Policiais civis e bombeiros garantem 30% do efetivo no Rio; PM tem divergências
As entidades de classe da segurança pública do Rio de Janeiro, que declararam greve oficial no final da noite de quinta-feira (9), já se organizam para lidar com as suas respectivas demandas sem prejudicar a população fluminense. Policiais civis e bombeiros adiantaram que vão manter 30% de seus efetivos apenas para ocorrências emergenciais. A PM, porém, ainda não tem um planejamento definido.
"Há os que querem a paralisação total, o que pode gerar tumulto nas ruas e prejudicar a imagem da corporação. Particularmente, eu prefiro que os 30% do efetivo sejam mantidos para casos de emergência", afirmou um cabo que integra uma das várias comissões da PM, e que pediu para não ter o seu nome publicado.
Na versão oficial dos policiais militares, há apenas uma comissão representativa formada por sete agentes de vários batalhões. Todas as decisões são tomadas a partir de consenso democrático, e o que teria ficado acertado é que 70% dos PMs ficarão aquartelados permanentemente, enquanto o restante estaria de prontidão para atender as demandas mais graves.
"Estamos organizando um movimento pacífico, no qual os responsáveis pelo policiamento ostensivo, isto é, 70% da corporação, ficarão aquartelados", afirmou o soldado do 28º BPM (Barra Mansa) Thiago Rodrigues.
Já um major que também pediu para não ter seu nome publicado, pois tem medo de represálias, afirmou categoricamente que toda a corporação ficará aquartelada.
"Nós vamos parar tudo para que o governador Sérgio Cabral pare de agir como uma criança mimada. Se ele não tratar os policiais com respeito, vai morrer muita gente. Vai acontecer a mesma coisa que aconteceu na Bahia", afirmou após deixar o palanque montado na praça da Cinelândia.
No anúncio oficial de greve, declarada pelo porta-voz Wellington Machado, cabo do 22º BPM (Maré), o discurso também era mais radical. "Qualquer ocorrência que ocorrer na cidade é de responsabilidade do exército e da Força Nacional de Segurança", disse.
Já o cabo do CBMERJ (Corpo de Bombeiros Militar do Rio de Janeiro) Laerte Soares, lotado no 2º Gmar (Grupamento Marítimo da Barra da Tijuca), garantiu que 30% da corporação estarão a postos para qualquer tipo de ocorrência "essencial" ou "perigo eminente da vida" -- tais como "desmoronamento, casos de incêndio ou afogamento, recolhimento de cadáveres, entre outros", explicou.
Gravações mostram PMs combinando ações de vandalismo
Além disso, os guarda-vidas atuarão descaracterizados em homenagem à prisão do cabo Benevenuto Daciolo, líder do movimento S.O.S Bombeiros, preso na noite de quarta-feira (8). "Não vamos usar a farda do Estado para lembrar o absurdo que ocorreu com a prisão ilegal do Daciolo", disse.
De acordo com o diretor-jurídico do Sindpol (Sindicato dos Policiais Civis), Francisco Chao, a Polícia Civil também trabalhará com 30% de seu efetivo, que serão preenchidos apenas pelos agentes que se encontram em estágio probatório. A categoria seguirá a cartilha de greve da Cobrapol (Confederação Brasileira de Policiais Civis).
"Apenas as ocorrências emergenciais serão registradas, tais como violência grave ou ameaça de violência grave, Lei Maria da Penha, furto de veículo (pois o mesmo pode ser utilizado em algum crime posterior). No entanto, não haverá a parte de investigação. A Divisão de Homicídios, que vem realizando um excelente trabalho há anos, também não vai parar", garantiu Chao.
"Em nenhuma hipótese serão aceitos atos de vandalismo da Polícia Civil", finalizou.
Aquartelamento nas UPPs
"Os policiais das UPPs vão ficar aquartelados nas próprias comunidades", garantiu o cabo da Polícia Militar Pablo Rafael, do 28º BPM (Barra Mansa), integrante da comissão representativa da categoria.
Segundo ele, os grevistas não acreditam que facções criminosas tentarão retomar o controle das favelas pacificadas a partir do anúncio oficial de greve. "De forma alguma, pois haverá reforço de contingente. Os policiais de folga também ficarão aquartelados nos UPPs. Se alguma coisa nesse sentido acontecer, eles vão se defender", afirmou Rafael.
"Culpa do governador"
O sargento do 1º GSE (Grupamento de Socorro e Emergência) Paulo Nascimento havia afirmado que o governador Sérgio Cabral teria até 23h59 de ontem para aceitar as reivindicações da categoria e evitar uma greve geral das entidades de classe da segurança pública fluminense.
Segundo o sargento do Corpo de Bombeiros, a ideia dos grevistas é a de "evitar o pânico". Por esse motivo, os manifestantes pedem que a população do Rio "evite transitar pelas ruas a partir de amanhã", conforme anunciava uma mensagem de um carro de som próximo ao palanque montado na praça da Cinelândia, no centro do Rio.
"Essa medida é para evitar acidentes ou colisões. A gente não quer criar pânico. Acendemos um pavio e, se tiver explosão, é culpa do governador", disse.
Nascimento afirmou ainda que não tem medo de ser preso, a exemplo do cabo Benevenuto Daciolo --líder do movimento S.O.S Bombeiros que foi preso na noite de ontem após divulgação de uma interceptação telefônica na qual ele supostamente "incita" a greve.
"Nosso movimento não tem uma só liderança. Na verdade, nós somos líderes das nossas famílias, e por elas que estamos lutando. Eu perdi o medo há muito tempo. Desde o dia em que invadiram o quartel central da corporação e nós não desmobilizamos", finalizou.
Assembleia
Cerca de 5.000 manifestantes (número ainda não confirmado pelas autoridades), entre policiais civis e militares, bombeiros e agentes penitenciários, compareceram na noite desta quinta-feira (9) à praça da Cinelândia, no centro do Rio de Janeiro, para a assembleia conjunta que definiu o início da greve.
O momento de maior comoção entre os manifestantes foi quando uma das lideranças anunciou que todo o efetivo do Corpo de Bombeiros e da Polícia Militar foi proibido de deixar os quartéis. Segundo o comandante do Corpo de Bombeiros Militar do Rio, Sérgio Simões, os militares estão em regime de prontidão, e não de "aquartelamento". O comando da PM ainda não se pronunciou sobre o assunto.
Reivindicações
De acordo com o sargento Paulo Nascimento, lotado no 1º GSE (Grupo de Socorro e Emergência), as principais reivindicações unificadas das quatro forças da segurança pública do Rio são: piso salarial de R$ 3.500, auxílio-alimentação na ordem de R$ 350 (e fim dos ranchos nos quartéis), e uma jornada de trabalho de 40 horas semanais.
Os militares aceitam uma carga horária maior do que a reivindicada, desde que o governo do Estado pague hora extra.
O governo já descartou o piso de R$ 3.500 e mandou um projeto de lei sobre o reajuste aos deputados, que o aprovaram nesta quinta-feira. O projeto define que todas as 11 parcelas do aumento previsto para este ano (0,915% mensal) serão aplicadas já neste mês. Até fevereiro de 2013, isto é, em um período de um ano, o somatório do reajuste escalonado será de 39%, e o piso salarial chegará a R$ 2.077 --considerando o adicional do auxílio-moradia (R$ 551,36). Policiais civis e agentes penitenciários não recebem tal benefício.
Após uma reunião emergencial do governador Sérgio Cabral (PMDB) com a chefe de Polícia Civil do Rio, Martha Rocha, e o presidente da Alerj, Paulo Melo (PMDB), na noite de ontem, o governo do Estado fez uma nova proposta: além da antecipação do reajuste escalonado --que foi aprovado em 2010--, os profissionais da segurança pública terão direito a uma nova reposição em 2014.
O aumento previsto para daqui a dois anos levará em consideração a inflação acumulada do IPCA em um espaço temporal de 12 meses (de fevereiro de 2013 a fevereiro de 2014), e corresponderia, segundo o governo estadual, ao dobro da inflação no período.
Além disso, os servidores serão beneficiados a partir de 2014 com um auxílio-transporte no valor de R$ 100 mensais e a garantia de que não mais haverá corte da gratificação da Delegacia Legal em caso de afastamento por acidente de trabalho.
Deputada cobra "direitos iguais"
A deputada estadual Janira Rocha (PSOL), que aparece em gravações telefônicas autorizadas pela Justiça e exibidas pelo "Jornal Nacional" articulando o movimento grevista junto com o cabo do Corpo de Bombeiros Benevenuto Daciolo, uma das lideranças do movimento, cobrou "direitos iguais" ao comentar a prisão de Daciolo, na noite de ontem –realizada após a divulgação das gravações.
"Eu tenho a liberdade de falar, pois vivemos em uma democracia. Nós estávamos discutindo sobre o momento do ponto de vista político. A presidente da República, Dilma Rousseff, fatalmente ligou para o governador Sérgio Cabral para debater sobre o assunto e falar sobre as perspectivas do governo. O mesmo direito que ela tem, eu tenho", argumentou.
Segundo a parlamentar, ela mantém "contatos regulares" com Daciolo desde o movimento grevista do Corpo de Bombeiros iniciado no segundo semestre do ano passado.
"A diferença é eu honro as minhas calças e assumo isso. Não há problema nenhum em discutir política seja com o Daciolo ou qualquer outro integrante do movimento", afirmou.
"Meu marido não é bandido”
A mulher do cabo Benevenuto Daciolo afirmou que o marido está sendo mantido em uma penitenciária de segurança máxima (Bangu 1, na zona oeste), a mesma utilizada para abrigar criminosos de alta periculosidade.
Segundo Cristiane Daciolo, que está na assembleia das categorias, este será o argumento do defensor público do marido na hora de protocolar o pedido de habeas corpus.
"A prisão do Daciolo é totalmente ilegal. Ainda não consegui contato com ele, pois meu marido está isolado em Bangu 1, não nos deram qualquer tipo de acesso a ele, nem para a família nem para o defensor público. Meu marido não é bandido. Estão negando a ele o seu direito de defesa", disse.
Cristiane reclamou que o coronel Sérgio Simões, comandante do Corpo de Bombeiros, não autorizou que ela e a filha visitassem Daciolo quando ele ainda estava detido no quartel central da corporação.
"O Simões não quis nos receber e deixou com que eu e minha filha ficássemos até cinco horas da manhã na porta do quartel, sentadas na calçada", afirmou.
O último contato que Cristiane teve com o marido foi quando ele ainda estava no avião, voltando da Bahia em direção ao Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão. "Ele já sabia que ia ser preso quando desembarcasse e me ligou para avisar”.
Na versão de Cristiane, o cabo líder do movimento grevista só viajou para a Bahia a convite de um juiz militar e da AMB (Agência de Magistrados do Brasil). "Eles queriam que o Daciolo ajudasse e intermediasse e negociação com os policiais militares da Bahia. Acredito que a desocupação da Assembleia Legislativa só foi possível por causa dele", finalizou.
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