Topo

Empresa imprime orelhas e narizes em 3D e almeja produzir órgãos humanos para transplante

Impressora usa biotinta para produzir cartilagens e pele com células humanas - Cellink/BBC
Impressora usa biotinta para produzir cartilagens e pele com células humanas Imagem: Cellink/BBC

Maddy Savage

Da BBC em Gotemburgo, na Suécia

19/11/2017 16h31

Erik Gatenholm aperta o botão "start" na impressora 3D. Ele vai produzir partes do corpo humano em tamanho real.

Em ritmo frenético, a agulha da impressora rabisca uma placa de Petri com tinta biológica azul, que contém células humanas. Em cerca de meia hora, é possível ver um nariz surgir sob a luz ultravioleta.

Gatenholm, de 28 anos, é cofundador da Cellink, empresa sueca de pequeno porte líder no mercado global de bioimpressão.

Atualmente, a aplicação biomédica da tecnologia de impressão 3D é voltada para a fabricação de tecidos da pele e cartilagens, usados para testar novos medicamentos e cosméticos.

Mas Gatenholm acredita que, em duas décadas, será possível produzir órgãos humanos para transplante.

"O desafio sempre foi mudar o mundo da medicina", afirma à BBC.

Ex-estudante de administração, Gatenholm foi apresentado às bioimpressoras 3D por seu pai, professor de química e biopolímeros na Universidade Chalmers, em Gotemburgo, na Suécia. Há cerca de um ano, ele criou a Cellink.

Gatenholm enxergou uma oportunidade para produzir e comercializar tinta biológica, líquido ao qual as células humanas são misturadas e então impressas em três dimensões. A Cellink produz essa tinta a partir de celulose, obtida em florestas suecas, e de algina, substância proveniente de algas coletadas no mar norueguês.

Orelha impressa em 3D - Cellink/BBC - Cellink/BBC
Orelha impressa em 3D; biomaterial é usado atualmente para pesquisas acadêmicas e testes farmacêuticos
Imagem: Cellink/BBC

Em 2014, quando Gatenholm foi apresentado às impressoras 3D, a biotinta usada em pesquisas acadêmicas e farmacêuticas era, em geral, produzida internamente pelos próprios pesquisadores, e não era vendida online.

Ele decidiu então comercializar a biotinta usada na Universidade de Chalmers. E criou a primeira empresa do mundo a vender pela internet as biotintas padronizadas, adequadas para misturar com qualquer tipo de célula. Ele venderia o produto junto com impressoras 3D acessíveis.

A Cellink conta hoje com 30 funcionários espalhados por três escritórios nos EUA, além da sede na Suécia. Listada na First North, mercado da bolsa americana Nasdaq para companhias emergentes, tem clientes em mais de 40 países.

Os preços da biotinta variam entre US$ 9 e US$ 299 (entre R$ 30 e R$ 980), enquanto as impressoras são vendidas por até US$ 39 mil (R$ 128 mil). Por enquanto, os principais compradores são instituições acadêmicas americanas, asiáticas e europeias, incluindo a Universidade de Harvard, o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e a University College London.

Mas empresas farmacêuticas também têm se interessado pelo produto, visto como uma alternativa para testes de medicamentos que hoje são feitos em animais.

Erik Gatenholm (à esq.) expandiu seu negócio da Suécia aos EUA - Cellink/BBC - Cellink/BBC
Erik Gatenholm (à esq.) expandiu seu negócio da Suécia aos EUA
Imagem: Cellink/BBC

Controvérsias

Esse crescimento, porém, esbarra em algumas polêmicas.

Especialistas acreditam que a bioimpressão poderá ser usada para criar órgãos para transplantes num prazo de 10 a 20 anos, aplicação que levantará debates éticos consideráveis.

"Muitas pessoas podem achar que a bioimpressão equivale a 'brincar de ser Deus'", admite Gatenholm.

Pesquisadores do setor levantam algumas perguntas inquietantes ainda sem resposta: quão seguros e eficazes serão esses órgãos? Será que essa tecnologia poderá ser usada para produzir órgãos mais potentes do que os que temos atualmente, criando "super-humanos"?

Gatenholm afirma que, atualmente, sua equipe se esforça para respeitar as legislações específicas dos países para os quais exporta a biotinta e que defenderá regulamentações rígidas à medida que esse mercado evoluir. O objetivo principal, diz ele, será resolver o atual déficit de órgãos para transplantes no mundo.