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Motorista fura bloqueio de manifestação e entrega oxigênio a hospital em GO

Bruna Barbosa

Colaboração para o UOL, em Cuiabá (MT)

18/03/2021 14h55

Faltando oito minutos para acabar o oxigênio do Hospital Municipal Antônio Batista da Silva, em Bela Vista de Goiás, na região metropolitana de Goiânia, o motorista da empresa responsável pelo fornecimento precisou furar um bloqueio de manifestantes, que protestavam contra o fechamento do comércio na BR-153, na segunda-feira (15).

Em um áudio enviado para um funcionário do hospital, o motorista Hugo Eduardo Pereira Alves, de 30 anos, explicou que precisou entrar na contramão da rodovia e dirigir a cerca de 180 km/h para chegar a tempo ao hospital. Na unidade, 11 pacientes estão internados e precisam usar o oxigênio.

Na gravação, ele diz que pediu para passar e explicou a situação aos manifestantes, mas ouviu de uma pessoa que o objetivo era ver "o caos".

"Consegui sair aqui da manifestação. Entrei na contramão, arrebentei o meio-fio, quase tombei a van, mas saí. Os caminhoneiros: 'não, não vai passar, não'. Falei: 'moço, estou com oxigênio para atender o hospital'. E ele: 'é, então, mas nós queremos atingir isso aí mesmo, é o caos mesmo'. Aí consegui sair de lá".

Em um vídeo enviado para o diretor administrativo do hospital, Rildo Mundim, o motorista mostrou que a rodovia estava completamente bloqueada.

Hugo foi recebido como herói pelos funcionários e pela diretora da unidade, Deusmaria Batista.

Operação de guerra

Ao UOL, Deusmaria contou que no domingo (14), a equipe do hospital já monitorava o abastecimento de oxigênio, pois aguardavam o carregamento no dia seguinte, por volta de 10h.

"Por volta de 6h40 um dos nossos funcionários, o Rildo, que está de férias inclusive, mas monitorava a operação, assim como outra servidora, me mandou um áudio dizendo para eu correr para o hospital, porque o carregamento só chegaria às 10h. Já estava indo fotografar os relógios, fizeram as contas e viram que era impossível esperar até 10h".

A diretora explicou que precisaram pegar dois cilindros com o Samu do município. Com a chegada dos dois cilindros, a equipe confirmou que seria possível aguardar a chegada de Hugo e Deusmaria seguiu para uma reunião com a gestão municipal da cidade. Foi quando Rildo avisou que o motorista estava preso no bloqueio.

"Nessa hora abandonei a reunião. Perguntei quanto tempo de oxigênio ainda tínhamos e disseram que 40 minutos. Falei que daríamos um jeito. Tiramos as balas de oxigênio de todas as ambulâncias. Falei para não sair nenhuma ambulância do hospital e que, em caso de paciente grave, avisaremos o Samu, porque tínhamos que usar todas naquele momento".

Com o estoque no fim, a unidade tinha à disposição apenas cilindros de 1 metro cúbico, que normalmente são usados por pacientes que transitam dentro do hospital.

Eles também conseguiram cilindros de 8 metros cúbicos em hospitais de municípios vizinhos. O monitoramento das cargas dos cilindros passou a ser de 15 em 15 minutos.

Nos momentos que antecederam a chegada do oxigênio, as equipes já faziam praticamente a contagem regressiva de quanto tempo o abastecimento do hospital duraria.

"Fomos para o fundo do hospital para clamar a Deus e aplaudir esse motorista. Quando olharam já tinha 15 minutos de oxigênio no máximo. Logo depois, a chefe das enfermeiras avisou que já era de 10 a 8 minutos. Foi quando o carro entrou. Aí foi só alegria, aplausos e choro".

De acordo com Deusmaria, antes do pico de casos da covid-19, o hospital costumava gastar 96 cilindros de oxigênio por mês. Na última semana, a unidade precisou de 108.

Trabalhando sob constante pressão, o hospital criou uma força-tarefa em parceria com os psicólogos do município. Para Deusmaria, os manifestantes não podiam ter impedido a passagem do motorista de uma empresa de oxigênio.

"Se ele não conseguisse furar o bloqueio, isso custaria a vida de 11 pessoas. O oxigênio é vital nessa situação, se faltar a saturação vai caindo e eles ficam literalmente sem ar. Morrer é um risco iminente. Também correriam riscos de ficar com sequelas por conta da falta de oxigênio. Estamos lutando e dando nosso máximo".