Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Bolsonaro vê saída para lama que engolfa governo, ônibus e pastores: golpe
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O presidente Jair Bolsonaro voltou a ameaçar o país, nesta terça, com um golpe de Estado em solenidade de cumprimento aos novos oficiais-generais das Três Forças. Apelou àquele discurso cafona de sempre sobre dar a vida para defender a pátria ameaçada — coisa de soldado raso com complexo de general. Bolsonaro, notem bem, entrou nas Forças Armadas e não passou do posto de capitão. Como não tinha disciplina, era excessivamente ambicioso e destituído de pensamento lógico — segundo superiores —, não iria mesmo longe. E não foi.
O Exército o chutou depois que descobriu planos seus e de um amigo para explodir bombas em dependências da Força e para mandar para os ares a adutora do Guandu, no Rio. O "mau soldado", como o chamou Ernesto Geisel, migrou para a política. E só por esse caminho conseguiu ser o chefe dos oficiais-generais. Restou o complexo, tudo indica. Na Presidência da República, já humilhou com demissão uma dezena de generais. O mais recente a ir para o paredão é Silva e Luna, presidente da Petrobras e ex-ministro da Defesa. A aparente deferência do "capitão" pelas Forças Armadas está mais para a derrisão do que para a admiração. Ainda voltarei ao ponto. Falemos um tantinho de corrupção.
ÔNIBUS ATOLADOS NA LAMA
Lembram-se daquela metáfora cara à direita brasileira, o tal "mar de lama" que Carlos Lacerda via no governo Vargas -- aquele eleito pelo povo? Pois é. A gestão Bolsonaro está afundando na lama. E está claro que o Ministério da Educação é hoje a fonte que alimenta tanto os amadores da traficância com dinheiro público como os profissionais. A lambança com a compra de ônibus escolares é coisa da pesada, grana da grossa. O superfaturamento, ao menos o planejado -- segundo os técnicos da própria AGU -- está na casa dos R$ 700 milhões.
Da noite para o dia, a compra de 3.850 veículos escolares, orçada em R$ 2,045 bilhões, caiu para R$ 1,5 bilhão quando ficou evidente que o escândalo viria à luz. Ainda assim, está acima do R$ 1,3 bilhão estimado pelos técnicos da AGU. Sabem como é... Devemos ficar contentes porque, afinal, o sobrepreço baixou de mais de R$ 700 milhões para pouco mais de R$ 200 milhões?
E quem está, vamos dizer, na raiz de todos esses cálculos? O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), cujo presidente obedece às ordens de Ciro Nogueira, chefe da Casa Civil. É ele quem manda na área, não o ministro da Educação. Mas calma aí! Há uma parceria. Quem autorizou mesmo o pregão foi o diretor de Ações Educacionais do fundo, Garigham Amarante, que é homem de Valdemar Costa Neto, presidente do PL, o partido para o qual migrou Bolsonaro.
"AH, TIO REI! AGORA ENTENDI!!!"
"Reinaldo, o FNDE não é aquele mesmo fundo em que operavam os tais pastores, que cobravam dos prefeitos R$ 15 mil só para encaminhar pedidos de verbas e depois uma outra taxa de sucesso?" Sim, é o mesmo! Lembram-se que escrevi nesta coluna que os pastores pilantras estavam sendo vítimas de fogo amigo? Que eram sapos de fora coaxando em lama que já tinha donos? Que estavam fazendo uma Intermediação que não passava pelo Centrão? É preciso entender a natureza de certos aliados do governo: não admitem concorrência na safadeza. O modelo é, vamos dizer, verticalizado. Os pastores, com todo o seu desassombro, são amadores. A compra dos ônibus é verdadeiramente coisa de profissionais. Entendem? Ah, sim: vocês têm alguma ideia de quem entregou a dupla -- e também o ministro da Educação -- aos leões? Não é que eles não mereçam. Mas seus algozes gostam mesmo é de buzão superfaturado. "Ah, Tio Rei, agora entendi!" Pois é!
Ciro Nogueira gosta de encontros secretos. Vídeos que circulam na Internet evidenciam que nem sempre ele é bem-sucedido nesse esforço. Ah, a alta moralidade com que o centrão governa o Brasil!!! Antes de se ajustar o valor do pregão, com a redução de mais de R$ 500 milhões — embora a CGU visse sobrepreço de mais de R$ 700 milhões —, o ministro esteve com o seu homem do FNDE. Não há vídeo circulando nas redes, mas esteve.
DE VOLTA AOS MILITARES
Falando aos novos oficiais-generais, disse o presidente:
"Se a pátria, um dia, voltar a nos chamar, por ela tudo faremos, até mesmo com o sacrifício da própria vida".
Como o país não está para entrar em guerra; como Putin não está nas nossas fronteiras — na verdade, Bolsonaro é que foi procurá-lo —, é claro que está tratando de questão interna, não é? O "voltar" é alusão ao golpe de 1964, e o evento que poderia levar, nessa formulação, a uma nova quartelada são as eleições e outubro — na verdade, é a vitória de Lula.
E o golpista continuou:
"O bem sempre venceu. E vencerá também essa batalha que temos pela frente".
Bem, é mentira! Bolsonaro é a prova de que o mal triunfa às vezes. Ou ele não estaria fazendo discurso golpista a oficiais-generais — não, ao menos, sem que, ato contínuo, a Procuradoria Geral da República enviasse ao STF um pedido de abertura de inquérito. Mas Augusto Aras está ocupado em bater boca com Rosa Weber para tentar livrar o presidente de uma outra investigação — no caso, por prevaricação.
Eis aí, senhores militares, o governo que Bolsonaro pede que vocês defendam, nem que seja sob pena de rasgar a Constituição e perder a vida.
Disse ainda que o "ministro da Defesa tem as tropas nas mãos" e que pode, se preciso, "fazer o país rumar para a normalidade". Entenda-se, claro!, por anormalidade a vitória de um adversário ideológico de Bolsonaro. Sim, ele está se referindo a Lula. E aí se queixou: "Não é fácil a vida", afirmando que o país ainda "está conturbado por questões ideológicas".
Roubar R$ 700 milhões do FNDE só na compra de ônibus escolares nada tem a ver com ideologia, é claro! É ladroagem mesmo! Assim como a propina cobrada por pastores pilantras. A propósito: o Ministério da Defesa liberou R$ 588 milhões por intermédio do Orçamento secreto, no âmbito do projeto "Calha Norte", usado apenas como rubrica mimar os aliados. O golpista quer uma ditadura para construir seu castelo no mar de lama.
Os ônibus explicam por que Ciro Nogueira, que achava Bolsonaro "fascista" em 2018, passou a vê-lo como um grande estadista.
O dinheiro compra até o amor verdadeiro, não é mesmo, Nelson Rodrigues?
O " capitão" gostaria de liderar uma ditadura para se livrar também de gente como Nogueira e Arthur Lira. Tem uma certa curiosidade de saber como é esse troço de governar o Brasil... Mas venham cá: nessa hipótese, por que os generais precisariam dele, que não sabe nem fazer o "O" com o copo?