Topo

Balaio do Kotscho

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

A Guerra do Fim do Mundo: quem vai apertar o botão primeiro?

Bunker em estacionamento da Ucrânia; a população civil é sempre a maior vitima da guerra - Reprodução/GloboNews
Bunker em estacionamento da Ucrânia; a população civil é sempre a maior vitima da guerra Imagem: Reprodução/GloboNews

Colunista do UOL

28/02/2022 14h05

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Deu branco total. Desde que Putin invadiu a Ucrânia com as "tropas de paz", há dias não consigo escrever uma única linha. É muito raro isso acontecer comigo. Eu sempre preciso ter alguma coisa para contar. Afinal, vivo disso há quase 60 anos.

Descendente de russos, por parte de pai, e de alemães, por parte de mãe, não posso nem ouvir falar em guerra. Passei minha infância ouvindo as histórias dos meus pais e avós contando os horrores da Segunda Guerra Mundial.

A família paterna dos Kotscho foi perseguida pelos comunistas e se refugiou na Romênia, onde meu pai nasceu, enquanto a família materna, dos Rebholz-Heinz, perseguida pelos nazistas, veio se refugiar aqui no Brasil, onde eu nasci. De guerra, eu entendo.

Tenho dormido mal e acordado com pesadelos. Até me esqueci que por aqui estamos em pleno carnaval. Aliás, não estamos, pelo segundo ano seguido, porque os folguedos foram cancelados pela pandemia, não pela guerra, as duas pragas que assolam a humanidade nesse início de século de 21. Os sambódromos estão em silêncio, enquanto as bombas explodem do outro lado do mundo.

No domingo, depois de passar o dia vendo futebol e guerra na TV, fui dormir com a notícia de que Putin mandou colocar de prontidão seu arsenal nuclear, em resposta à Otan, que está mandando armamento pesado para a Ucrânia e ameaçando varrer a Rússia do mapa com sanções econômicas.

Até a Alemanha materna, que fugia de uma guerra como o diabo da cruz, desde o grande trauma de 1939-1945, que dizimou e espalhou pelo mundo parte da minha família, resolveu ontem triplicar o orçamento para reequipar suas Forças Armadas, que estavam em desuso. E já prometeu mandar caças e armamentos pesados para a Ucrânia, assim como outros países da Otan.

O mundo enlouqueceu, de novo. Não importa quem sejam os contendores desta vez, mas numa guerra ninguém costuma ter razão, perdem todos, principalmente as populações civis, que correm para os bunkers com suas crianças. Só quem sempre ganha com isso são as indústrias bélicas, que elegem presidentes dos dois lados em conflito.

Deixam pelo caminho milhares, por vezes milhões de mortos e feridos, além de legiões de refugiados, como está acontecendo novamente agora, famílias separadas e destruídas em busca da sobrevivência.

Na parte que nos toca, é assustador saber que no Brasil já temos mais de 500 grupos organizados de neonazistas, como mostrou reportagem do Globo neste final de semana.

Por todo o mundo, inclusive na Rússia, na Alemanha e na Ucrânia eles se multiplicam, sob os mais diferentes disfarces, fazendo das mortes dos outros a sua razão de viver.

Estamos outra vez sob a ameaça de uma Guerra do Fim do Mundo, em que basta um maluco apertar o botão para fazer este planeta explodir e não sobrar ninguém para contar a história. Russos e ucranianos se acusam mutuamente de serem governados por nazistas, e temo que ambos tenham razão.

Não tem santos nessa história, mas sabemos quem são as vítimas dessa insanidade que volta a ameaçar o mundo, 77 anos após o final da "Segunda Guerra", as duas palavras que voltaram à manchete da Folha esta semana, e me deixaram bem assustado.

Nesse momento, oficiais da Rússia e da Ucrânia estão reunidos na Belarus, na fronteira entre os três países, para encontrar uma saída. Não dá para confiar em nenhum deles. Quem faz a guerra não vai para a frente de batalha. Quem morre são sempre pessoas inocentes que só querem ter direito à vida.

No caso da minha família, na Segunda Guerra, uma parte morreu, outra se perdeu e outra se espalhou pelo mundo. A guerra nos tirou o direito à convivência com tios, primos, avós. Até hoje tentamos juntar os cacos e resgatar nossas origens.

Vida que recomeça.