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Sob ameaça de PCC e Beira-Mar, presídios federais prorrogam suspensão de visitas íntimas

Membros do PCC e Beira-Mar (no destaque) utilizavam visitas íntimas para passar ordens - Arte/UOL
Membros do PCC e Beira-Mar (no destaque) utilizavam visitas íntimas para passar ordens Imagem: Arte/UOL

Flávio Costa

Do UOL, em São Paulo

28/06/2017 04h00

O Depen (Departamento Penitenciário Nacional), órgão do Ministério da Justiça, manterá a suspensão das visitas íntimas e sociais a detentos nos quatro presídios federais do Brasil. Embora o ministério afirme ainda não ter tomado uma decisão a respeito do assunto, as direções das penitenciárias federais já informaram advogados e parentes dos presos sobre a prorrogação.

De acordo com um memorando do Depen, os líderes das facções criminosas aproveitam a ocasião de contato físico com os familiares para passar ordens aos comparsas que estão em liberdade, entre elas a de determinar a morte de servidores do sistema penitenciário federal. Desde setembro do ano passado, três agentes já morreram em emboscadas.

"O direito de visita com contato físico e encontro íntimo, vivenciado no Sistema Penitenciário Federal, tem sido utilizado como meio eficaz de difusão de mensagens entre presos e familiares, servindo como ferramenta de coordenação e execução de ordens para beneficiar organizações criminosas", lê-se no memorando.

Catanduvas - Folhapress - Folhapress
Agentes do presídio federal de Catanduvas (PR) foram mortos a mando do PCC
Imagem: Folhapress

No dia 25 de maio, Melissa Almeida, psicóloga do presídio de segurança máxima de Catanduvas (PR), foi assassinada com dois tiros de fuzil na cabeça em uma emboscada ao voltar para sua casa na cidade de Cascavel (PR). A morte elevou o nível de alerta do sistema penitenciário federal.

A suspeita da Polícia Federal é que o crime foi encomendado pelo PCC (Primeiro Comando da Capital). "O crime foi cometido em razão da função pública que ela exercia", disse o delegado federal Marco Smith ao site CGN.

A maior facção criminosa do país havia determinado a morte de oito servidores do sistema penitenciário federal até a próxima sexta-feira (30): dois para cada penitenciária federal: Porto Velho (RO), Mossoró (RN), Campo Grande (MS) e a já citada Catanduvas (PR).

Após o assassinato de Melissa, o diretor-geral do Depen, Marco Antonio Severo Silva, determinou a suspensão por 30 dias de todas as visitas nas penitenciárias federais, inclusive as realizadas em parlatório, quando não há contato físico entre os presos e os visitantes.

Prazo

Nesta semana, quando se encerra o prazo da suspensão, advogados e familiares de presos receberam a informação de que somente as visitas de parlatório serão retomadas. A reportagem teve acesso à seguinte mensagem enviada pelas direções das penitenciárias federais por e-mail e mensagens de WhatsApp:

"Prezados e prezadas, as visitas sociais íntimas foram suspensas por mais 30 dias, sendo permitido tão somente as realizadas em parlatório, a começar de quarta-feira (28) desta semana. Informamos que nesse período excepcional, as visitas acontecerão de segunda a quinta, em dois horários: de 12h a 15h e de 15h a 18h."

Defensor de um dos chefes do Comando Vermelho, My Thor, que está preso em Catanduvas (PR), o criminalista Luiz Henrique Baldissera afirmou que foi informado por telefone pela direção do presídio que as visitas íntimas e sociais serão proibidas de maneira definitiva. "Ainda estamos esperando a publicação da portaria do ministério, mas já sabemos que as visitas só serão permitidas em parlatório", disse. Outros advogados ouvidos pela reportagem não foram informados de que a suspensão seria em definitivo.

Por sua vez, o Ministério da Justiça afirma que o chefe da pasta, Torquato Jardim, ainda não tomou uma decisão sobre o assunto.

Beira-Mar

Além de citar as ordens do PCC para assassinato de agentes penitenciários, o memorando do Depen cita como caso exemplar a Operação Epístola, deflagrada no final de maio, para justificar a suspensão das visitas íntimas e sociais.

A investigação da PF e do Depen teve como alvo um esquema comandado por Luiz Fernando da Costa, o traficante conhecido como Fernandinho Beira-Mar, que "se utilizava do direito à visita íntima de outro preso para, por meio de bilhetes, controlar e administrar uma rede de tráfico de drogas e lavagem de dinheiro".  A quadrilha movimentou cerca de R$ 9 milhões nos últimos 15 meses. Uma irmã do traficante foi presa. Beira-Mar acabou por ser transferido do presídio federal de Porto Velho (RO) para o de Mossoró (RN).

Advogados de presos reclamam da medida. "Não existe motivação ou qualquer fundamentação plausível que justifique a motivação da restrição, que é abusiva e ilegal", afirma a criminalista Paloma Gurgel, advogada de Beira-Mar. 

PF faz operação contra quadrilha de Fernandinho Beira-Mar

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"Não se entende o motivo que se procura enaltecer o direito à segurança pública sobre os direitos fundamentais, principalmente o dignidade da pessoa humana, o caminho é para o caos total, risco de rebeliões e ato de indisciplina por parte desses que tiveram direitos constitucionais tolhidos", diz a advogada.

O diretor-adjunto da ONG Conectas Direitos Humanos, Marcos Fuchs, afirma que a medida viola a Lei de Execução Penal. "Deve-se individualizar a conduta dos prisioneiros que cometeram os crimes, e não fazer com que toda uma coletividade seja punida por atos individuais", afirma.

Um dos objetivos da criação de presídios federais é o de isolar líderes das facções criminosas e diminuir seu poder de influência nos sistemas penitenciários de origem. Em meados de janeiro deste ano, 529 presos estavam detidos nas quatro penitenciárias, que têm capacidade conjunta de abrigar 832 prisioneiros.

Levantamento do Depen mostra que PCC (113) e Comando Vermelho (95) contavam com o maior número de detentos no sistema penitenciário federal entre 25 facções criminosas do país.

Beira-Mar é transferido para o presídio federal de Mossoró (RN)

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