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Mãe confronta e dá dinheiro para traficante não vender drogas ao filho

Com apoio da mãe, João Blota é publicitário e fomenta projeto de combate às drogas - Arquivo pessoal
Com apoio da mãe, João Blota é publicitário e fomenta projeto de combate às drogas Imagem: Arquivo pessoal

Lucas Borges Teixeira

Colaboração para o UOL

28/08/2017 15h16

Até onde vai uma mãe para salvar o filho de um vício? A advogada Maria Dagmar da Silva já chegou a confrontar um traficante armado, em seu ponto de vendas, e pagar para que ele não vendesse crack ao filho. Hoje, João Blota é publicitário bem-sucedido e fomentador de um projeto de combate às drogas.

João teve o primeiro contato com entorpecentes aos 9 anos. “Eu estava na rua brincando quando um aluno mais velho disse que usou benzina e viu helicóptero, mas não quis me dar”, conta o publicitário ao UOL. “Eu fui até os meus tios e pedi, disse que era para limpar cabeçote de gravador de fita cassete. Depois, já corri pro banheiro. Quando cheirei, vi sei lá quantos helicópteros. Aí foi ladeira abaixo.”

O publicitário começou a experimentar os mais diferentes tipos de droga. “Tudo que me ofereciam eu aceitava. Cogumelo, baseado, cocaína... Chá de fita dá barato? Então eu queria. Usei várias vezes”, conta João. Até encontrar o crack. “Esse aí é para arrebentar.”

Por filho, Maria Dagmar da Silva já chegou a confrontar traficante armado - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Por filho, Maria Dagmar da Silva já chegou a confrontar traficante armado
Imagem: Arquivo Pessoal

Foi nesta época - quando João, hoje aos 41 anos, estava no meio da adolescência - que Dag, como Maria é conhecida, soube do vício do filho. “Eu não descobri. Um rapaz, que até hoje não revelo o nome, veio me contar, chorando, que ele era viciado”, conta a mãe, em entrevista ao UOL. “Eu sou advogada, mas nunca tinha visto crack na vida. Fiz ele me levar até a Cracolândia, que ficava na Av. São João.”

Quando o filho chegou em casa, à noite, ela perguntou se ele estava viciado e ele admitiu. “Foi quando eu falei para ele: 'Então vamos ser amigos'. Para a mãe, o filho não conta as coisas, mas para amigos, sim”, lembra Dag. “Começamos a passar pelos piores anos das nossas vidas.”

No auge do vício, João conta que chegou a usar 40 pedras de crack por dia. “Não é nem pelo número, mas porque eu não fazia mais nada: nem tomar banho nem comer nem dormir. Eu era um prisioneiro... Foi um negócio avassalador”, lembra o publicitário.

“É uma coisa que eu não desejo não para o meu pior inimigo”, afirma Dag. No episódio mais tenso, a advogada foi até uma favela na capital paulista e tirou a arma da mão de um traficante que ameaçava matar o filho.

“Ele devia R$ 400. Eu falei pro João: ‘Sai daqui que eu converso com ele’”, conta. “Falei para o homem: ‘Você quer sua droga e seu dinheiro, vai ter os dois. Tudo o que ele gasta aqui eu te pago. Eu só quero meu filho’. Mãe faz umas coisas malucas, né?”

Dag conta que o filho já chegou a fumar dentro de casa, na sua frente, para evitar que ele saísse e arriscasse a vida. “Eu só pedia a Deus que me desse mais tempo para tirá-lo dessa.”

Depois de mais de 10 anos de uso, o publicitário conseguiu se livrar do vício. “Devo muito à minha nora. Ela tinha todos os motivos para não casar com ele, mas casou e o ajudou”, conta Dag. “Houve umas recaídas, que hoje sabemos que faz parte, mas estamos livres.”

João, sem usar nada há cerca de 15 anos, fala da importância da família para a sua recuperação. “De tudo que aconteceu, quando meu menino, que hoje tem 18, nasceu, tudo mudou. Eu não queria que ele visse a merda que eu era”, afirma o publicitário. “E mãe... Se tem uma pessoa que vai te amar independentemente de tudo nessa vida é a sua mãe.”

Hoje, João dedica sua vida à conscientização do uso de drogas. O publicitário dá palestras gratuitas em escolas para informar os jovens os riscos que o vício pode trazer.

“A informação é a base do meu trabalho. Se você souber o que você pode passar, vai poder escolher e não virar um escravo como eu virei”, conta. “Eu não demonizo a drogas. Não digo ‘Não use”, digo ‘Não vale a pena’. A única coisa que liberta é o conhecimento.”

Além das palestras, João lançou o livro “Noia – O Poder Tentador de Nossas Fraquezas”, já na quarta edição, que conta sua história e todas as dificuldades que passou. Segundo ele, que paga pela impressão, 100% do dinheiro arrecadado é revertido na prevenção e na ajuda a famílias.

“Hoje eu vejo minha família, minha agência, olho para mim e não acredito que estou aqui”, afirma João. “É uma história triste, mas com um final feliz”, completa Dag.