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Reinaldo Azevedo

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Bolsonaro usa a Petrobras para dar largada à campanha. E o ataque covarde

Bolsonaro exercita, mais uma vez, seu jeito de fazer política: demoniza Roberto Castello Branco, um dos homens mais afinados com Paulo Guedes e fiel servidor da "causa bolsonarista" - Amanda Perobelli/Reuters
Bolsonaro exercita, mais uma vez, seu jeito de fazer política: demoniza Roberto Castello Branco, um dos homens mais afinados com Paulo Guedes e fiel servidor da "causa bolsonarista" Imagem: Amanda Perobelli/Reuters

Colunista do UOL

21/02/2021 05h52

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Evidenciando que política e assuntos de governo são coisas que se debatem em quartel, o presidente Jair Bolsonaro decidiu, neste sábado, fazer digressões sobre o ato de governar a formandos da Escola Preparatória de Cadetes do Exército, em Campinas (SP). Nessa mesma solenidade (ver texto anterior), expressou o seu desamor pela democracia. Disse:
"Vocês aprenderão rapidamente que pior do que uma decisão mal tomada é uma indecisão. Eu tenho que governar. Trocar as peças que porventura não estejam dando certo".

Essa, o tal Freud explicaria sem grande dificuldade. Se há coisa que marca o seu governo é justamente a inação e a procrastinação. E, como de hábito, resolveu escolher a imprensa como um dos alvos:
"E, se a imprensa está preocupada com a troca de ontem [anteontem], na semana que vem, teremos mais. O que não falta para mim é coragem para decidir pensando no bem maior da nossa nação. O mais fácil é se acomodar, é se aproximar daqueles que não têm compromisso com a pátria."

Ele se referia à decisão de demitir Roberto Castello Branco da Presidência da Petrobras, indicando, para substituí-lo, o general Joaquim Silva e Luna, que hoje comanda Itaipu. Seu nome ainda tem de ser referendado pelo Conselho, o que vai acontecer. O governo ocupa seis das 11 cadeiras.

Nunca soube que a imprensa tivesse um nome de seu agrado para a Presidência da Petrobras ou de qualquer outra empresa pública. Essa é uma daquelas fantasias que habitam a cabeça do presidente, surgidas sabe Deus como. O que o jornalismo profissional fez, e com acerto, foi iapontar a intervenção destrambelhada, o que provocou um tombo das ações da empresa, que é de economia mista.

QUAIS MUDANÇAS?
Bolsonaro não sabe viver sem inimigos. Nem tomar decisões a favor de nada nem de ninguém. Na sua cabeça conspiratória, precisa ter a convicção de que está sempre atuando contra alguém.

Vem daí esse papo de "coragem para decidir". Pois que tenha. Serão mudanças no primeiro escalão? Ninguém sabe. As peças que menos funcionam e que mais têm trazido dissabores ao país — Eduardo Pazuello (Saúde), Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Ricardo Salles (Meio Ambiente) — são tidos como os "imexíveis".

Dados a mudança que fez na Petrobras e os motivos, a mexida pode se relacionar à Eletrobras. Em conversa com apoiadores na noite de ontem, disse que vai "meter o dedo na energia elétrica, que é outro problema".

DEMONIZAÇÃO COVARDE
O presidente passou boa parte deste sábado demonizando Castello Branco, o presidente demitido da Petrobras e um dos nomes mais afinados com o ministro da Economia, Paulo Guedes.

Num vídeo para o Youtube de um dos canais que o apoiam, atacou:
"Quando há um aumento de combustível, o pessoal aponta e atira para o presidente da República. Isso vai começar a mudar, começou a mudar já. Temos que tirar quem está na frente da Petrobras. E uma curiosidade. Vocês sabiam que, desde março do ano passado, o presidente da Petrobras está em casa, assim como toda a sua diretoria? Não dá para estar à frente de uma estatal dessa forma. O novo presidente, caso aprovado pelo conselho, espero que seja aprovado, vai dar uma nova dinâmica à Petrobras, sem interferir, interferência zero, mas vai ter transparência e previsibilidade".

Como se vê, nesse caso, misturam-se seu negacionismo patológico com a insatisfação com o preço dos combustíveis. Às portas do Alvorada, falando a seus fanáticos, voltou a atirar:
"Parecia exorcismo quando eu falei que não ia prorrogar por mais dois anos o mandato do cara [Castello Branco] lá. Compromisso zero com o Brasil. Nunca ajudaram em nada. Não é aumentando preço de acordo com o petróleo lá fora e o dólar aqui dentro. É mais do que isso. A preocupação é ganhar dinheiro em cima do povo. Não justifica 32% de reajuste no diesel no corrente ano. Ninguém esperava essa covardia desse reajuste agora."

Castello Branco comandava a Petrobras segundo os parâmetros acordados com o ministro da Economia, Paulo Guedes. Como se nota, não basta a Bolsonaro demitir o presidente da empresa. Também é preciso demonizá-lo, transformá-lo em vilão, para que ele, presidente, possa falar, então, como um tribuno do povo, que também é traído por homens maus. E aí surge a figura do suposto herói, que não tem medo de nada e enfrenta os grandes.

Em linguagem já de campanha eleitoral, tentando ressuscitar o padrão de 2018, afirmou a apoiadores à esteira ainda da troca na Petrobras:
"Mudança comigo não é de bagrinho, não, é tubarão".

Até parece que faz o governo mais eficiente da Terra.

Bolsonaro deu largada à campanha eleitoral por intermédio da intervenção na Petrobras.