Leonardo Sakamoto

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Reportagem

PF faz ação por ameaça de 'descer o cacete' em fiscais do trabalho em MG

Um homem que disparou áudios com ameaças contra a fiscalização do trabalho que atua na região cafeeira de Minas Gerais foi alvo de uma operação da Polícia Federal nesta quinta (6). Ele prestou depoimento e teve seu celular apreendido. O estado foi palco da Chacina de Unaí, em 2004, quando quatro funcionários do Ministério do Trabalho e Emprego foram mortos durante fiscalização rural.

Carlos Calazans, chefe da Superintendência Regional do Trabalho, afirmou à coluna que a PF está investigando se ele estava agindo a mando de alguém, se estava articulado com outras pessoas e se é "gato", como são chamados os contratadores de mão de obra a serviço de fazendeiros.

Os áudios chegaram aos servidores públicos durante fiscalização em lavouras na região do município de Muzambinho, em maio, e foram encaminhados à PF, que identificou o autor.

"Se juntar todo mundo, os trabalhadores, 30 pessoas pegando café, na hora em que a fiscalização chegar lá, quebra o carro deles, mete o pau neles e desce o cacete neles. Aí, vai parar com essa pouca vergonha aí", diz um dos áudios.

Em depoimento, ele afirmou que se tratava de uma "brincadeira" e se identificou como "apanhador de café". Deve ser indiciado pela polícia pela ameaça aos funcionários públicos.

Dados do Ministério do Trabalho e Emprego apontam que, em 2023, a atividade de onde mais trabalhadores foram resgatados foi o cultivo de café, com 300 pessoas. E Minas foi o segundo estado com o maior número de resgatados — perdendo apenas para Goiás.

'Sombra'

Calazans lembra que a Chacina de Unaí também começou com uma ameaça aos fiscais e se mantém como uma sombra que, duas décadas depois, ainda paira sobre os auditores, principalmente os de Minas Gerais.

Três fiscais e um motorista do Ministério do Trabalho e Emprego foram fuzilados, em 28 de janeiro de 2004, durante uma fiscalização em fazendas da região no que ficou conhecida como a Chacina de Unaí. Apesar de os envolvidos terem sido condenados, ainda há foragidos.

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Um dos mandantes, o ex-prefeito Antério Mânica, foi preso apenas em setembro passado, após uma espera de mais de 19 anos, graças aos recursos protelatórios e idas e vindas do processo. Ele e seu irmão, Norberto, que estão entre os maiores produtores rurais do país, foram apontados como os mandantes pela PF.

Os auditores fiscais do trabalho Erastóstenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares Lage e Nelson José da Silva e o motorista Ailton Pereira de Oliveira realizavam uma fiscalização rural de rotina em fazendas de feijão quando foram atacados em uma emboscada.

O inquérito apontou que a motivação do crime foi o incômodo provocado pelas multas impostas à família de fazendeiros, sendo que Nelson José da Silva era o alvo principal. Ele já havia aplicado cerca de R$ 2 milhões em infrações por sistematicamente descumprirem as leis.

Para entender a força política dos Mânica, mesmo após ser vinculado à chacina, Antério foi eleito prefeito de Unaí, em 2004, com 72,37% dos votos válidos. E reeleito em 2008.

Em novembro de 2008, chegou a ser um dos condecorados com a Medalha da Ordem do Mérito Legislativo, em cerimônia promovida pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais.

Aguardando o processo em liberdade, ele pediu votos à reeleição de Jair Bolsonaro (PL), em 2022, através de um vídeo que circulou pelas redes sociais.

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