Musk destampa o esgoto no X/Twitter ao sugerir que vai ignorar Justiça
Em meio a ataques às decisões do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, o proprietário do X/Twitter, o bilionário Elon Musk afirmou que a sua empresa está "levantando todas as restrições" determinadas pelo Poder Judiciário. Não foi claro sobre a quais decisões ele se referia, mas isso abre um grave precedente.
Primeiro porque qualquer pessoa física ou jurídica que opera em um país está sujeito às suas leis e ao seu Poder Judiciário. Questionamentos devem ser feitos em tribunais e, caso o apelo não seja ouvido, pode-se acionar o sistema de Justiça interamericano, na Organização dos Estados Americanos, ou internacional, nas Nações Unidas, contra um Estado.
Além disso, o X/Twitter já foi obrigado a excluir contas e postagens no Brasil que tratavam de temas como planejamento de ataques para matar estudantes em escolas (a rede foi usada por grupos que estimulam esse crime em abril do ano passado), mas também que promoviam mentiras sobre o coronavírus em meio à pandemia de covid-19. A desinformação propagada por negacionistas ajudou a ultrapassarmos 710 mil mortes pela doença no país.
Ou seja, não é apenas conteúdo relacionado a ataques ao Estado democrático de direito e de tentativa de golpe de Estado que foram removidos pela plataforma após pressão externa. Há outros temas sensíveis e que podem impactar a vida da população.
Ao chamar Alexandre de Moraes de censor, acusá-lo de trair a Constituição e a população, pedir sua renúncia ou impeachment e sugerir que suas decisões não serão mais obedecidas, Musk incentiva o desrespeito às instituições pela extrema direita. E ecoa declarações de Jair Bolsonaro, que bradou que passaria a ignorar as decisões do ministro do STF em um ato na avenida Paulista em 7 de setembro de 2021.
"Dizer a vocês, que qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá. A paciência do nosso povo já se esgotou, ele tem tempo ainda de pedir o seu boné e ir cuidar da sua vida. Ele, para nós, não existe mais", disse.
"Sai, Alexandre de Moraes. Deixa de ser canalha. Deixa de oprimir o povo brasileiro, deixe de censurar o seu povo. Mais do que isso, nós devemos, sim, porque eu falo em nome de vocês, determinar que todos os presos políticos sejam postos em liberdade", completou.
Com medo, Bolsonaro voltou atrás, e usou o ex-presidente Michel Temer para tentar convencer Moraes e o STF a colocarem panos quentes na crise instalada.
Se essa declaração do ex-presidente, uma das várias nesse sentido que ele produziu até sua tentativa de golpe de 2022/2023, precisa ser encarada em meio à sua tentativa de reeleição, as de Musk devem ser entendidas no contexto da nova resolução sobre propaganda eleitoral publicada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Polêmica, ela iria contra o Marco Civil da Internet ao afirmar, em seu artigo 9e, que as plataformas serão civil e administrativamente corresponsáveis por postagens "antidemocráticas", ataques ao processo eleitoral, discurso de ódio e manipulação usando inteligência artificial mesmo sem denúncia pelo TSE ou determinação judicial para remoção do conteúdo.
Entidades da sociedade civil já questionaram a resolução, dizendo que ela vai contra a lei, e o caso vai ser analisado pela Justiça através dos instrumentos legais.
"Musk resolveu defender golpistas e escalar o tema por motivos políticos (possivelmente também comerciais), provavelmente antecipando descumprimento da resolução do TSE para as eleições 2024", afirmou o secretário nacional de Políticas Digitais, João Brant, em sua rede social.
"Curiosamente, o Twitter tinha até o início de 2023 o melhor termo de uso em relação a eleições. Se eles cumprissem as próprias regras, provavelmente parte do conteúdo removido pela Justiça teria sido removido antes pela própria empresa", disse.
O secretário diz que disse isso a Musk em reunião em 12 de janeiro de 2023, quando o bilionário já havia feito questionamentos sobre as decisões de Moraes. "Reforçamos naquele momento a importância das ações do TSE e STF em proteger a democracia brasileira. Mas evidentemente isso não era, e segue não sendo, relevante para o bilionário dono desta plataforma", conclui Brant.
Já o advogado-geral da União, Jorge Messias, postou que é urgente regulamentar as redes. "Não podemos conviver em uma sociedade em que bilionários com domicílio no exterior tenham controle de redes sociais e se coloquem em condições de violar o Estado de Direito, descumprindo ordens judiciais e ameaçando nossas autoridades. A paz social é inegociável", afirmou.
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Quero receberPara Musk, que nunca viu a operação brasileira do X como lucrativa, essa é uma excelente oportunidade para sair do país se vendendo como pretenso mártir de uma pretensa liberdade (lembrando que liberdade para fomentar golpe, covid-19 e ataques em escolas não é liberdade), jogando a culpa em terceiros. E ainda ajudar as posições da extrema direita de Donald Trump e Bolsonaro.
Agora é torcer para que os esgotos da internet não se entusiasmem com a promessa de Musk de descumprir decisões judiciais, sentindo-se livres para fazer o que fazem de melhor.