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CNMP afasta procurador que ligou escravidão a índio não gostar de trabalhar

Ricardo Albuquerque da Silva foi afastado por declaração que ligou escravidão a índio não gostar de trabalhar - Divulgação/MP-PA
Ricardo Albuquerque da Silva foi afastado por declaração que ligou escravidão a índio não gostar de trabalhar Imagem: Divulgação/MP-PA

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

03/03/2020 19h12

A Corregedoria Nacional do Ministério Público decidiu afastar hoje do cargo de ouvidor-geral do MP-PA (Ministério Público do Estado do Pará) o procurador de Justiça Ricardo Albuquerque da Silva.

O procurador foi afastado por conta de falas consideradas racistas durante palestra proferida para universitários de direito, em novembro de 2019. Ele falou que "não acho que nós tenhamos dívida nenhuma com quilombolas. Nenhum de nós aqui tem navio negreiro."

"Nenhum de nós aqui, se você for ver sua família há 200 anos atrás [sic], tenho certeza que nenhum de nós trouxe um navio cheio de pessoas da África para ser escravizadas aqui. E não esqueçam, vocês devem ter estudado História, que esse problema da escravidão aqui no Brasil foi porque o índio não gosta de trabalhar, até hoje. O índio preferia morrer do que cavar mina, do que plantar pros portugueses. O índio preferia morrer. Foi por causa disso que eles foram buscar pessoas nas tribos na África, para vir substituir a mão de obra do índio. Isso tem que ficar claro, ora", afirma em trecho gravado da fala é divulgado em redes sociais.

A decisão de hoje foi do corregedor nacional Rinaldo Reis, que também instaurou procedimento administrativo disciplinar contra o membro. As duas decisões serão submetidas ao plenário do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) na próxima sessão ordinária do órgão, prevista para o dia 10 de março.

O procurador paraense foi alvo de reclamação disciplinar apresentada pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Pará por conta das afirmações.

Segundo a decisão da Corregedoria Nacional do MP, a conduta do procurador foi "imprópria" e "faz romper o natural elo de confiança e autorreconhecimento que deve haver entre a população e o Ministério Público brasileiro."

"Mostra-se incompatível o exercício do cargo de Ouvidor-Geral no âmbito de Ministério Público Estadual por Membro que responde a expediente disciplinar em razão da imputação de conduta preconceituosa e discriminatória a grupos e povos tradicionais, manifestada em palestra dotada de expressões reveladoras de menoscabo a elementos raciais, históricos e culturais das coletividades afetadas", pontua.

O corregedor ainda destacou o cargo ocupado por Albuquerque, que "exige altivez profissional e conduta funcional impecável, notadamente por ser uma das principais portas e canal de comunicação entre a população hipervulnerável e a Instituição ministerial."

"O desrespeito ao universo identitário de determinados segmentos da sociedade torna inconciliável a permanência do reclamado frente à direção da Ouvidoria-Geral, desestimulando inclusive o acesso a tal órgão pelos grupos e povos atingidos pela sua manifestação reputada como inadequada", afirma, citando ainda que a manutenção do procurador no cargo causaria "indesejável hiato causador de crise de legitimidade institucional e de malferimento aos princípios constitucionais da eficiência, moralidade e cordialidade no atuar administrativo."

A reportagem tentou contato com a assessoria imprensa do MP-PA, mas as ligações não foram atendidas no início desta noite. O UOL não conseguiu localizar a defesa do procurador para comentar a decisão do corregedor.

Em fevereiro, quando foi reconduzido ao cargo após afastamento inicial do MP-PA, o procurador afirmou que o áudio era tendencioso, que foi retirado de seu contexto e a pessoa que o divulgou agiu "de forma sub-reptícia". "O assunto era o Ministério Público como instituição e não tinha como escopo a análise de etnias ou nenhum outro movimento dessa natureza."