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Fux "descredita STF" e age como justiceiro, diz Marco Aurélio Mello

Marco Aurélio (e) e Fux em 2018; decisões opostas sobre soltura de líder do PCC provocaram críticas entre os ministros - André Dusek/Estadão Conteúdo
Marco Aurélio (e) e Fux em 2018; decisões opostas sobre soltura de líder do PCC provocaram críticas entre os ministros Imagem: André Dusek/Estadão Conteúdo

Wanderley Preite Sobrinho

Do UOL, em São Paulo

11/10/2020 11h24Atualizada em 11/10/2020 14h16

Ao derrubar liminar que dava liberdade ao traficante do PCC André do Rap, o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luiz Fux, "descredita" a Corte e tenta agradar a população em "busca desenfreada por justiçamento". A declaração é do ministro Marco Aurélio Mello, responsável pela decisão que libertou o traficante na manhã de ontem (10) e acabou sendo revertida pelo colega.

Segundo Marco Aurélio, Fux se aproveitou dos "tempos estranhos" vividos no Brasil para agir com "hipocrisia" e agradar o desejo da população por "justiçamento".

"É a prática da autofagia, que só descredita o Supremo", afirmou o ministro ao UOL. "Evidentemente ele [Fux] não tem esse poder, mas, como os tempos são estranhos, tudo é possível."

Vinga a hipocrisia e não a ordem jurídica. [Vinga] o que atende mais a população no rigor da busca desenfreada por justiçamento
Marco Aurélio Mello, ministro do STF

Questionado se a intenção de Fux era "jogar para a plateia", o ministro disse não ter "a menor dúvida".

"Prevalece também nas palavras do governador João Doria [PSDB] a busca de atender ao reclamo público", disse Marco Aurélio. Ontem, o governador de São Paulo parabenizou Fux pela decisão em publicação em uma rede social.

"Prisão era ilegal"

O ministro afirma que sua decisão se baseou no artigo 316 do pacote anticrime (Lei 13.964), aprovado em dezembro do ano passado pelo Congresso. O texto orienta que, a cada 90 dias, as prisões preventivas sejam revisadas "sob pena de tornar a prisão ilegal".

"Se há um ato ilegal na manutenção de uma prisão e chega um habeas corpus a mim, eu devo fechar os olhos?", questiona. "Eu tenho 42 anos de experiência."

"Eu não posso partir para o subjetivismo e critérios de plantão. A minha atuação é vinculada ao direito aprovado pelo Congresso Nacional: ali está a essência do Judiciário", diz.

Segundo Marco Aurélio, "no Brasil, se busca dar à sociedade uma esperança vã: primeiro prende e depois apura. Se não me engano, esse é o caso de 50% da população carcerária".

O que há é a perda de parâmetros e princípios
Marco Aurélio Mello

Traficante fugiu

Ao deixar a penitenciária 2 de Presidente Venceslau (SP), o chefe do PCC prometeu ir para casa, no Guarujá, litoral de São Paulo, mas foi de carro até a cidade paranaense de Maringá, onde pegou um avião particular e fugiu para o Paraguai, revelou ontem o colunista do UOL Josmar Jozino.

Sobre a fuga, Marco Aurélio diz que "é um problema de fronteiras".

"De qualquer forma, tem o instituto da extradição", disse.

Eu apliquei a lei porque o processo não tem capa, mas conteúdo. Eu não crio o critério de plantão, sou um guarda da Constituição
Marco Aurélio Mello

Procurado, Fux não respondeu a reportagem. Em sua decisão, o presidente do STF afirmou que a liminar de Marco Aurélio "viola a ordem pública".

"Para o fim de evitar grave lesão à ordem e à segurança pública, suspendo os efeitos da medida liminar proferida nos autos do HC 191836 até o julgamento do mérito pelo órgão colegiado competente e determino a imediata prisão de André Oliveira Macedo ("André do Rap")", escreveu.

Líder do PCC

André, de 43 anos, foi preso em setembro de 2019 em sua mansão em Angra dos Reis, no Rio. No imóvel havia dois helicópteros e uma lancha, avaliada em R$ 6 milhões.

Lancha que seria utilizada por André do Rap em Angra dos Reis - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Lancha que seria utilizada por André do Rap em Angra dos Reis
Imagem: Arquivo pessoal
A Polícia Civil de São Paulo defende que ele comandava o envio de drogas para a Europa pelo porto de Santos, no litoral de São Paulo.

Condenado a 15 anos, 6 meses e 20 dias de prisão, a 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região reduziu sua pena para 10 anos, 2 meses e 15 dias, em regime fechado. O processo ainda não chegou ao fim, cabendo recursos.