UPPs não vão acabar: veja como será a estratégia de segurança nas favelas do Rio
Metade das 38 UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) do Rio de Janeiro passarão por um processo de reordenação ou fechamento durante a intervenção federal. Por trás das mudanças estão tentativas de resolver problemas de planejamento inadequado e falhas na cadeia de comando da Polícia Militar, diminuir confrontos e até evitar “fogo amigo”, segundo fontes da cúpula de intervenção.
UPPs localizadas em favelas onde as facções criminosas têm elevado poder de fogo e capacidade de organização serão retiradas do centro dessas comunidades. Algumas serão reposicionadas nas periferias das favelas e outras serão fechadas. O efetivo policial liberado com essa reorganização será integrado a batalhões da PM para trabalhar em ações de policiamento ostensivo.
O objetivo de colocar bases nas periferias e não no centro dessas favelas seria manter o chamado "policiamento de proximidade ou comunitário", mas sem deixar os policiais militares vulneráveis a ataques constantes.
Pela estratégia dos interventores, os moradores ainda poderão procurar os policiais nas bases periféricas para relatar problemas e fazer denúncias. Mas para entrar no centro dessas favelas para fazer prisões ou averiguar crimes, os policiais terão que se organizar em grandes efetivos e agir de forma coordenada.
O sociólogo e coordenador do LAV-Uerj (Laboratório de Análise da Violência da Universidade do Rio de Janeiro), Ignacio Cano, afirma que, em tese, esse reposicionamento pode ser positivo. “Retirar UPPs de áreas onde elas só estão trocando tiros é uma boa ideia”, disse.
Em outro tipo de cenário, em favelas onde o poder do crime organizado é mais restrito, as UPPs permanecerão no centro da comunidade ou serão substituídas por bases que ficarão nos mesmos locais e serão guarnecidas por destacamentos de policiais subordinados ao Batalhão da PM responsável pela região.
Nesses casos, os PMs ficarão o tempo todo dentro da favela e farão patrulhas na região a partir da base, para evitar a ocorrência de crimes e a instalação de barricadas.
Outras UPPs consideradas emblemáticas – como a do morro Santa Marta ou a da favela da Rocinha – serão mantidas por terem se integrado muito à comunidade e funcionarem bem ou por terem grande valor simbólico.
O destino de cada UPP deve ser baseado na realidade específica de cada favela. As mudanças serão embasadas em um estudo feito pela PM em 2017.
Até agora a Secretaria da Segurança Pública confirmou apenas mudanças em três UPPs. As unidades da Vila Kennedy e do Batan, na zona oeste do Rio, estão sendo dissolvidas e devem ser substituídas por bases defendidas por destacamentos do 14º Batalhão da PM, responsável pela região.
A terceira UPP a ser modificada é a da Mangueirinha, em Duque de Caxias. Ela será substituída por um destacamento do 15º Batalhão da PM.
Estrutura militar de comando
Um dos motivos que está levando a intervenção federal a reordenar parte das UPPs é tentar corrigir falhas na cadeia de comando da PM - o que os militares chamam em seu jargão de "comando e controle".
Segundo fontes ouvidas pelo UOL, em alguns casos, UPPs e Batalhões da PM operam na mesma região, mas inseridos em cadeias de comando diferentes.
Na Vila Kennedy, por exemplo, um coronel que comandava o 14º Batalhão tinha menos policiais à sua disposição do que um oficial de patente mais baixa que comandava a UPP da área. Esse oficial não tinha que se reportar ao coronel, mas ao Comando de Polícia Pacificadora.
Situações como essa, segundo a reportagem apurou, estavam dando margem a casos de insubordinação. Os interventores querem que, preferencialmente, os comandantes de batalhão sejam as autoridades máximas em suas regiões, para evitar conflitos e até “fogo amigo”. Essa é uma característica típica da organização de comando das Forças Armadas.
O Comando de Polícia Pacificadora continuará a existir, mas será responsável por menos unidades. Ele será mantido porque os interventores entenderam que as UPPs que não serão fechadas precisam de um comando com qualidades técnicas específicas.
Outro problema apontado nos bastidores pelos interventores foi o que eles classificaram como uma expansão das UPPs em gestões anteriores por critérios políticos e não técnicos. Isso teria levado à implantação de unidades de policiamento comunitário em favelas onde ele não é viável.
Para o sociólogo Igacio Cano, a centralização do comando em algumas UPPs e destacamentos sinaliza o fim da ideia inicial da UPP – que era ter unidades com autonomia administrativa que não se contaminassem com os problemas do resto do sistema policial.
“As UPPs propunham um modelo diferente de segurança para não serem contaminadas, mas o modelo de polícia de proximidade não aconteceu”, diz.
Ele critica, porém, a forma como a nova dinâmica das UPPs está sendo divulgada. Para ele, os interventores deveriam expor à sociedade quais critérios estão sendo usados para dissolver ou manter UPPs, para que as mudanças fossem debatidas.
A cúpula da intervenção diz que não divulga todas as mudanças simultaneamente para tentar evitar que facções criminosas se preparem para o novo ordenamento da polícia. A Secretaria de Segurança tem afirmado que, mesmo com a reformulação, nenhuma favela ficará sem policiamento de proximidade, comunitário ou protegida por um batalhão da PM.
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