Topo

Leonardo Sakamoto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Reeleição de Bolsonaro teria colocado povo yanomami no caminho da extinção

Urihi Yanomami
Imagem: Urihi Yanomami

Colunista do UOL

12/02/2023 09h00

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Uma coisa é a omissão por incompetência, outra a omissão como projeto. O governo Jair Bolsonaro negou sistematicamente comida aos yanomamis que estavam morrendo de fome, como mostram documentos revelados por Carlos Madeiro, no UOL, neste domingo (12). Isso reforça a implementação de um projeto para facilitar a exploração daquela terra, "limpando" a área para os garimpeiros.

Em outras palavras: caso o ex-presidente tivesse obtido êxito em sua tentativa de reeleição, os yanomamis estariam hoje a caminho da extinção. Pois é isso o que acontece ao negar comida a um povo faminto enquanto permite que invasores levem doenças.

Os documentos revelados pelo UOL foram enviados entre junho de 2021 e março de 2022 aos Ministérios da Justiça e da Cidadania, pedindo comida e alertando para a fome desse povo. Não tiveram resposta adequada. Prova disso foram as 570 crianças de até cinco anos mortas nos últimos quatro anos, segundo levantamento do portal Sumaúma, e outras 100 neste ano, segundo o governo.

Enquanto colocava em prática seu projeto de "limpar" a Terra Indígena Yanomami a fim de garantir conforto para a sua base eleitoral, Bolsonaro negava a existência da fome em todo o Brasil. Para ele, esse tipo de acusação era eleitoreira e coisa de comunista.

"Alguém já viu alguém pedindo um pão na porta, no caixa da padaria? Você não vê, pô", afirmou à Jovem Pan em 26 de agosto do ano passado. Depois, em entrevista ao Ironberg Podcast, reforçou o argumento. "Fome no Brasil? Fome pra valer. Não existe da forma como é falado", disse, afirmando novamente que o Auxílio Brasil impede que as pessoas entrem nessa situação.

Jair tentava fazer crer que eram fake news os dados mostrando que a fome havia subido de 19 milhões, no final de 2020, para 33,1 milhões no início de 2022, segundo pesquisa do Vox Populi encomendada pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional. Torturava a realidade quando ela não lhe sorria, tal como fez com a área desmatada na Amazônia ou as mortes por covid-19.

A fome como projeto tinha um viés genocida junto aos Yanomami, mas estava presente em todo o país. Em setembro de 2022, foram registrados 977 mil diagnósticos de desnutrição de crianças e adolescentes na atenção básica de saúde, segundo outra reportagem de Carlos Madeiro, no UOL. Em agosto, eram 136 mil. Em 2015, 27 mil.

Preocupado em garantir recursos para comprar a sua reeleição, Bolsonaro freou ou interrompeu programas que garantir segurança alimentar aos brasileiros. Por exemplo, enquanto o leite acumulou uma inflação pornográfica no ano passado, o seu governo reduziu em 87% a entrega gratuita do produto às famílias em extrema pobreza no Nordeste e em Minas Gerais.

O projeto Bolsonaro para os indígenas não era algo pequeno, perpassando ministérios e instituições. Dessa forma, a quantidade de provas produzidas pela sua gestão contra ela mesma foi grande. Documentos como esses vão continuar aparecendo, abastecendo as investigações da Polícia Federal sobre genocídio indígena.

Espera-se que, ao final, se a Justiça brasileira abraçar a avaliação do "bolsoverso", o universo paralelo dos seguidores do ex-presidente, de que uma montanha de corpos não é evidência o suficiente, que o Tribunal Penal Internacional, em Haia, não faça o mesmo.