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Denúncias de abuso sexual crescem no Metrô de SP; veja os horários mais perigosos

Protesto em 2015 na estação República após uma atendente ser estuprada no local - Julia Chequer/Folhapress
Protesto em 2015 na estação República após uma atendente ser estuprada no local Imagem: Julia Chequer/Folhapress

Marcelle Souza e Caio do Valle

Colaboração para o UOL, em São Paulo

12/01/2017 04h00

Pela manhã, as mulheres que se deslocam de trem ou de metrô por São Paulo têm mais chances de sofrer uma “encoxada” ou ter partes íntimas tocadas sem consentimento. Isso é o que apontam os dados de ocorrências registradas pela Delpom (Delegacia de Polícia do Metropolitano), obtidos pelo UOL por meio da Lei de Acesso à Informação.

Entre janeiro e outubro do ano passado, o Metrô e a CPTM registraram 168 casos de abuso sexual em suas dependências. Desses, 31 ocorreram entre 8h e 8h59. O segundo horário com mais registros é entre 7h e 7h59, com 24 episódios desse tipo. Há picos de ocorrências também das 18h às 18h59 (20 casos) e das 19h às 19h59 (15 registros).

Os números levam em conta três tipos de casos: estupro e violação sexual mediante fraude (que são crimes previstos no Código Penal e passíveis de prisão) e importunação ofensiva ao pudor (que não é considerado crime, e sim contravenção em que a pena prevista é uma multa).

Houve um aumento expressivo de registros de abuso nos últimos cinco anos: em 2012, foram oito ocorrências; em 2013, subiu para 17; em 2014, foram 70. Somadas as três categorias, foram 168 registros de abusos em todo o ano de 2015.

“Eu não acho que aumentou a prática do abuso sexual. Eu acho que cresceu a participação das mulheres e a conscientização por seus direitos. Isso é um movimento de mudança”, diz a defensora pública Ana Rita Souza Prata, coordenadora do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher.

Para ela, no entanto, o número de casos deve ser bem maior do que o registrado. “A gente tem uma subnotificação de violência sexual em todos os espaços, não só no metrô, por conta da vergonha, do sentimento de culpa que muitas sentem. Há também uma descrença nos sistemas de Justiça e policial. No caso do metrô, é preciso levar em conta que a mulher está em trânsito, ela tem compromissos e sabe que esse registro demora, então acaba priorizando outras coisas”, afirma.

Para a advogada Marina Ruzzi, o sentimento de vergonha faz com que muitas mulheres queiram simplesmente esquecer o que aconteceu e não registrem a ocorrência. “Há também a barreira institucional, de forma que, quando as mulheres denunciam, muitas vezes não têm sua palavra levada a sério, ou seu caso é tratado como se fosse de menor importância”, diz ela.

Estupro ou importunação?

Em 2016 e em 2015, a maioria das ocorrências foi de importunação ofensiva ao pudor, 163 e 153 casos, respectivamente. Esse tipo de crime, no entanto, só começou a ser registrado pela Delpom em 2014, quando, de um total de 70 episódios de abuso sexual, 59 deles eram de importunação ofensiva ao pudor. Em 2012 e 2013, só há ocorrências de estupros e violações sexuais nos dados da delegacia.

A advogada Ana Paula Braga entende que, quando um homem passa a mão na bunda, nos seios ou nas partes íntimas ou encosta o pênis se esfregando em uma mulher, ele está cometendo um estupro e não importunação ofensiva ao pudor, como consta nos registros da Delpom.

“O crime de estupro envolve também a prática de qualquer ato libidinoso, ou seja, qualquer ato com teor sexual e voltado para satisfação do prazer do agente, não sendo necessário que ocorra penetração ou mesmo ejaculação para que seja configurado. Tratar esse tipo de delito como ‘importunação ofensiva ao pudor’ é diminuir a gravidade desse tipo de conduta, ignorando que a dignidade e liberdade sexual daquela mulher foi violada”, diz a advogada.

Para a defensora pública, porém, é difícil caracterizar esses episódios como estupro. “Se fosse praticada com violência ou grave ameaça, poderíamos considerar a ‘encoxada’ como estupro, mesmo sem conjunção carnal. O problema é que no metrô cheio a ‘encoxada’ é escamoteada, há uma tentativa de que a mulher não se dê conta ou tenha dúvidas do que está acontecendo. Por isso, do ponto de vista legal, é muito difícil caracterizar como estupro.”

Rogério Marques, titular da Delpom (Delegacia de Polícia do Metropolitano), diz que a lotação dos trens contribui para ocorrências dessa natureza e que muitas delas são um “mal-entendido”. “O cara é pego, mas jura que não fez nada. E as imagens das câmeras não ajudam a identificar se houve a agressão.”

Campanha e identificação

Procurada pela reportagem, a Secretaria de Transportes Metropolitanos disse que o aumento de registros é resultado das campanhas de incentivo às denúncias de abuso sexual do Metrô e da CPTM.  De acordo com a pasta, “cerca de nove entre dez suspeitos são detidos pelos agentes de segurança do Metrô e da CPTM e encaminhados para as autoridades policiais”. A secretaria diz que cabe ao delegado de polícia a tipificação penal da ocorrência e do crime.

“Em caso de abuso sexual é importante que a vítima informe imediatamente a um funcionário do Metrô ou da CPTM, apontando ou descrevendo as características e roupas do autor do crime para que o mesmo seja localizado e detido. Os passageiros também podem colaborar por meio do serviço SMS-Denúncia do Metrô (11 97333-2252) e da CPTM (11 97150-4949), que garantem total anonimato ao denunciante. A mensagem é recebida no Centro de Controle de Segurança, que destaca os agentes mais próximos para verificação imediata e providências”, informou em nota.