TRF recusa mandado de segurança do MPF contra transferência de julgamento de chacina para Unaí
O Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF1) não recebeu o mandado de segurança do Ministério Público Federal (MPF) em Minas Gerais que pede a suspensão temporária da transferência para Unaí (MG) do julgamento dos oito acusados pela chacina em que foram assassinados em 2004 três auditores fiscais do Trabalho e um motorista, também servidor do Ministério do Trabalho.
A decisão do desembargador federal Hilton Queiroz, da 2ª Seção do TRF1, de acordo com a assessoria do tribunal, não entrou no mérito do pedido, e considerou apenas que a competência para apresentar o mandado de segurança é da Procuradoria Regional da República, unidade que atende à segunda instância da Justiça Federal. A sentença ainda será publicada no Diário Oficial da Justiça Federal.
Como não houve julgamento de mérito, a decisão da juíza federal Raquel Vasconcelos Alves de Lima de enviar para Unaí o processo da chacina - que transcorria em Belo Horizonte - ainda pode ser modificada pelo TRF1.
Isso pode ocorrer por meio da apresentação de um novo mandadode segurança a partir da Procuradoria Regional da República junto ao TRF1, que tem sede em Brasília. Além disso, o MPF também apresentou recurso, ainda não apreciado, contra a transferência do tribunal de júri da chamada Chacina de Unaí, ocorrida em 2004.
“Isso a gente contorna”, disse à Agência Brasil a procuradora da República Míriam Moreira Lima, responsável por impetrar, além do mandado de segurança, o recurso com que tenta reverter a decisão da juíza Raquel Vasconcelos. Responsável também pela denúncia criminal contra os nove réus, a procuradora quer manter o tribunal de júri em Belo Horizonte (MG), onde o processo tramita há nove anos, e que ainda está sem data definida para julgamento.
A procuradora admite até mesmo a possibilidade de a própria Procuradoria da República em Minas Gerais reapresentar o mandado de segurança. “Existe divergências quanto a quem compete fazer isso, mas eu mesma, em outros casos, interpus [no TRF] mandados de segurança que foram recebidos. Há precedentes favoráveis e contrários”, explicou.
No último dia 25 de janeiro, três dias antes de o crime completar nove anos e ante a expectativa de que, enfim, fosse anunciada a data do início do julgamento dos réus, a juíza Raquel Vasconcelos, da Justiça Federal em Belo Horizonte, declarou que a competência para conduzir o tribunal de júri deveria caber à Vara Federal de Unaí, no município onde os fatos ocorreram.
Para justificar sua decisão, a juíza alegou que, embora em 2004 o processo tenha sido instalado em Belo Horizonte, por não haver em Unaí ou região uma representação da Justiça Federal, a cidade onde o crime ocorreu já conta com uma vara federal, inaugurada há cerca de dois anos.
A juíza argumenta na decisão que o julgamento em Unaí garantiria aos acusados o direito de serem julgados “por seus pares […] aqueles que conhecem a realidade em que vive o réu, que integra a mesma comunidade, aqueles com reais condições de aferir a conduta imputada ao réu e seus motivos”.
Já para a procuradora Miriam Moreira Lima, a transferência de competência para Unaí, além de retardar ainda mais o julgamento, ameaça a isenção do processo, já que, segundo ela, os réus acusados de mandantes do crime desfrutam de prestígio e de poder político e econômico em Unaí. Como exemplo, cita Antério Mânica, apontado como um dos mandantes do crime e um dos maiores produtores de feijão do país. Foi eleito prefeito de Unaí pouco depois da chacina e reeleito em 2008.
A preocupação com a isenção do júri é compartilhada por entidades de classe, como o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), e autoridades, a exemplo do presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, Domingos Dutra (PT-MA), e da ministra da Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário.
A chamada Chacina de Unaí ocorreu em 28 de janeiro de 2004. Para evitar que crimes como esse caiam no esquecimento, a data foi escolhida como Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. Embora tenha repercutido mundialmente, os sucessivos recursos e apelações apresentados pelos réus contribuíram para que, passados nove anos, os réus ainda não tenham sido julgados, apesar da recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Nove pessoas foram denunciadas por participar do homicídio triplamente qualificado. Como mandantes, estão os fazendeiros e irmãos Antério e Norberto Mânica e os empresários Hugo Alves Pimenta, José Alberto de Castro e Francisco Elder Pinheiro. Além desses, Erinaldo de Vasconcelos Silva e Rogério Alan Rocha Rios são apontados como autores materiais do crime; Willian Gomes de Miranda é acusado de dirigir o veículo usado pelos assassinos; e Humberto Ribeiro dos Santos, de apagar registros de hospedagem dos pistoleiros pela cidade.
Um dos réus, o empresário Francisco Elder, morreu no último dia 7, aos 77 anos. Ele aguardava o julgamento em liberdade. Erinaldo, Rogério e Willian estão presos em Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte, à espera da sentença judicial.
Humberto Ribeiro dos Santos foi solto a pedido do próprio MPF, pois o crime pelo qual foi denunciado prescreveu. Os outros réus, justamente os que detêm maior poder aquisitivo, aguardam o julgamento em liberdade, beneficiados por habeas corpus.
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