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Analisando larvas que digerem cadáver, polícia no RJ acha DNA de criminosos

Larvas revelam DNA de sêmen que havia se perdido em corpo em putrefação, diz pesquisadora -
Larvas revelam DNA de sêmen que havia se perdido em corpo em putrefação, diz pesquisadora

Marina Lang

Colaboração do UOL, no Rio

08/04/2019 04h01

Uma tecnologia de investigação genética desenvolvida pela Polícia Civil do Rio já ajudou a elucidar dois assassinatos de crianças no Estado: larvas que digerem restos mortais são analisadas e revelam, segundo os pesquisadores, o DNA de estupradores.

A inovação estava exposta no estande da instituição em uma feira de segurança na última semana na cidade. Um banner reproduzia um dos artigos publicado em revistas científicas especializadas.

"Disseco as larvas, tiro o material do intestino delas e mando para a análise de DNA", contou a perita criminal Janyra Oliveira-Costa, da polícia científica fluminense.

A aplicação dessas técnicas de perícia genética virou tese de doutorado orientada por Janyra, que trabalha no IML (Instituto Médico Legal) do Rio e coordena investigações com uso da ciência e da tecnologia para elucidar assassinatos.

CSI carioca

Janyra quer testar outras técnicas genéticas para desvendar casos no Rio, mas lamenta a falta de dinheiro - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Janyra quer testar outras técnicas genéticas para desvendar casos no Rio, mas lamenta a falta de dinheiro
Imagem: Arquivo pessoal
A policial explicou a técnica, que parece saída de série de ficção científica ou de investigação policial.

Em laboratório, ela coloca larvas para ingerir pedaços de carne "contaminados" com sêmen.

"Aí eu consigo encontrar o material genético do agressor dentro da larva", explica.

Segundo a pesquisadora, "o sêmen se degrada em cadáveres putrefeitos [em decomposição]", o que dificulta o exame de DNA. As larvas, ao digeri-los, porém, permitem essa identificação.

Janyra lembrou que já havia um artigo científico norte-americano anterior, de 2001, que colocava as larvas em contato com o sêmen e conseguiu alguns resultados com a tecnologia da época. Mas ela diz que o uso de carne é inédito no campo das ciências criminais.

A teoria foi aplicada na prática em dois casos de grande repercussão: o de uma criança de 6 anos morta em 2016 e o de uma garota de 11 anos assassinada em 2017.

Em ambos os casos, as larvas foram tiradas dos canais vaginais das meninas e forneceram um perfil genético dos agressores.

A perita disse, ainda, que a tecnologia também foi aplicada no caso da turista catarinense Fabiane Fernandes, 32, morta no final de 2018 na Região dos Lagos.

"Não encontramos nada, o que indica que quem praticou a violência sexual contra ela usou preservativo", afirmou.

Pesquisa em meio a crise

Em meio a entraves financeiros pela crise econômica do Rio - que deixou as delegacias sem recursos e até mesmo itens básicos, como papel - Janyra tenta ampliar e desenvolver as descobertas já feitas.

"A polícia científica recebeu entre 15% e 20% do que solicitou à intervenção federal [decretada pelo ex-presidente Michel Temer no ano passado e encerrada em dezembro]. Conseguimos cromatógrafos novos [equipamento que analisa compostos em amostras], uma máquina de escanear corpos e materiais para genética", conta ela.

Por meio de um edital da Secretaria de Ciência e Tecnologia na Faperj (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro) no ano passado, Janyra obteve uma bolsa de R$ 420 mil para financiar a pesquisa. Desse valor, segundo ela, R$ 220 mil são dedicados apenas a reagentes das ciências genéticas.

"Quero tentar outras técnicas novas das ciências genéticas para ver se consigo obter perfis melhores e mais claros", disse ela.

O dinheiro, contudo, não caiu na conta que ela abriu até agora. Em meio ao corte orçamentário de 42% em ciência e tecnologia anunciado pelo governo federal na semana passada, que ameaça bolsas de pesquisa como a de Janyra, o financiamento deve demorar ainda mais.