Reinaldo Azevedo

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Opinião

Sabe-se o que quer Bolsonaro, o golpista. Mas e Musk? Esse é o X da questão

O que explica o ataque de Elon Musk ao ministro Alexandre de Moraes e ao Supremo? A parceria com Jair Bolsonaro e seu entorno é escancarada. E se pode imaginar: se o multibilionário quer colonizar Marte, por que não um país? O cara é um reacionário notório, mas será que se move por ideologia? Falta a peça principal nesse enredo.

Então o tal se mobiliza — e a articulação com extremistas de direita dentro e fora do Brasil é evidente e demonstrável — para derrubar o ministro de uma corte suprema porque, sei lá, seria obcecado pela "liberdade de expressão", a ponto de rasgar dinheiro? Sua desenvoltura ao negociar com notórias ditaduras não faz dele exatamente um paladino do livre pensamento.

O GOLPE NÃO ACABOU
Bolsonaro e sua turma estão no jogo de sempre. O golpe ainda não acabou. Vive-se apenas uma nova fase. O tribunal sempre foi um entrave aos delírios absolutistas do capitão arruaceiro. Patrocinou a primeira manifestação de rua contra o Supremo e o Congresso ainda em 26 de maio de 2019. Depois do acordo com o Centrão, que levou Arthur Lira ao topo, o alvo fixo passou a ser apenas o STF, o que piorou durante a pandemia. Afinal, os magistrados o impediram de executar livremente sua política de homicídio em massa.

Tornado inelegível pelo TSE e investigado por golpe de estado e outros crimes, com Moraes como relator dos inquéritos, o ex-presidente passou a contar com um aliado cujo peso se mede em bilhões de dólares. Mas esperem: Musk ganha o quê?

O esquisitão não tardou em voltar a sua retórica insana também contra Lula, o que é mel na sopa para a extrema-direita. Haveria, assim, um conluio entre o petista e o ministro para... Bem, sabe-se lá para quê. Ele resumiu o seu suposto entendimento da história num tuíte:
"Como Alexandre de Moraes tirou Lula da prisão e botou o dedão na balança para elegê-lo, Lula obviamente não vai fazer nada contra ele. A próxima eleição será fundamental".

Pronto! Eis o resumo da história para o Mito e seus fanáticos:
- Lula teria saído da cadeia em razão de uma tramoia, atribuída a Moraes;
- a eleição foi fraudada, com o dedo do ministro;
- o presidente nada fará contra o magistrado (como se pudesse, ainda que quisesse) porque este o teria "na coleira";
- cumpre pensar na próxima eleição.

Sendo assim, o que fazer? O dono do foguete pediu a renúncia ou impeachment do ministro. Em entrevista ao Roda Viva na segunda, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) disse que nem é preciso chegar a tanto, razão por que foi chamado de "frouxo" pelos fanáticos. Fez a reivindicação que certa imprensa chamaria de "moderada":
"Sempre que eu puder, vou buscar o diálogo. Não acho que o caminho de fazer o impeachment de ministro é que vai resolver o problema do Brasil. Eu sempre acreditei numa autorregulação do próprio Supremo. Eu acho que essa é uma excelente oportunidade para que o Supremo tente retomar as rédeas da Corte: parar de ser toda hora sugada para dentro de uma discussão que não é institucional; é relativa apenas a um ministro. Para que as coisas voltem à normalidade. Só vão voltar à normalidade quando esses inquéritos todos forem arquivados. É isso que eu espero que o presidente do Senado faça: busque o presidente do Supremo Tribunal Federal. Tenha uma conversa franca, de olho no olho, porque o Brasil está cheio de problema."

Tudo plenamente entendido. Garanta-se a impunidade a golpistas e a outros criminosos, e Moraes permanece no cargo. Flávio não chegou a pedir a elegibilidade do pai, mas isso viria por gravidade, não é?

Muito bem! Entendemos o que querem os bolsonaristas.

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Isso não basta. Voltemos a Musk.

O RIDÍCULO
A aparente maluquice é de tal ordem que a "X Brasil Internet Ltda" entrou com uma petição no STF para que a responsabilidade pelo cumprimento de determinações judiciais fosse transferida à X Internacional. É espantoso. Moraes, obviamente, recusou o pedido e disse que ele "beira a litigância de má-fé". Escreveu:
"Em última análise, a empresa requerente busca uma verdadeira cláusula de imunidade jurisdicional, para a qual não há qualquer previsão na ordem jurídica nacional. Pelo contrário: o fato de que uma das chamadas operadoras internacionais compõe o seu quadro social sugere um abuso da personalidade jurídica, pois poderia optar por não atender às determinações da Justiça brasileira sem sofrer qualquer consequência, encoberta por sua representante no Brasil".

O "beira" é uma generosidade retórica. A petição é o que é: sabidamente inaceitável — e o sabe, desde o princípio, também quem peticionou. Restaria indagar que diabos, então, faz a equipe do X no Brasil.

A diatribe judicial é compatível com a investida de Musk. Mas ela não serve de explicação ou de fecho para a história. Por que resolveu pilotar ele mesmo o foguete colonialista? Poder-se-ia, vá lá, até enobrecê-lo um tanto, emprestando-lhe a vocação dos ideólogos. Mas ele é quem é: o cara que nunca quer saber quantos cadáveres, esquartejados ou não, ajudam a escrever a biografia de seus parceiros comerciais.

É preciso saber as razões do negociante e se tem outros parceiros, além da canalha golpista.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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