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Longe do esplendor turístico, a Baía de Guanabara é o retrato da poluição

Em Magé

11/06/2012 14h08

Distante da imagem de cartão postal que encanta turistas, a baía de Guanabara revela uma paisagem dominada pela sujeira, onde pescadores lutam para sobreviver do mar.

"Antigamente, um dia de pesca rendia 300 quilos de peixe e pagava entre R$ 80 e R$ 100. Hoje, quando dá, o pescador tira 30 quilos e ganha entre R$10 e R$30", relata à AFP Milton Mascarenhas Filho, 62 anos, pescador há 29, presidente da colônia de pesca de Magé, cidade a 60 km do Rio de Janeiro, localizada no norte da baía.

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Milton atribui a mudança à poluição industrial, especialmente ao vazamento de cerca de 1 milhão de litros de óleo após acidente na refinaria da Petrobras no município vizinho de Duque de Caxias, em janeiro de 2000.

"Apesar da poluição, ainda dá para sobreviver da pesca. O difícil é o lixo", reclama Cláudio Batista, de 48 anos, pescador desde os 10, enquanto retira da rede alguns poucos peixes entre pedaços de plástico.

A quantidade de resíduos, sobretudo garrafas PET, flutuando na água, impressiona, mas nas margens e nos mangues se encontra de tudo: de roupas e calçados a sofás e tubos de televisão.

Os detritos, afirma Milton, são trazidos ao mar pelos rios das cidades vizinhas, que contaminam a água e danificam redes e 'currais', armadilhas artesanais utilizadas para capturar o pescado.

"Uma imensa latrina"

A baía de Guanabara hoje é "uma imensa latrina e lata de lixo", critica o biólogo Mário Moscatelli, que desde 1997 denuncia a degradação ambiental na cidade e no estado do Rio.

"É muito afetada pela grande carga orgânica que recebe dos rios que sofrem lançamento de esgotos sanitários indiscriminadamente", admite Gerson Serva, coordenador de um projeto de saneamento da baía, a cargo do governo estadual.

Serva explica que os quinze municípios com rios que deságuam na Baía de Guanabara lançam ali 20 mil litros por segundo de esgotos. Deste total, cerca de um terço é tratado e outros 10% sofrem um processo natural de decomposição.

O problema é antigo, mas a solução parece distante.

Lançado durante a ECO-92, o Programa de Despoluição da Baía de Guanabara consumiu cerca de US$ 1 bilhão em recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), da Agência de Cooperação Internacional do Japão (JICA), com contrapartida do governo do estado. O PDBG previa instalação de redes coletoras, ligações domiciliares e estações de tratamento de esgoto, mas 20 anos depois, está inacabado.

"O PDBG foi o maior programa de saneamento já desenvolvido no estado do Rio de Janeiro, entretanto teve muitas falhas em sua gestão e deixou um conjunto de obras inacabadas", reconhece Gerson Serva.

"Esse programa é o resultado mais claro da certeza da impunidade governamental onde o administrador público tem certeza de que pode fazer praticamente tudo com o dinheiro público que não lhe acontecerá praticamente nada", acusa Moscatelli.

Recentemente, o governo estadual assinou novo contrato com o BID para outro programa voltado para a baía, o Plano de Saneamento Ambiental dos Municípios no Entorno da Baía de Guanabara (PSAM), que Serva coordena.

Com orçamento de US$ 640 milhões, o plano prevê construção, ampliação e melhoria da rede de esgoto no centro e na zona norte da cidade do Rio e municípios vizinhos da Baixada Fluminense e São Gonçalo.

Uma aposta na recuperação dos manguezais

Para Moscatelli, resolver o problema, atacando as causas, exigiria políticas públicas de habitação, transporte e saneamento pelos próximos 15 a 20 anos. Mas, afirma, ações de curto prazo, como a recuperação de manguezais, permitem enfrentar as consequências da degradação.

Há 12 anos, o projeto Mangue Vivo, instalado em Magé, tem como meta recuperar a vegetação destruída pela contaminação e pelo desmatamento às margens da baía.

O projeto, sob responsabilidade da ONG Onda Azul, se concentra em parte do total de 1,64 km2 que precisam ser recuperados, e visa a transformar a área reflorestada em um parque ecológico aberto à visitação, mas enfrenta problemas de financiamento, enquanto a retirada do lixo que se acumula no local atrasa o replantio.

Adeimantus da Silva, coordenador do trabalho de campo, e José dos Santos, ambos funcionários da ONG, inventaram um envoltório de garrafas PET para proteger as mudas dos predadores, que é retirado quando a planta está crescida. Graças à técnica, 120 mil m2 de mangue foram reflorestados e uma segunda área de 160 mil m2 teve 40% da vegetação recuperada.

"O mangue é um verdadeiro berçário marinho. Temos um grande número de aves, mamíferos e répteis já catalogados. Peixes de espécies comerciais, como tainha e corvina, e 70% dos caranguejos que viviam no local se reproduzem e já são encontrados no manguezal recuperado", comemora Silva.