Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
TSE e as 7 cabeças e 7 sentenças. Absurdo: PL derrubou liminar, não a corte
Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail
O ministro Raúl Araújo prestou um duplo desserviço: quando deu a sua liminar destrambelhada impondo censura prévia ao Lollapalooza e quando simplesmente extinguiu a ação, atendendo à solicitação do PL, que provocara o tribunal. Questões que dizem respeito a controle objetivo de constitucionalidade, como Adin e ADPF, não podem ser retiradas, uma vez apresentadas, nem por iniciativa de quem apelou ao tribunal. Não era o caso, claro: trata-se de uma petição de A contra B, em que A diz ter perdido o interesse na causa.
Muito bem! Tribunais não são a casa da mãe Joana nem servem para partidos e políticos testarem as suas teses. Aliás, recentemente, o TSE se recusou a atuar como consultor do governo numa questão sobre redução de impostos: o Planalto queria saber se estaria incorrendo em crime eleitoral caso recorresse a tal expediente em ano de eleição. Obviamente, os ministros não podem se comportar como se fossem servidores da Advocacia Geral da União. O tribunal nem sequer tomou conhecimento.
O usual é, sim, que, numa pendenga entre A e B, em questão que não envolve controle de constitucionalidade, que se declare prejudicado o objeto se o peticionário original desistiu da causa. Mas nada impede o relator de ouvir os seus pares, em qualquer circunstância. É o que o Araújo deveria ter feito. É preciso que o tribunal seja claro a respeito do que diz a lei. É evidente que ela tem como alvos os candidatos, os partidos, os agentes políticos, não os cidadãos comuns — e artistas são cidadãos comuns. Inexiste a figura da "campanha eleitoral antecipada" para o José, a Maria, o João ou a Tereza. E, portanto, também para Pabllo, Emicida e outros quaisquer.
As coisas não ficaram bem: para todos os efeitos, a liminar do ministro, na leitura absurda que ele fez da lei, segue hígida no seu conteúdo, ainda que a ação esteja extinta. Isto é: ainda que desrespeitada, era a expressão, enquanto vigorou, da decisão do tribunal, mesmo que monocrática.
Por isso mesmo, quando menos, o próprio Araújo deveria ter suscitado uma questão de ordem para que o caso fosse debatido e para que se assentassem as devidas distinções entre os agentes políticos e os cidadãos comuns. Todos estão protegidos pelos Artigo 5º e 220 da Constituição. Os que, no entanto, são operadores da política estão submetidos a restrições que não podem ser impostas ao demais, que, por seu turno, não dispõem dos instrumentos próprios dos políticos.
Como as coisas ficaram, temos que a liminar do ministro estaria, então, de acordo com a lei, cabendo, vejam que absurdo!, ao PL a arbitragem final sobre a sua invalidade. Isso é uma aberração: aquele que provocou um ministro do tribunal a tomar uma decisão atrabiliária se transforma no instrumento da sua inocuidade. Não faz nenhum sentido.
Aliás, entendo que qualquer um dos sete ministros pode ainda suscitar uma questão de ordem para cuidar precisamente da causa de fundo que motivou o pedido e a concessão de liminar: a distinção entre o cidadão comum e o político do que diz respeito à chamada campanha eleitoral antecipada.
Mais: doravante, os ministros poderiam fazer uma espécie de combinação entre si, absolutamente dentro da lei, da ordem e das regras do jogo: evitar a concessão de liminares sem ao menos uma consulta prévia e informal que fosse a seus pares. Para que os entendimentos possam ser unificados. Esta pode ser a eleição mais judicializada na história: a toda hora ao TSE deve ser convocado. E não convém que se tenham sete homens e sete sentenças. Aí é bagunça na certa.