Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Nota pusilânime de Kássio Conká faz ilação mentirosa e flerta com golpismo
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O ministro Nunes Marques. o "Kássio Conká", foi poupado da vergonha e do constrangimento por seus colegas e por ex-presidentes do TSE. Criou-se um critério para assinar a Carta do TSE que o excluiu. Não porque não quisessem a sua assinatura no documento, mas porque, como resta claro, não a teriam mesmo.
Assim, para todos os efeitos, a nota haveria de ser assinada pelo atual presidente do TSE, pelo vice, pelo futuro e por todos os ex-presidentes do tribunal desde a Constituição de 1988. Pronto! Nunes Marques não é nada disso. Nem seria preciso que ele viesse a público para externar a sua posição. Mas veio. Ao fazê-lo, veiculou uma mentira, ainda que de modo sorrateiro. E, mais uma vez, ficamos sabendo que Nunes Marques é, com efeito, o melhor Nunes Marques que Jair Bolsonaro, o golpista, poderia ter arranjado.
Caso o "Mito" dê um golpe, acho que já sei quem será o candidato a redigir a Constituição outorgada — na hipótese de que haveria tempo para tanto. Tendo a achar que iriam todos para a cadeia e pronto.
O ministro houve por bem vir a público para dizer por que, com efeito, não iria à festa para a qual não fora convidado. Redigiu a seguinte nota.
NOTA DE ESCLARECIMENTO DO MINISTRO NUNES MARQUES
Em atenção a questionamentos, o Ministro Nunes Marques esclarece, a respeito da nota pública do Tribunal Superior Eleitoral, o seguinte:
O Ministro Nunes Marques não foi consultado previamente em nenhum momento a fim de que pudesse concordar, ou não, com o teor da nota publicada pelo TSE, esclarecendo, por oportuno, que não compõe e ainda não chegou a compor essa Corte Superior.
O Ministro considera legítimo o posicionamento externado pelos demais Ministros que compõem ou compuseram o TSE, na medida em que, imbuídos de elevada preocupação para a construção da democracia em nosso país, têm buscado o aperfeiçoamento do sistema eleitoral.
Feita tal ponderação, o Ministro Nunes Marques reconhece que o debate acerca do voto impresso auditável se insere no contexto nacional como uma preocupação legítima do povo brasileiro e que Sua Excelência, na condição de Juiz, respeitará a expressão da vontade popular a ser externada pelo Congresso Nacional, foro adequado para tais debates, seja mantendo ou alterando a sistemática de votação e apuração de votos, nos termos da Constituição.
RETOMO
Como? Ele considera "legítimo" o posicionamento externado pelos signatários do documento? É mesmo? E se não considerasse, isso significaria o quê? Ah, significaria que um ministro do Supremo estaria aderindo, de forma aberta, ao golpismo. Ao fazer a ressalva, essa adesão corre o risco de ser sorrateira.
Do alto de sua arrogância de dimensões necessariamente minimalistas, reconhece a tal legitimidade do posicionamento como quem faz uma concessão. Em seguida, exercita uma forma oblíqua de adversativa, que corresponde a um "mas", a "no entanto", a um "todavia". Vejam lá "Feita tal ponderação..."
Aí vem a frase infame:
"O Ministro Nunes Marques reconhece que o debate acerca do voto impresso auditável se insere no contexto nacional como uma preocupação legítima do povo brasileiro"...
Pela ordem:
1: o texto dá a entender que a impressão é precondição para a auditagem, o que é mentira;
2: o ministro sugere, o que só se explica que ignorância ou pela má-fé, que o sistema que temos não pode ser auditado. Outra mentira;
3: o voto impresso não é uma preocupação "do povo brasileiro", mas das fatias extremistas do bolsonarismo — não raro, com uma visão muito pouco generosa sobre o próprio povo;
4: ao afirmar que cabe ao Congresso decidir, Nunes Marques está deixando claro que, se convidado, não assinaria a carta. Como não foi instado a fazê-lo, pergunta-se: a quem ele faz questão de deixar registrado o seu voto e a sua gratidão? A nota parece ser uma conversa com a chefia, não é mesmo?;
5: é claro que será o Congresso a definir o destino da emenda de Bia Kicis — aquela não acredita em urna eletrônica, mas acredita que vacinas mudam o DNA... —, mas a nota do TSE não debate esse assunto. Trata-se de contestar o amontado de mentiras que se dizem sobre as urnas eletrônicas e de afastar a ameaça golpista. Uma das mentiras assegura, justamente, que as urnas não são auditáveis.
6: finalmente, note-se o ridículo de um ministro do Supremo que vem a público para dizer que "respeitará a vontade popular", expressa pelo Congresso Nacional. Com isso, obviamente, tenta desqualificar o documento;
7: eis o ministro do Supremo com que Bolsonaro premiou o país. Em sua nota, nem uma vírgula de solidariedade aos ataques de que são alvos os demais ministros.
A nota é pusilânime..
Reitero: ele não foi convidado. Ninguém quis saber a sua opinião. Mas, como se vê, ele a externou.
É do tipo que não quer que tenham a menor dúvida sobre o seu caráter.