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Reinaldo Azevedo

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Rosa sustenta o que aqui se disse: as CPIs não podem convocar governadores

Rosa Weber: ministra toma a decisão correta e concede liminar contra convocação de governadores pela CPI. Decisão final será do pleno - Felipe Sampaio/STF
Rosa Weber: ministra toma a decisão correta e concede liminar contra convocação de governadores pela CPI. Decisão final será do pleno Imagem: Felipe Sampaio/STF

Colunista do UOL

21/06/2021 22h21

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A ministra Rosa Weber, do Supremo, concedeu uma liminar impecável que impede a CPI de convocar os governadores. Dezenove deles entraram com uma ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) alegando que o chamamento obrigatório dos chefes dos Executivos Estaduais fere a Constituição e também o Regimento Interno do Senado. A petição é assinada pelos respectivos procuradores-gerais de 18 Estados, além do Distrito Federal: AL, AM, AP, BA, ES, GO, MA, PA, PE, PI, RJ, RS, RO, SC, SP, SE, TO e AC.

No dia 27 de maio, escrevi um texto nesta coluna cujo título era: "Nem Bolsonaro nem os governadores podem ser convocados pela CPI. É ilegal!"

Lembrei, então, o que dispõe o Artigo 146 do Regimento Interno do Senado:
"Art. 146. Não se admitirá comissão parlamentar de inquérito sobre matérias pertinentes:
I - à Câmara dos Deputados;
II - às atribuições do Poder Judiciário;
III - aos Estados.".

Como se verifica, o veto à investigação de governadores é explícito. Mais: observei que a interpretação sistêmica do Artigo 50 da Constituição, que não prevê a convocação do presidente da República, estende seus efeitos aos respectivos chefes dos Executivos Estaduais e municipais.

Destaquei ainda qual era a jurisprudência da Casa. E lembrei, então, decisão do ministro Marco Aurélio. Em novembro de 2012, ele concedera liminar a Mandado de Segurança impetrado pelo então governador de Goiás, Marconi Perillo, que havia sido convocado para a chamada "CPI do Cachoeira". Escreveu com acerto:
"Em um primeiro exame, a interpretação sistemática do Texto Maior conduz a afastar-se a possibilidade de comissão parlamentar de inquérito, atuando com os poderes inerentes aos órgãos do Judiciário, vir a convocar, quer como testemunha, quer como investigado, Governador. Os estados, formando a união indissolúvel referida no artigo 1º da Constituição Federal, gozam de autonomia, e esta apenas é flexibilizada mediante preceito da própria Carta de 1988".

Pois são precisamente essas as balizas aqui apontadas que serviram de pilares ao voto de Rosa, que pediu sessão virtual urgente para que a questão seja decidida pelo pleno. Está marcada para quinta e sexta.

O RECURSO
Dezenove governadores recorreram em conjunto, mas nem todos haviam sido convocados. Integraram a lista da CPI Wilson Lima (PSC-AM), Helder Barbalho (MDB-PA), Ibaneis Rocha (MDB-DF), Mauro Carlesse (PSL-TO), Carlos Moisés (PSL-SC), Waldez Góes (PDT-AP), Wellington Dias (PT-PI) e Marcos Rocha (PSL-RO). A ministra já havia concedido liminar suspendendo a ida obrigatória de Lima porque ele já é um investigado. Aí prevaleceu outro princípio: não poderia ser compelido a produzir provas contra si mesmo.

A LIMINAR
Rosa escreve sobre a não obrigatoriedade de o presidente da República prestar depoimento a uma CPI:
"Além de tais prerrogativas titularizadas pelo Chefe do Poder Executivo da União, resulta claro da mera leitura do texto constitucional que o Presidente da República não pode ser convocado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, ou qualquer de suas comissões, para prestar informações, pessoalmente, no âmbito daquelas Casas Legislativas. É o que emerge dos Arts. 50, caput e § 2º, e 58, § 2º, III, da Constituição Federal (...)"

E emenda sobre os governadores exatamente o que aqui se disse no dia 27 de maio. Está na sua liminar:
"Essa prerrogativa constitucional titularizada pelo Presidente da República -- isenção da obrigatoriedade de testemunhar perante as comissões parlamentares -- , segundo entendo, também se estende aos Governadores de Estado por ostentarem a condição de Chefes do Poder Executivo no âmbito das respectivas unidades federativas.
Inquestionável, diante desse quadro, a necessidade de as Comissões Parlamentares de Inquérito respeitarem a prerrogativa dos Governadores de Estado de não testemunharem perante as comissões parlamentares. Por isso mesmo, esta Suprema Corte tem acentuado, em processos de controle concentrado de constitucionalidade, a caracterização de hipótese de transgressão ao princípio da independência e da harmonia entre os Poderes a outorga à Assembleia Legislativa, pela Constituição estadual, da prerrogativa de convocar o Governador do Estado para prestar testemunho sobre fatos do interesse do Poder Legislativo estadual, enquanto tradutora de situação de indevida submissão institucional do Chefe do Poder Executivo à Assembleia Legislativa estadual."

ENTENDERAM?
Não só Senado e Câmara não podem convocar o presidente da República. Também as Assembleias não podem chamar os governadores para depor sem que isso caracterize intromissão de um poder no outro.

Importante destacar que Rosa, assim, opõe-se ao entendimento exótico da Procuradoria-Geral da República que, ora vejam!, sustenta que prefeitos não podem depor em CPIs das respectivas Câmaras, e governadores, nas das respectivas Assembleias, seguindo a inspiração do Artigo 50 da Carta, que não prevê a convocação do presidente pelo Congresso.

Mas aí deu um triplo salto carpado argumentativo afirmando que governadores não poderiam depor no Legislativo estadual, mas poderiam fazê-lo no Legislativo Federal. Não é uma interpretação, convenham, mas uma piada exótica.

Rosa fez a coisa certa.