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Escassez de vacina gera troca de acusações entre países emergentes e ricos
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Resumo da notícia
- Proposta da Índia e África do Sul é de que países possam quebrar patentes de vacinas para permitir uma maior produção
- Países ricos são contrários à ideia é impedem um acordo
- O governo do Brasil, na tentativa de negociar um acesso com os indianos, se manteve em total silêncio durante o encontro.
Numa reunião nesta quinta-feira na Organização Mundial do Comércio, países emergentes acusaram o comportamento das economias ricas de ser responsável pela escassez de vacinas contra covid-19 no mundo, principalmente nas regiões mais pobres do planeta.
O encontro foi convocado por conta da proposta indiana e sul-africana de quebrar patentes de vacinas e, assim, permitir que laboratórios pelo mundo possam fabricar versões genéricas. Os países ricos são contra e, ao longo dos últimos meses, o Brasil também deixou claro que iria vetar a ideia. Nesta quinta-feira, porém, o Itamaraty se manteve em um profundo silêncio, na esperança de não afetar as negociações que ocorrem com a Índia para a importação de vacinas.
Mas a reunião foi marcada por uma dura troca de acusações. Para os países em desenvolvimento, a escassez de fornecimento e produção de vacinas é causada pelo uso inadequado das patentes e por acordos secretos entre governos de economias ricas e as empresas farmacêuticas. Hoje, dados da Federação Internacional da Cruz Vermelha indicam que os 50 países mais pobres do mundo receberam apenas 0,1% das vacinas já distribuídas no mundo.
Uma vez mais, porém, a proposta de quebrar patentes foi alvo de um impasse e governos dos países ricos se recusaram a entrar em um debate sobre o texto do projeto.
Para os sul-africanos, depois de meses de debates, era hora de começar a negociar novas regras. Pretória pediu "honestidade" por parte dos demais países. "Não podemos continuar nos envolvendo em discussões intermináveis, enquanto no mundo real milhões de vidas são perdidas para a pandemia do vírus", disse a delegação sul-africana.
Para a África do Sul, sua proposta alavancaria a capacidade global de produção. O país negou o argumento dos ricos de que, se houvesse uma quebra das patentes, não haveria laboratório capaz de fabricar fora de Europa ou EUA.
"De fato, os países em desenvolvimento possuem capacidades científicas e técnicas avançadas, como demonstrado pelos acordos de licenciamento que foram firmados por várias empresas farmacêuticas sediadas no Ocidente com produtores no mundo em desenvolvimento". disse a África do Sul.
A África do Sul indicou que, das 154 vacinas pré-qualificadas pela OMS, 72 delas são produzidas por fabricantes no mundo em desenvolvimento, incluindo não apenas a Índia e a China, mas também Cuba, Tailândia, Senegal e Indonésia.
Genéricos resolveriam escassez
Os países em desenvolvimento ainda tomaram a palavra para enfatizam que a atual escassez de vacinas se deve à subutilização da capacidade de produção existente em vários países emergentes.
De acordo com eles, a OMS acredita que só vacinação de 70% da população poderia quebrar efetivamente a cadeia da propagação da pandemia.
Para o Paquistão, porém, isso requer quase 10,2 bilhões de doses de vacinas, enquanto se estima que os países de baixa renda podem ter que esperar até 2024 para conseguir a vacinação em massa. "É inimaginável o tipo de perda de vidas e da economia que a pandemia causará a esses países nos próximos 3 anos", disse o Paquistão.
Outros países em desenvolvimento alertaram que a falta de vacinas é "artificial" e surgiu da busca por perpetuar o poder de monopólio usando as patentes.
"Na ausência da proteção do segredo comercial, seria possível aumentar em escala maciça as vacinas no menor espaço de tempo possível e as informações necessárias para a vacina não originária podem ser disponibilizadas através da renúncia à proteção do segredo comercial", defenderam. Apoiaram a proposta governos como o do Egito, Nigéria, Jamaica, Paquistão, Tanzânia em nome do Grupo Africano, Zimbábue, Índia, Quênia, Venezuela e Sri Lanka.
Críticas contra a UE: tiro saiu pela culatra
A reunião ainda foi marcada por duras críticas dos emergentes contra a União Europeia por sua recente decisão de introduzir controles de exportação de vacinas contra coronavírus. A medida foi caracterizada como "séria e alarmante".
Para os emergentes, os países que continuam a se opor à quebra de patentes são os mesmos que compraram secretamente a produção disponível e "continuam a conspirar com as empresas farmacêuticas sob o véu do sigilo".
Mas alertam que, mesmo para os países desenvolvidos, a falta de transparência no "modus operandi" de algumas empresas farmacêuticas foi um tiro que saiu pela culatra. "Vemos agora como os filhotes se empoleiraram", disse o delegado sul-africano.
Recusa dos ricos
Os países desenvolvidos deixaram claro mais uma vez que não apoiarão a quebra de patentes. Para os europeus, as leis existentes já são suficientes para lidar com a crise e que precisa haver algum tipo de proteção à inovação. Bruxelas indicou que as preocupações de emergentes podem ser solucionadas por meio de acordos entre empresas, permitindo a produção em outras partes do mundo.
A UE ainda rebateu as críticas que recebeu pelas barreiras impostas. Para o bloco, o investimento em capacidade de fabricação não é apenas para garantir vacinas para os cidadãos da UE, mas também para que as vacinas estejam mais rapidamente disponíveis para todos, em todos os lugares.
Durante o encontro, os europeus reconheceram que enfrentam "dificuldades significativas", mas disseram ter esperança de que a situação melhore gradualmente com mais vacinas chegando ao mercado e mais produção das vacinas já aprovadas.
A UE ainda justificou suas barreiras alegando que se trata de uma resposta à violação dos contratos assinados pelas empresas, já que as doses inicialmente visadas para a UE podem ter sido exportadas para países terceiros. "Isto seria uma clara e inaceitável violação das obrigações legais por parte das empresas em questão, ao mesmo tempo em que atrasaria a vacinação dos cidadãos da UE", disse a delegação europeia.
Por isso é que todos os fabricantes de vacinas deverão declarar as exportações até o final de março de 2021. A UE, porém, garante que essas barreiras serão "proporcionais e não retardarão o comércio de vacinas entre a UE e países terceiros".
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