Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
MP junto ao TCU pede suspensão de pagamentos da Odebrecht à A&M. É o certo!
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Lucas Rocha Furtado, subprocurador-geral junto ao Tribunal de Contas da União, resolveu, se me perdoam o clichê, botar o dedo na ferida. Pede que o Tribunal avalie a conveniência de suspender, cautelarmente, os pagamentos da Odebrecht à empresa Alvarez & Marsal até que o órgão possa avaliar a atuação do ex-juiz Sergio Moro no caso. Pede ainda o compartilhamento de dados do material apreendido pela Operação Spoofing com a troca de mensagens entre o então juiz e os procuradores.
Para lembrar: a Odebrecht está em recuperação judicial, e a administradora do processo é a Alvarez & Marsal. No fim de novembro, a empresa anunciou que Moro havia se tornado seu sócio-diretor.
O pedido foi encaminhado ao ministro Bruno Dantas porque ele é o relator, junto ao TCU, do acordo de leniência da Odebrecht. Os motivos, expostos por Rocha Furtado, são irrefutáveis:
- Moro orientou procuradores em questões relativas a informações constantes nos sistema da Odebrecht;
- Moro homologou o acordo de leniência firmado pela empresa;
- O então juiz pode ter contribuído para a insolvência da Odebrecht, seja nas exigências contidas nos acordos de leniência, seja nas decisões judiciais;
- o administrador judicial exerce atividade de interesse público, regulada pela Constituição;
- o administrador judicial tem os deveres de fidúcia, lealdade e diligência;
- cabe ao poder público referendar o administrador judicial, fiscalizá-lo, definir sua remuneração ou destituí-lo (Lei 11.101/2005, arts. 21, 22 e 24);
- há risco de conflito de interesses entre o ex-juiz, que teve ação decisiva nos destinos da Odebrecht, e o agora sócio da Alvarez & Marsal. Moro pode obter ganhos, ainda que indiretos, decorrentes da relação entre as empresas;
- o bom andamento da recuperação judicial tem impacto nos cofres públicos para assegurar "o devido ressarcimento de prejuízos ao erário".
Por tudo isso, Rocha Furtado pede, então:
1: Que se avalie, como já se informou aqui, a conveniência da suspensão de pagamentos;
2: que os diálogos de Moro com os procuradores sejam compartilhados com o TCU, uma vez que Lewandowski determinou a suspensão do sigilo;
3: que o juiz da recuperação judicial e a Odebrecht compartilhem os documentos que resultaram na escolha da Alvarez & Marsal como administradora da recuperação judicial;
4: que se realizem oitivas para que tanto a Alvarez & Marsal como a Odebrecht se manifestem a respeito.
Ninguém está acima da lei.
Como já se escreveu neste blog, não é aceitável que Moro tenha sido o juiz que determinou o destino da Odebrecht e depois se apresente como sócio da empresa que cuida da recuperação judicial daquela que foi levada à insolvência. Ainda que se possa alegar que ele não participa dessa relação em particular, o caixa da Alvarez & Marsal é um só. Quando Moro receber os benefícios da empresa de que agora é sócio, os desembolsos da Odebrecht participam desse resultado.
Rocha Furtado pede a suspensão cautelar — temporária — dos pagamentos até que tudo seja avaliado. Não há como. O princípio da moralidade impõe que a Alvarez & Marsal deixe de cuidar da recuperação judicial da Odebrecht.