa evita que os pais observem a autoaplicação de insulina |
Complicações microvasculares de início precoce |
Segundo a endocrinologista Claudia Pieper, consultora da ADJ Diabetes Brasil (Associação de Diabetes Juvenil), as jovens sabem que a hiperglicemia constante provoca perda de glicose na urina e emagrecimento.
“A diabulimia, na realidade, pode ocorrer devido a uma insatisfação com o peso adquirido quando se inicia uma insulinização mais intensiva. Com isso, elas simplesmente passam a omitir ou a diminuir a dose de insulina", explica a médica.
"Outras vezes, podem também forçar vômitos ou praticar atividade física em excesso”, acrescenta.
O psiquiatra Adriano Segal, diretor de Psiquiatria e Transtornos Alimentares da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade), esclarece que a diabulimia não é um transtorno alimentar reconhecido. Ela é classificada como Tasoe (Transtornos Alimentares Sem Outra Especificação).
"Trata-se de uma variação da bulimia nervosa, em pacientes com diabetes insulinodependente ou diabetes tipo 1, que deixam de usar adequadamente a insulina para evitar o eventual ganho de peso que o uso pode acarretar. O perfil geral parece bastante com o da bulimia nervosa, associada à presença da doença."
Por ser considerada uma variação, não se pode acertadamente falar em prevalência da diabulimia. Mas Segal diz que ela varia de 11% a 39% das pessoas com diabetes tipo 1. "Suas consequências são ainda mais graves do que as de sua inspiradora: lesões associadas ao diabetes 1 são graves e algumas, irreversíveis".
Para saber mais:
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Primeiro caso
O primeiro caso de diabulimia foi descrito em 1973, nos Estados Unidos. Porém, hoje, com a ajuda da web, o transtorno vem aumentando, graças à troca de informações pelas redes sociais.
Segal, no entanto, vê um aspecto positivo: "O lado bom é que não só as informações deletérias estão disponíveis; as pessoas podem ser instigadas a procurar por notícias úteis".
A consultora da ADJ explica que a correlação entre transtornos alimentares e diabetes está ligada à insatisfação com a imagem corporal e ao desejo de perder peso. Também são comuns pensamentos obsessivos sobre comida e a crença de que o diabetes impede um autocontrole.
“Para piorar, pessoas com diabetes têm uma possibilidade única de manipular por vontade própria (deliberadamente) a dose de insulina para perder peso”, afirma a médica, que acaba de lançar o livro “Diabulimia: uma combinação perigosa” (Editora Editora AC Farmacêutica).
Complicações
Pieper explica que, quando o paciente com diabetes apresenta o transtorno, há o aparecimento de complicações agudas e crônicas decorrentes dos constantes níveis elevados de glicemia. “Com a falta de insulina necessária, os níveis de glicose aumentam no sangue e o excesso passa a ser eliminado pela urina. Como consequência, ocorre a utilização de outras reservas de energia do organismo, como gordura e músculos”.
Prevalência da omissão intencional da dose de insulina para perder peso
Meninas de 9 a 13 anos: 2%* |
Pré-adolescentes e adolescentes de 12 a 19 anos: 11%* |
Adolescentes e adultas jovens de 16 a 22 anos: 34%** |
Mulheres de 18 a 30 anos: 40%** |
*Jones JM, Daneman D. BMJ 2000;320:1563-1566 |
** Stancin T and Cols Diabetes Care 1989;12:601-603 |
De forma mais imediata, pode ocorrer a cetoacidose diabética - descompensação aguda do diabetes -, que envolve hiperglicemia e desidratação. É alto o risco de hipoglicemias graves quando as pacientes deixam de se alimentar corretamente ou quando fazem exercícios em excesso, mesmo mantendo o esquema de insulina prescrito.
As hipoglicemias graves podem causar internações de repetição, puberdade atrasada e complicações crônicas precoces.
Casos do transtorno em pessoas com diabetes tipo 2 são menos comuns, mas também existem. A endocrinologista diz que isso é mais comum em mulheres que entram na menopausa e costumam engordar. “Elas têm tendência a apresentar transtornos alimentares e fazem como as mais jovens, que manipulam a dose de insulina”.
Tratamento
Segal explica que o tratamento deve se debruçar sobre a normalização dos hábitos alimentares, da atividade físicase do uso da insulina, além de levar em conta outras doenças (como depressão, por exemplo) que podem estar associadas. "Endocrinologista, psiquiatra e nutricionista são a 'equipe mínima' adequada", aconselha.
Quanto à duração do tratamento, o psiquiatra diz que não há estudos específicos, mas, provavelmente, deverá ser crônico. "Se a pessoa com diabulimia se comportar como a que tem bulimia, o transtorno será recorrente e o estado de alerta permanente é a melhor pedida. Mas, novamente, não há pesquisas suficientes sobre o tema ainda".
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