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Chuvas no RS tiram 1.700 pessoas de casa e três cidades decretam emergência

Lucas Azevedo

Do UOL, em Porto Alegre

14/07/2015 20h33

A intensa chuva que cai sobre o Rio Grande do Sul desde a noite de domingo já deixa 1.700 desalojados ou desabrigados em diversas regiões do Estado. Conforme a Defesa Civil do RS, 32 cidades foram seriamente afetadas pelas chuvas. Até o final da tarde desta terça, ao menos três municípios, Esteio, Rolante e Riozinho, haviam decretado situação de emergência.

As regiões em estado mais crítico são os vales dos rios Caí e do Sinos, na Grande Porto Alegre. E é no vale do Sinos que está situada Esteio, cujo bairro Ezequiel está praticamente embaixo d'água.

“Quando vimos a geladeira boiando, saímos de casa”, conta Aline Oliveira, 33 anos. Recuperando-se de uma cirurgia, ela lamenta a situação, especialmente pelo filho, um bebê, que perdeu seu enxoval. “Olha as coisinhas do meu filho boiando”, disse entre lágrimas.

O nível d'água na região subiu rápido. Dois córregos que passam pelo bairro, o Sapucaia e o Esteio, transbordaram, fazendo com que rapidamente as águas invadissem as casas. “Acordamos com a água pela canela. Em pouco tempo, o motor do carro já estava coberto.” O veículo, recémcomprado, ainda vai levar três anos para ser quitado. “É tão difícil a gente conseguir as coisas. Daí vem uma chuva dessas e leva tudo”, lamenta.

Com ajuda de parentes, Aline tirava de casa o que conseguia levar e o que coubesse na caminhonete de um parente. Mas rapidamente foi desencorajada a retornar em casa. “Já tem cobra nadando no pátio”, reclamou.

Aline passará a noite na casa da sogra, na cidade vizinha de Sapucaia do Sul, que também sofre com alagamentos. Entretanto, há vizinhos que não têm para onde ir.

Alagamentos são recorrentes

Moradores do bairro residencial de classe média baixa encontram abrigo no salão paroquial da igreja São Sebastião. Quase todos os anos o local recebe famílias da região que têm as casas cobertas pela cheia dessa época.

Um dos abrigados no ginásio, José Luis Alves, 50, resume o sentimento da maioria dos moradores do bairro. “Tem gente aqui que vive no bairro há 30 anos e sempre passa por isso. Todo ano tem que comprar os móveis que perdeu.” Alves lamenta a perda dos documentos no alagamento deste ano. "A identidade e o CPF eu salvei porque estavam comigo. Mas Carteira de Trabalho, certidão de casamento, de nascimento, tudo se foi.”

Na tarde desta terça-feira (14), os voluntários que atendem o local já contabilizavam cerca de 160 famílias que buscavam refúgio no ginásio, pouco maior que uma quadra de esportes. De acordo com a prefeitura de Esteio, até as 18h30 desta terça-feria, 1,5 mil pessoas estavam desalojadas (mas recebiam abrigo em casa de amigos e parentes) e 500 desabrigadas (recolhidas em locais destinados pela prefeitura).

'Às 5h, a água já estava pelo pescoço'

“Tivemos que desistir de ficar em casa. Às 5h a água já estava pelo pescoço. Deixei o cachorro sobre um reboque até buscar ajuda. Agora, quando voltei, o reboque estava boiando e o cachorro lá em cima”, conta Mauro Rosa, 33, ao tirar do barco seu amigo, Beethoven.

Vizinho de Rosa, o aposentado Valmor Marques, 68, conta que perdeu grande parte dos eletrodomésticos, mas conseguiu salvar os animais de estimação. “Coloquei os cachorros dentro do armário da cozinha. Agora eles estão aqui dentro do carro, que a água inutilizou”, conta, mostrando os estragos internos do veículo, com os bancos molhados e sujos de lama. Lá dentro, assustados, os três cães da família.

Em uma rápida caminhada pelo bairro, foi fácil encontrar relatos dramáticos. “Já enfrentei seis enchentes aqui. Mas nenhuma igual a essa”, explica Vânia Mello, 56. Segundo ela, obras da prefeitura para o alargamento de uma avenida acabaram reduzindo o leito de um dos córregos, que tem transbordado mais facilmente.

“Está sendo surreal. Das outras vezes a gente conseguia levantar os móveis dentro de casa e salvar alguma coisa. Agora, não tenho mais nada”, reclama. Ela conta que após o temporal da noite de segunda-feira, a água começou a subir. Mas foi com a chuva forte da madrugada de terça que a enchente tomou um volume insuperável.

“Às 4h a água começou a subir tão rápido, que parecia que tinham aberto um dique. Não tinha mais como salvar nada. Às 7h, saí de casa com água pelo peito. Tentamos aguentar para salvar o que dava. Mas tudo começou a flutuar”, recorda.

Previsão de chuva menos intensa

A meteorologia estima que a chuva forte não deve retornar tão cedo ao Rio Grande do Sul.Entretanto, a umidade continua, dessa vez com o declínio acentuado das temperaturas. Uma frente fria vinda do sul do continente está se deslocando pelo Estado, afastando uma corrente de de ar quente que havia ingressado em território gaúcho no domingo.

A empresa de meteorologia MetSul alerta, entretanto, que a maior preocupação, a partir desta terça-feira, é com a cheia dos rios. A chuva – menos intensa – permanece ao longo das bacias e nas cabeceiras dos rios que cortam os vales, transbordando nas planícies. Conforme os meteorologistas, o quadro exige muita atenção.