Topo

Esse conteúdo é antigo

Juiz diz que não sabe usar videochamadas e é afastado por improdutividade

Bento Luiz de Azambuja Moreira é o mesmo magistrado que vetou trabalhador de participar de audiência em 2007, em Cascavel (PR), por estar usando chinelos; em 2017, ele foi condenado a pagar indenização por danos morais ao trabalhador - Getty Images
Bento Luiz de Azambuja Moreira é o mesmo magistrado que vetou trabalhador de participar de audiência em 2007, em Cascavel (PR), por estar usando chinelos; em 2017, ele foi condenado a pagar indenização por danos morais ao trabalhador Imagem: Getty Images

Vinicius Boreki

Colaboração para o UOL, em Curitiba

10/12/2020 16h18

O pleno do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT9) afastou por improdutividade o juiz Bento Luiz de Azambuja Moreira após sessão do órgão, realizada entre 30 de novembro e 3 de dezembro. Uma sindicância realizada pelo TRT9 desde julho de 2019 na 17ª Vara do Trabalho de Curitiba, onde Azambuja atua como juiz titular, apontou que desde 18 de março o magistrado "não realizou nenhuma audiência", de acordo com a decisão da desembargadora corregedora Regional do TRT9 Nair Maria Lunardelli Ramos.

Durante a sindicância, o órgão demandou que fossem realizadas audiências virtuais para dar vazão aos processos. Em resposta, o magistrado alegou não ter "capacidade técnica" para utilizar recursos tecnológicos para os quais não teria recebido treinamento. O TRT9 indicou cursos que poderiam ser realizados de forma virtual, mas Azambuja seguiu com o mesmo argumento, alegando despreparo para conduzir as audiências a distância.

O magistrado seguirá recebendo salário de R$ 33.689 enquanto o órgão realiza Processo Disciplinar Administrativo que pode culminar com a sua exclusão definitiva da corte. A OAB-PR pediu a revisão da lei que prevê a manutenção dos salários em caso de afastamento.

Azambuja é o mesmo magistrado que vetou um trabalhador de participar de uma audiência em 2007, em Cascavel (PR), por estar usando chinelos. Em 2017, ele foi condenado a pagar indenização por danos morais ao trabalhador no valor de R$ 12 mil.

Conforme a apuração interna do órgão, que demonstrou falta de cumprimento de metas pelo magistrado desde antes da pandemia, a 17ª Vara do Trabalho "tem o maior acervo de processos pendentes de julgamento do Regional, ou seja, 1541 processos de um total de 63.128. Logo, o acervo que a 17ª Vara do Trabalho tem atualmente corresponde a 2,44% do total do Regional, sendo 2,37 vezes maior do que a média das 97 Varas do TRT da 9ª Região", diz a desembargadora, considerando a data de 15 de novembro deste ano.

A decisão da desembargadora também afastou a diretora da 17ª Vara do Trabalho.

Processo disciplinar será sigiloso; julgamento, não

Por meio de nota, o TRT9 confirmou que "Bento Luiz de Azambuja Moreira foi afastado depois de um processo de correição permanente que durou mais de um ano e que antecede o isolamento social imposto pela pandemia — no qual se verificou que ele não tem cumprido suas obrigações, não tem realizado audiências nem prolatado sentenças".

O julgamento do magistrado não será sigiloso, embora o procedimento administrativo corra em segredo, conforme a Resolução 135 do Conselho Nacional de Justiça, que estabelece as sanções possíveis, que variam de advertência à demissão.

O TRT9 alega ter montado estrutura que oferecesse segurança para que magistrados e servidores realizassem o seu trabalho, dando continuidade ao atendimento. "Essa estrutura inclui programas que permitem a realização de audiências remotas, um sistema de comunicação que coloca em contato todos os funcionários do Tribunal e uma série de treinamentos e cursos preparatórios, em colaboração com a Escola Judicial", afirma.

A OAB-PR se manifestou de forma favorável à decisão do TRT9, alegando que o magistrado adotou "inconcebível resistência ao integral cumprimento das determinações apresentadas pela correição permanente". A ordem afirma que "a alegada incapacidade técnica do Juiz afastado transmite a impressão de falta de comprometimento com o regular desempenho da essencial atividade jurisdicional", visto que foram ofertados treinamentos, workshops e ferramentas para magistrados realizarem audiências virtuais.

A entidade critica o fato de o afastamento se dar sem prejuízo dos vencimentos do magistrado, embora esteja prevista na Lei Orgânica da Magistratura (Loman): "há muito deveria o Congresso Nacional debater e revisar referida Lei, por parecer que algumas das sanções previstas no seu art. 42 estão ultrapassadas e acabam por incentivar posturas como tais, ainda que excepcionais".

A reportagem de UOL não conseguiu contato com o juiz Bento Luiz de Azambuja Moreira para comentar o seu afastamento.