Depois da Mãe do PAC, o Pai da Isenção (de IR)
Passaram-se seis semanas entre a entrega das medidas de ajuste fiscal por Fernando Haddad a Lula e o sinal verde do presidente para que elas fossem anunciadas. Quando foram liberadas, Lula convocou uma cadeia de rádio e TV e mandou Haddad dar a má notícia. O presidente ainda meteu a isenção de Imposto de Renda para ganhos até R$ 5 mil por mês no pacote do ministro.
"Foi ruim, mas foi bom", diríamos na Grande Matão.
O tema é um dos destaques do episódio desta semana do A Hora, podcast de notícias do UOL com os jornalistas Thais Bilenky e José Roberto de Toledo, disponível nas principais plataformas. Ouça aqui.
Na avaliação da Faria Lima, "Haddad está desprestigiado, por isso o dólar disparou". Conversa fiada. A alta tem meses. Começou em março e se acelerou em outubro, quando a agência de risco Moody's melhorou a nota de crédito do Brasil. Foi também quando o ministro começou a falar de corte de gastos. Não foi a fala que puxou o dólar. Mais provável que tenha sido o oposto. Em oito meses, o dólar foi de R$ 5 para R$ 6, alta de 20%, cinco vezes a inflação.
Especulações políticas e cambiais à parte, Haddad recebeu uma lição e uma missão de Lula. A soma de ambas tende a ser positiva, muito positiva, para o ministro - desde que ele aprenda a primeira e cumpra a segunda.
A lição - uma história é sempre mais interessante que um cardápio:
Haddad ofereceu uma lista de cortes de gastos possíveis, pediu ao presidente para escolher entre eles e dizer a sua ordem. Foi em 14 de outubro. Lula não escolheu. Mostrou a Haddad que ele não queria um garçom que lhe entregasse um cardápio, mas um narrador que lhe oferecesse uma história para contar.
O último mês e meio de idas e vindas de Haddad ao palácio foi gasto afinando a história que seria contada ao público. O enredo era quase de tragédia, só más notícias, mas Lula insistiu que houvesse alívios dramáticos no meio da trama. Depois, estendeu os "sacrifícios" a todos - de militares a juízes. Finalmente, incluiu uma boa notícia com potencial de ofuscar as más.
Conseguiu, em parte. Dezenas de milhões de contribuintes vão ficar felizes em 2026 quando não se virem isentos de pagar Imposto de Renda, justo no ano da eleição do sucessor de Lula. A Faria Lima chiou. Mas chiaria de qualquer jeito.
A missão - vender a história para a sociedade e para o Congresso:
Ao por Haddad na frente das câmeras e microfones para apresentar, sozinho, o pacote de maldades e bondades, Lula ofereceu uma oportunidade de ouro para o ministro aparecer. É também um teste, o famoso "se afunda ou se consagra".
Céticos dirão que Lula usou Haddad como boi de piranha: vai na frente que eu já vou. Para que ele fosse devorado enquanto Lula passa ao largo, ileso.
Não faz sentido. Haddad é o "plano B" de Lula, caso ele não queira ou não possa se candidatar à reeleição. Lula não tem "plano C". Não há outros presidenciáveis à vista no campo petista. Por que queimá-lo já?
Após o grave acidente doméstico que provocou um coágulo no crânio, o incidente apavorante com o avião presidencial e a revelação do plano para matá-lo, Lula sabe, mais do que nunca, que precisa de um "plano B".
Mesmo para o "plano A" dar certo, a melhor chance de Lula conseguir se reeleger é ter a economia estável e crescendo em 2026. Será muito mais difícil conseguir isso sem Haddad do que com Haddad na Fazenda.
Newsletter
OLHAR APURADO
Uma curadoria diária com as opiniões dos colunistas do UOL sobre os principais assuntos do noticiário.
Quero receberA missão de Haddad não é nada fácil, porém. Ele precisará de muita habilidade política e narrativa para convencer a sociedade e, principalmente, os parlamentares a cortarem gastos. Mas Haddad conseguiu o que nenhum outro ministro da Fazenda conseguiu em 35 anos: aprovar uma reforma tributária.
O impossível às vezes acontece.
Se acontecer de novo, Haddad não será a Mãe do PAC, como foi Dilma Rousseff em 2010, mas o Pai da Isenção (do IR).
Em 2026? Ninguém sabe. Nem o Lula.
Podcast A Hora, com José Roberto de Toledo e Thais Bilenky
A Hora é o podcast de notícias do UOL com os jornalistas Thais Bilenky e José Roberto de Toledo. O programa vai ao ar todas as sextas-feiras pela manhã nas plataformas de podcast e, à tarde, no YouTube. Na TV, é exibido às 16h. O Canal UOL está disponível na Vivo TV (canal nº 613), Sky (canal nº 88), Oi TV (canal nº 140), TVRO Embratel (canal nº 546), Zapping (canal nº 64) e no UOL Play.
Escute a íntegra nos principais players de podcast, como o Spotify e o Apple Podcasts já na sexta-feira pela manhã. À tarde, a íntegra do programa também estará disponível no formato videocast no YouTube. O conteúdo dará origem também a uma newsletter, enviada aos sábados.
Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.