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Maurício Ricardo

5 provas de que os Beatles não eram comunistas

Os Beatles na capa de Abbey Road. O fato de estarem atravessando para a direita é apenas coincidência. - Reprodução
Os Beatles na capa de Abbey Road. O fato de estarem atravessando para a direita é apenas coincidência. Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

03/12/2019 12h45

A indicação do olavista, maestro e youtuber, Dante Mantovani, para a presidência da Funarte (Fundação Nacional das Artes) trouxe de volta aos noticiários uma das mais infames teorias conspiratórias espalhadas por Olavo de Carvalho, o guru da família Bolsonaro: a de que os Beatles conspiraram com a Escola de Frankfurt (grupo de filósofos marxistas alemães do século passado) para disseminar no mundo o comunismo. Foi pensando nos brasileiros que ainda não foram cooptados por essa teoria conspiratória absurda que listei cinco fatos que comprovam que os Beatles nunca foram comunistas:

1 - Os Beatles não levaram em conta a solidariedade de classe

No Manifesto Comunista, Marx diz que o verdadeiro resultado das lutas dos operários "não é tanto o sucesso imediato, mas antes, a solidariedade crescente dos trabalhadores".

Tudo bem que os Beatles gravaram "I wanna hold your hand" (Quero segurar sua mão), mas essa coisa de "Ninguém solta a mão de ninguém" não era com eles. Depois de ralarem solidariamente por anos, nos pubs de Hamburgo e Liverpool, a banda não hesitou em se livrar de seu baterista original, Pete Best, e substitui-lo por Ringo Starr justamente no momento em que um contrato de gravadora lhes abriria as portas da fama.

O episódio é obscuro, mas o principal motivo seria o fato de que George Martin, que entraria para história como produtor do quarteto, não gostou da pegada do batera.

2 - Os Beatles incentivavam o consumismo

Pode isso, Arnaldo? Não. Segundo Marx, a regra é clara: "A desvalorização do mundo humano aumenta em proporção direta com a valorização do mundo das coisas." A beatlemania, fenômeno resultante do sucesso sem precedente dos Beatles alimentou toda uma indústria de colecionáveis e inflacionou o preço de produtos de uso diário só porque levavam a marca dos Fab Four.

Nada poderia expressar melhor a essência do consumismo capitalista: bonecos, pôsteres, sprays de cabelo e até... naftalina! Os Beatles licenciaram centenas e produtos e ganharam milhões de libras com eles. Em "Can't buy me love" a banda dizia que não ligava pra dinheiro. Imagine se ligasse!

3 - Os Beatles não queriam pagar impostos altos

Que me desculpe o quarteto de Liverpool, mas Marx e Engels foram claros no "Manifesto do Partido Comunista": em países mais avançados (como a Inglaterra) uma das primeiras medidas para a implantação do comunismo seria a implantação de um "Pesado imposto progressivo". Ou seja, quem ganha mais, paga mais. Os

Beatles estariam entre os primeiros a espernear. Quando começaram a nadar em dinheiro, por volta de 1966, e sentir no bolso a mão pesada do fisco, a banda lançou "Taxman" (Homem do Imposto) como música de abertura do álbum "Revolver", reclamando da ganância tributária do governo britânico: "Vou te contar como vai ser: um pra você, dezenove pra mim. Porque eu sou o Homem do Imposto (...). Se você dirige um carro, eu taxo a rua. Se você tenta se sentar, eu taxo o assento. Se você está com frio, eu taxo o calor. Se você vai caminhar, eu taxo seus pés".

4 - Os Beatles não queriam a Revolução Proletária

Desde Marx, foram muitos os pensadores comunistas que defenderam a tese de que só através da revolução a classe operária conseguiria ocupar a posição de classe dominante, transformando o Estado Burguês em Estado Operário. Os Beatles fizeram seu próprio manifesto sobre isso na canção "Revolution": eles deixam claro que estão fora, que defendem a constituição e que não dariam seu dinheiro para "mentes que odeiam".

E ainda tiram um sarro dos simpatizantes do então líder da China comunista, Mao Tsé-Tung: "você não vai convencer ninguém". Bem, os Beatles eles não convenceram

5 - Os Beatles ajudaram a acabar com a União Soviética

Diz a tese apoiada por Olavo de Carvalho que os Beatles foram cooptados pelos malvadões comunistas da Escola de Frankfurt. Se a ideia era exterminar os valores do mundo ocidental, o plano saiu do controle. O mundo vivia o auge da Guerra Fria e a União Soviética era a grande potência que prometia espalhar os ideais comunistas por todo o Globo (ou pela superfície da Terra, como prefere Dante Montevani).

O problema é que os jovens soviéticos - como a maioria dos jovens do planeta - adoravam os Beatles e se arriscavam a pesadas punições para obter discos contrabandeados da banda. O simples fato de ser pego ouvindo ou cantando Beatles poderia levar à expulsão de um estudante de sua universidade, por exemplo, mas eles se arriscavam assim mesmo.

Segundo Mikhail Safonov, do Instituto de História da Rússia, "Os Beatles apresentaram conceitos de democracia aos cidadãos da sociedade soviética. Apesar da luta do governo para banir a beatlemania do país, eles nunca foram eliminados".

Enfim, como conspiracionistas nunca cedem, você ainda pode defender a tese olavista dizendo que, sem querer, a Escola de Frankfurt abriu uma caixa de Pandora ao recrutar os Beatles. Mas espero ter salvado, com este breve estudo, alguns jantares de Natal tirando essa teoria ridícula da mesa da ceia.