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Que Congresso e STF não punam população: transparência e verbas destravadas
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Supremo e Congresso terão de tomar muito cuidado para que não seja o povo a pagar o preço de um confronto. Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidentes, respectivamente, da Câmara e do Senado, entraram com uma petição no tribunal para reverter parcialmente decisão da Corte. Eles querem que os ministros reconsiderem tanto parte das exigências relativas à publicidade de dados sobre as emendas do relator como a suspensão da execução das ditas-cujas.
Cumpre lembrar: por nove votos a um, foi mantida liminar originalmente concedida por Rosa Weber que determina a ampla publicidade de todos os dados relativos às chamadas "emendas do relator" de 2020 e 2021. E isso inclui a divulgação do nome do parlamentar solicitante. Que fique claro: exceção feita a Nunes Marques, todos os ministros concordaram com essa parte da decisão da relatora. Gilmar Mendes só não endossou a suspensão da execução das emendas, decidida por 8 a 2.
No documento enviado à Corte, Lira e Pacheco lembram que os recursos que não forem utilizados servirão para amortizar a dívida pública. E o prazo-limite é 3 de dezembro. A petição argumenta ainda que a suspensão vai além do que reivindicavam as próprias ADPFs que a motivaram — que, com efeito, não solicitavam que o tribunal suspendesse a execução das emendas.
O documento lembra que, se a Corte não reformar a decisão até o dia 3, isso implicará "a destinação (ou "desperdício") dos recursos públicos não empenhados até o término do exercício financeiro, os quais serão devolvidos à Conta do Tesouro Nacional e acabarão sendo destinados para amortizar os juros da dívida pública, em lugar de serem destinados às políticas públicas de utilidade direta para os cidadãos".
Pacheco e Lira sustentam na petição a "impossibilidade fática e jurídica de cumprimento" retroativo da decisão tomada por Rosa e endossada pela Corte, alegando ser impossível determinar a autoria das solicitações feitas ao relator, o que, dizem, se dá, muitas vezes, de maneira informal. Pacheco chegou a se encontrar com Rosa antes de entregar o documento.
Os presidentes da Câmara e do Senado dizem, no entanto, que, doravante, todas as exigências feitas pelo tribunal serão cumpridas — e isso inclui o nome do parlamentar que solicitou o recurso. Sustentam também que, como não havia lei que impusesse tal controle, o Congresso não se ocupou de fazê-lo.
ATO CONJUNTO E PROJETO DE RESOLUÇÃO
A petição enviada ao Supremo se segue a um ato conjunto do Senado e da Câmara em que as Casas se comprometem a cumprir o que determinou o tribunal, mas o fariam a partir de agora. O conteúdo desse ato também está no corpo do documento enviado à Corte e disciplina a divulgação de dados. Nesta sexta, as duas Casas devem votar um Projeto de Resolução para disciplinar a matéria. O relator é o senador Marcelo Castro (MDB-PI)
Vamos ver qual será a decisão dos ministros. Relembro aqui o conteúdo da liminar de Rosa no que respeita à transparência:
"(a) quanto ao orçamento dos exercícios de 2020 e de 2021, que seja dada ampla publicidade, em plataforma centralizada de acesso público, aos documentos encaminhados aos órgãos e entidades federais que embasaram as demandas e/ou resultaram na distribuição de recursos das emendas de relator geral (RP-9), no prazo de 30 (trinta) dias corridos;
(b) quanto à execução das despesas indicadas pelo classificador RP 9 (despesas decorrentes de emendas do relator do projeto de lei orçamentária anual), que sejam adotadas as providências necessárias para que todas as demandas de parlamentares voltadas à distribuição de emendas de relator-geral, independentemente da modalidade de aplicação, sejam registradas em plataforma eletrônica centralizada mantida pelo órgão central do Sistema de Planejamento e Orçamento Federal previsto nos arts. 3º e 4º da Lei 10.180/2001, à qual assegurado amplo acesso público, com medidas de fomento à transparência ativa, assim como sejam garantidas a comparabilidade e a rastreabilidade dos dados referentes às solicitações/pedidos de distribuição de emendas e sua respectiva execução, em conformidade com os princípios da publicidade e transparência previstos nos arts. 37, caput, e 163-A da Constituição Federal, com o art. 3º da Lei 12.527/2011 e art. 48 da Lei Complementar 101/2000, também no prazo de trinta dias corridos"."
No ato conjunto, Pacheco e Lira afirmam que a suspensão da execução das emendas do relator afeta a destinação de R$ 7,510 bilhões à Saúde; de R$ 5,740 bilhões ao Desenvolvimento Regional; de mais de 781 milhões à Educação; de R$ 1,262 bilhão à Agricultura, Pecuária e Abastecimento; de mais de R$ 795 milhões à Cidadania; de R$ 350 milhões à Defesa; de outros R$ 350 milhões à Economia e de R$ 75 milhões à Ciência e Tecnologia.
E AGORA?
Vamos ver:
1: Pois é... Sabe-se que o governo dispõe, sim, de listas informais de parlamentares que solicitaram emendas. Mas não de todas. É plausível a informação de que não se tem esse controle na ponta do lápis. Não ao menos para satisfazer as exigências do Supremo no que respeita ao passado;
2: se, com efeito, os recursos continuarem travados, obras ficarão pela metade, e parte da população vai, sim, pagar o pato do que acabou virando uma lambança orçamentária;
3: de fato, inexiste uma disciplina para indicar a paternidade dos pedidos das chamadas emendas do relator, mas é bom notar que os diplomas legais que instruem a decisão de Rosa, endossada por oito ministros, são o Artigo 37 da Constituição, que dispõe sobre transparência e publicidade de dados, e a Lei de Acesso à informação;
4: estão querendo emprestar por aí um tom de afronta ao Supremo tanto à petição apresentada como ao ato conjunto e ao projeto de resolução. É um exagero. Ainda que o Congresso tivesse como entregar tudo, não seria possível fazê-lo em 30 dias;
5: é bom lembrar que o que se tem até agora é uma liminar endossada pela maioria do pleno. Agora se vai tomar uma decisão de mérito. O que as ADPFs pediam mesmo? A transparência nas decisões. E o Congresso se compromete com ela. O tribunal pode modular a sua decisão, destravar os recursos para não prejudicar a população, como a dizer: "Vá e não peque mais. Está firmada a jurisprudência".
PARA PENSAR
O Ato Conjunto, convenham, acabou sendo uma confissão involuntária de por que as coisas não podem ficar como estão. Vejam os valores. É razoável que todos aqueles bilhões estejam na rubrica de "emendas do relator"? A resposta, obviamente, é não.
De toda sorte, ainda que assim seja, o fundamental é saber a destinação dos recursos e quem os solicitou. Não faz sentido cortar dinheiro que atende a áreas essenciais em nome da transparência. Como está, no entanto, as coisas não podem ficar, e o próprio Congresso concorda. Tanto é assim que se dispõe a mudar.
Que se faça o certo, tomando uma decisão pautada pela razoabilidade. Ou o tribunal acabaria punindo aquela a quem quer proteger: a população.