Lançamento de míssil pela Rússia na Ucrânia é sinal' para europeus', diz especialista
A Ucrânia acusou a Rússia nesta quinta-feira (21) de disparar um míssil intercontinental capaz de transportar ogivas nucleares pela primeira vez. Quais são as consequências do lançamento para o equilíbrio geopolítico mundial? Leia a análise de Stéphane Audrand, especialista e consultor em riscos internacionais, ouvido pela RFI.
RFI: Qual é a mensagem enviada pela Rússia?
Stéphane Audrand: Há uma intenção estratégica. Os mísseis intercontinentais - sejam de médio ou longo alcance - são uma categoria de armas que nunca foi usada em um conflito até agora, reservada para a implementação de armas nucleares.
Em todas as potências do mundo, esses mísseis são usados apenas para transportar armas nucleares. Portanto, o fato de a Rússia estar usando essa arma para um ataque convencional, sem ogiva nuclear, na Ucrânia, é necessariamente um sinal estratégico.
RFI: A mensagem da Rússia é destinada a quem?
Stéphane Audrand: Dada a distância do ataque e a categoria das armas, estou inclinado a pensar que a intenção é exercer o máximo de pressão sobre os europeus, e dissociar a Europa e os EUA.
A chegada de Trump é um momento propício. Os russos queriam reagir às autorizações de ataques de mísseis balísticos dos EUA em seu território. Portanto, esta é uma maneira de finalmente dizer à Ucrânia e a todos os europeus "você sabe, podemos atingir a Europa sem ameaçar a América. E se os americanos não estiverem mais lá para defendê-los, vocês estarão sozinhos".
Kiev acusa Moscou de ter disparado um míssil intercontinental contra a Ucrânia pela primeira vez, então a questão é dividir e intimidar os europeus.
Na época da crise dos euromísseis [Nota do editor: uma corrida armamentista entre 1977 e 1987, período em que as forças nucleares foram implantadas na Europa pela URSS e depois pela OTAN], os americanos reagiram com extrema força, dizendo: "Não, não, espere, estamos implantando forças nucleares na Europa e vamos negociar".
Hoje, com a chegada de Trump, a grande esperança de uma dissociação entre a Europa e os Estados Unidos está ao alcance de Moscou. Os europeus estão acuados. E, em particular, os franceses e os britânicos, que são as duas potências nucleares independentes na Europa, que podem se defender de forma autônoma.
Mas, em relação aos outros países este é o ponto: até onde estamos nós, franceses e britânicos, dispostos a ir para defender o espaço europeu com as nossas armas nucleares? E até que ponto os europeus estão dispostos a contribuir para o custo da nossa dissuasão comum?
Estas são duas perguntas que, infelizmente, terão de ser respondidas muito rapidamente. Elas estão sendo feitas há muito tempo, mas ninguém queria respondê-las.
RFI: A Rússia e os europeus confirmaram o lançamento e o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da França disse que, se fosse verdade, "seria um evento extremamente grave e, acima de tudo, uma confirmação do desejo 'de escalada' da Rússia".
Stéphane Audrand: Este é um marco na sinalização estratégica. Quando a Rússia realiza uma grande operação de ataque em cidades ucranianas com centenas de mísseis, estamos na clássica escalada convencional.
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Quero receberNo final, este ataque, em termos de impacto militar no terreno, não representa muito, na medida em que não houve grandes explosões, que as ogivas pareciam bastante inertes, não podemos dizer que militarmente seja significativo. Por outro lado, em um nível simbólico, sim, é um sinal forte e sem precedentes no que se diz respeito à dissuasão nuclear.
RFI: Quais são as respostas possíveis?
Stéphane Audrand: Na minha opinião, haverá uma resposta das três potências nucleares da OTAN: a França, o Reino Unido e os Estados Unidos. Não será necessariamente visível para o público em geral imediatamente, mas acho que acontecerá. O paralelo é o início da guerra na Ucrânia em fevereiro de 2022. Os russos trouxeram seus submarinos de mísseis balísticos nucleares.
Descobrimos algumas semanas depois que os franceses e americanos também fizeram isso para responder e dizer: "e vocês tirarem seus submarinos, nós tiraremos os nossos". A resposta dos russos foi retirar os submarinos, eles optaram pelo apaziguamento.
Portanto, acho que haverá um sinal estratégico de uma ou mais das três potências nucleares ocidentais para lembrar aos russos que há um equilíbrio de poder na ordem nuclear e que há limites, certas coisas não devem ser feitas.
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