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Em Belém, pacientes com covid passam dias em poltronas à espera de UTI

A jornalista Lucélia Fernandes, morta na quinta pela covid e falta de UTI - Arquivo Pessoal
A jornalista Lucélia Fernandes, morta na quinta pela covid e falta de UTI Imagem: Arquivo Pessoal

Luciana Cavalcante

Colaboração para o UOL, em Belém

27/03/2021 04h00

Familiares relatam agravamentos de casos de covid-19 em Belém pelas longas esperas por leito de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) na rede privada.

Alguns pacientes passam dias instalados em cadeiras. Foi o caso da jornalista Lucélia Fernandes, que morreu na quinta-feira (25).

Aos 63 anos, diabética, hipertensa, com um aneurisma, estando acima do peso e com 50% de comprometimento no pulmão, passou três dias na poltrona de uma unidade da Unimed.

Foi transferida para uma espécie de enfermaria e viu seu quadro se agravar. Quando foi liberada a vaga, ela estava em estado grave e teve de ser intubada.

"A gente solicitou o leito no dia 19. Se tivesse um atendimento melhor naquela data, e não dois dias depois, teria evitado a intubação. Tudo o que ela passou é consequência do tempo que ficou esperando", disse a filha Rafaela Fernandes.

Morreu devido às complicações da doença. A família também relatou problemas com o plano de saúde para liberar um exame. "Só soube que não tinham liberado o exame porque fui lá. Como podem pedir autorização para um exame que é rotina na UTI? Disseram que tinham um prazo de 72 horas para liberar. Se é para um paciente da UTI, tem que autorizar logo", afirmou.

Avaliação feita por médico particular

A nutricionista Keilla Sulivan colocou sua indignação no Instagram pela falta de leito de UTI para a mãe, a servidora aposentada Maria de Lourdes bezerra de Souza, 75. Ela chegou à Unimed no dia 17.

Pelas redes sociais, faz relatos diários dos problemas: acomodações ruins, espera por UTI e falta de informações sobre os familiares.

Na quarta, ela foi para a UTI. Mas também ficou nas poltronas da Doca (unidade de atendimento da Unimed) por três dias.

"Tivemos de contratar um médico particular para fazer uma avaliação dela. Ele disse que ela estava em sofrimento, que precisava ser intubada para garantir que tivesse uma chance de sobreviver", conta.

O leito só veio depois de duas decisões judiciais. A última dava prazo de 24 horas para ser cumprida ou a empresa seria multada.

A filha conta que a saúde da mãe foi se deteriorando. "Ela teve uma piora considerável comparando duas tomografias. A do dia 16 estava com 50% de comprometimento do pulmão. No dia da intubação, já estava com 90%."

O pai da nutricionista também enfrentou demora para conseguir um leito. Não deu tempo. João Matos de Souza, 75, morreu em 21 de março. "Ele entrou no hospital no dia 13 muito apnéico, mas já tinha problema pulmonar. Ficou três dias numa poltrona sofrendo. Foi direto para a UTI e não resistiu", afirmou.

O professor Glauber Tadaiesky acompanha o estado do pai, Edmilson Malheiros Marques, 79, desde 9 de março, quando entrou na Unidade de Atendimento Unimed Doca. Três dias depois, foi transferido para a Unidade de Graves do hospital.

"Essa unidade é improvisada. É uma sala com várias camas, com pacientes intubados. Não tem nenhum isolamento. Se fosse uma UTI de verdade, ele poderia ter tido melhora mais rápida", reclama. Segundo o último boletim médico, seu estado é considerado grave, mas estável.

O MPF (Ministério Público Federal) e as Defensorias Públicas do Pará e da União apuram denúncias como essas sobre o atendimento aos usuários da Unimed Belém.

Foram requisitadas por esses órgãos informações sobre as providências que foram tomadas diante de sucessivas negativas de prestação de serviço de urgência.

A Unimed Belém não comentou. Em nota, declarou apenas que "o fluxo de atendimento de pacientes com casos suspeitos e confirmados de covid-19 aumentou e a taxa de ocupação de leitos ficou sobrecarregada".

Segundo a empresa, foram criados mais de cem leitos estruturados em vários hospitais, mas, "diante do cenário crítico da pandemia, a procura é maior do que a oferta, não só em Belém, mas em todo o Brasil".

Veja a nota na íntegra:

"A Unimed Belém se solidariza com todas as famílias que passam por este momento difícil, de crescimento nos números da pandemia no país.

Na capital paraense, o fluxo de atendimento aos pacientes com casos suspeitos e confirmados de covid-19 aumentou e, consequentemente, a taxa de ocupação de leitos ficou sobrecarregada.

Para suprir essa demanda, nos últimos dias, mais de cem leitos foram estruturados, em diversos hospitais da rede prestadora, e um anexo está pronto na unidade Doca, além de mais dois em fase de construção nas unidades Batista Campos e BR.

A Cooperativa Médica frisa que concentra esforços na busca por mais leitos aos beneficiários, mas, diante do cenário crítico da pandemia, a procura é maior do que a oferta, não só em Belém, mas em todo o Brasil.

Além disso, para ajudar no suporte às unidades de pronto-atendimento, além da clínica ParqueMed, localizada na rodovia Augusto Montenegro, as clínicas Unigastro, no Umarizal, e Unineuro, na Pedreira, passaram a atender, exclusivamente, os clientes da Cooperativa com os sintomas leves da doença, desde o último dia 12.

Por fim, a Unimed Belém afirma que possui corpo médico capacitado e todos os aparelhos necessários para prestar assistência aos seus pacientes. Inclusive, a pressão arterial de todos é aferida com frequência".