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Josias de Souza

Barroso diz que Bolsonaro deveria evitar reabertura do comércio por decreto

Colunista do UOL

06/04/2020 14h20

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O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, espera que Jair Bolsonaro se abstenha de editar um decreto presidencial para reabrir o comércio nos Estados que adotaram o isolamento social para conter a propagação do coronavírus. "Tenho a expectativa de que o presidente ouça a área científica e a área técnica do próprio governo e não expeça um decreto neste sentido", disse Barroso, em entrevista ao UOL.

Para Barroso, o isolamento social é vital. "Se essa doença se espalha pelas comunidades pobres brasileiras com velocidade extrema, nós vamos ter um genocídio. Portanto, eu acho que nós adotamos a política correta. Sinto muita falta não só de ir às sessões [do STF], como de dar aulas, de estar com meus alunos, de estar com meus amigos. Todos nós temos que fazer uma certa renúncia a isso porque desta decisão depende a vida das pessoas que não têm acesso ao sistema privado de saúde."

Do ponto de vista formal, afirmou Barroso, o presidente "tem competência para expedir decretos." No entanto, "o mérito desse decreto pode ter que ser aferido pelo Supremo Tribunal Federal." O ministro deu a entender que Bolsonaro pode sofrer um revés judicial caso leve adiante a ideia de interferir na decisão dos governadores.

"Pela Constituição, temas de saúde pública são de competência comum dos três níveis de governo", declarou Barroso. "Portanto, é legítima a atuação da União, do Estado e do município." Ele repetiu: "Tenho a expectativa de que o presidente não vá de encontro à ciência e à experiência mundial. (...) O problema não é a intervenção estatal, mas a má intervenção estatal."

Barroso realçou que países que adotaram o isolamento social tardiamente "sofreram dramáticas consequências." Citou Itália e Espanha. Mencionou também os Estados Unidos: "É gente que tem muito mais dinheiro do que nós", comparou. De resto, lembrou que a Coreia do Sul, graças à "atuação eficiente do seu governo, conseguiu minimizar o problema."

Na semana passada, Barroso proibiu o governo de levar ao ar propaganda sob o mote "O Brasil não pode parar". Ao comentar a decisão, disse: "Vivemos um momento importante de resgate da ciência, de você trabalhar com fatos, com evidências, e não com opiniões, ideologias ou superstições. Uma das consequências positivas dessa tragédia humanitária que estamos vivendo é o regaste dos valores iluministas: razão, ciência, humanismo e progresso para todos."

Acrescentou: "Se nós vivemos um momento em que todo o mundo, a Organização Mundial da Saúde, grandes epidemiologistas, as principais entidades médicas brasileiras pregavam o distanciamento social, o recolhimento domiciliar como a grande solução para impedir um genocídio de pessoas pobres no Brasil, eu achei que era o meu papel, em nome do direito constitucional à vida e à saúde, intervir."

Além de ser ministro do Supremo, Barroso é vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral. Assumirá a presidência da Corte eleitoral em maio. Admitiu que o coronavírus pode alterar o calendário da eleição municipal deste ano. Informou que o TSE deve decidir até junho se adia ou não as eleições municipais deste ano, marcadas para outubro.

"A verdade é que nós estamos monitorando a evolução da doença. Não gostaria de adiar as eleições, acho que não é preciso decidir isso neste momento, mas acho que não podemos fechar os olhos a este risco. Imaginaria junho como sendo o momento em que nós temos que ter uma definição. O que eu sou radicalmente contra é o cancelamento das eleições e fazer todas coincidirem em 2022", disse Barroso.

Para o ministro, o ideal seria adiar "por um prazo máximo de dois meses" as eleições. Ele se diz contrário à ideia de unificar as eleições municipais e as nacionais, programadas para 2022. Sustenta que a prorrogação dos mandatos dos atuais prefeitos e vereadores violaria a "vontade do eleitor", que votou para um mandato de quatro anos.

Barroso afirmou que o excesso de candidatos numa eleição unificada criaria também dificuldades gerenciais. "Nós estamos estimando 750 mil candidatos entre prefeitos e vereadores. Se você juntar isso a milhares de candidatos nas eleições nacionais vai criar um inferno gerencial nestas eleições", afirmou.