Leonardo Sakamoto

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Opinião

Zuckerberg se ajoelha a Trump, aproxima Instagram do X e dá recado ao STF

Mark Zuckerberg, dono do Instagram, do Facebook, do WhatsApp e do Threads, anunciou em vídeo em suas redes sociais, nesta terça (7), um cavalo de pau na política de moderação de conteúdo de sua empresa. Com isso, ele se aproxima de Donald Trump, que assume o poder no próximo dia 20, e coloca suas plataformas à sombra do X, que pertence a outro bilionário, Elon Musk. No discurso, aproveitou para cutucar o Supremo Tribunal Federal brasileiro.

Entre as mudanças anunciadas, a Meta afirmou que vai abandonar seu programa de parceria com empresas de checagem de fatos e copiar o modelo do X/Twitter, que adota notas explicativas e correções a postagens produzidas pelos próprios usuários. Também prometeu "remover restrições sobre tópicos como migração e gênero" que estejam "fora de sintonia com o discurso convencional" e diminuir filtros contra conteúdos nocivos porque vê tudo isso como censura.

"É hora de voltar às nossas raízes em torno da liberdade de expressão", defendeu Zuckerberg.

A empresa também disse que vai trocar os moderadores de conteúdo que moram na Califórnia (um estado mais progressista, que vota do Partido Democrata) por profissionais no Texas (mais conservador e que dá vitória ao Partido Republicano, de Trump), segundo ela, para ajudar "a remover a preocupação de que funcionários tendenciosos estão censurando excessivamente o conteúdo".

E vai mudar os algoritmos para voltar a priorizar conteúdo político, que ele vinha evitando para conter a ultrapolarização.

"Mas a medida de maior impacto é o anúncio de que a Meta vai fazer uma parceria com o novo governo Trump para combater a regulação na Europa, que, segundo ele, prejudica a liberdade de expressão e as empresas americanas, além de combater o que chamou de práticas de censura judicial na América Latina, o que é um recado para o STF brasileiro", disse Pablo Ortellado, coordenador do Monitor do Debate Político no Meio Digital da Universidade de São Paulo.

Para João Brant, secretário nacional de Políticas Digitais da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, "o anúncio antecipa o início do governo Trump e explicita aliança da Meta com o governo dos Estados Unidos para enfrentar União Europeia, Brasil e outros países que buscam proteger direitos no ambiente online e que, na visão dele, 'promovem censura'".

Zuckerberg afirmou que "países da América Latina têm 'tribunais secretos' que podem ordenar que empresas silenciosamente derrubem algumas coisas". Apesar de não citar o Brasil, a crítica ecoa as reclamações infundadas de Elon Musk e da extrema direita contra o ministro Alexandre de Moraes e o STF, que suspenderam a operação do X enquanto a empresa se negou a cumprir ordens judiciais.

"É uma declaração fortíssima, que chama tacitamente o STF de 'Corte secreta', ataca de maneira absurda os checadores de fatos (dizendo que eles 'mais destruíram do que construíram confiança' nas plataformas) e questiona publicamente o viés da própria equipe de 'trust and safety' da Meta, numa justificativa para fugir da legislação californiana", apontou Brant.

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Zuckerberg também criticou a Europa que, segundo ele, tem aprovado "um número cada vez maior de leis que instituem censura" e que dificultam a inovação. Defendeu que as leis dos EUA sejam usadas como modelo para liberdade de expressão no mundo, ignorando as legislações locais.

Ortellado lembra que, quando Trump foi eleito da primeira vez, em 2016, o Facebook foi acusado de ajudar a elegê-lo porque microdados sobre os usuários da rede foram usados pela Cambridge Analytica, que fez a campanha do candidato. A partir daí, começou a adotar mudanças.

"As políticas de moderação se tornaram mais detalhadas e mais abrangentes; a cessão de dados para acadêmicos se tornou muito mais restritiva; publicações começaram a passar por um processo de fact-checking por empresas jornalísticas independentes e as políticas de moderação passaram a ser supervisionadas e revistas por um conselho independente. Foi todo esse sistema, construído nos últimos anos, que ruiu por completo com o anúncio de hoje", diz.

Tudo isso vai agradar Donald Trump e seus aliados conservadores e confirma que as Big Techs estão correndo para se alinhar ao novo presidente, mundialmente conhecido por divulgar mentiras e desinformação. Zuckerberg jantou com Trump em Mar-a-Lago no final de novembro, doou US$ 1 milhão para a posse dele, anunciou Dana White, chefe do UFC e apoiador do republicano, para o conselho da Meta, entre outras ações.

O gigante Instagram pode ser suspenso no Brasil pelo STF, como o X foi? Se a Meta se negar a cumprir ordens judiciais por aqui, sob a justificativa de estar seguindo suas novas políticas, sim. Isso, sem dúvida, será usado pela extrema direita para atacar as instituições junto à população.

De concreto, por enquanto, a certeza de que o mundo ficou mais árido nesta terça.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL