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SP: empresário do Pastel do Trevo denuncia prefeito por suposta propina

Maurício Businari

Colaboração para o UOL, em Santos (SP)

14/05/2021 23h41Atualizada em 15/05/2021 11h49

O empresário Donizete Aparecido da Silva, proprietário da franquia Pastel do Trevo, em Bertioga (SP), denunciou esta semana ao Ministério Público do Estado de São Paulo uma suposta cobrança de R$ 10 mil de propina em favor do prefeito da cidade, Caio Matheus (PSDB), e do presidente da Câmara, Carlos Ticianelli, conhecido como Carlos da Funerária (PSDB).

A ação do pagamento, supostamente ocorrido no dia 4 de agosto de 2020, foi registrado em vídeo pelo comerciante. A gravação mostra José Maria Santana Dias (de camiseta, ao lado de Donizete, de boné), recebendo o dinheiro e dizendo que o pagamento seria enviado ao prefeito e ao presidente da Câmara. O rapaz de costas no vídeo é Juvenal Aparecido da Silva, filho do comerciante.

Segundo Donizete, Dias é um assessor do prefeito e interlocutor do vereador. No BO (Boletim de Ocorrência) registrado na Delegacia de Bertioga, ele é identificado como "autônomo que se diz representante do prefeito e do vereador".

A suposta propina, diz Dias no vídeo, salvaria o empresário de ter o seu comércio fechado, quando a prefeitura iniciasse as obras de reforma do Trevo de Bertioga, uma área na entrada do município da Baixada Santista onde fica a unidade mais antiga do Pastel do Trevo.

"O 'Perninha' [apelido de Dias] todo mundo conhece na cidade. Ele se apresenta sempre como assessor do prefeito Caio Matheus, e do vereador Carlos Ticianelli. Está sempre com eles nos eventos oficiais, são amigos. Ele se diz o cara que 'faz o serviço sujo' para eles. Na verdade, ele vinha me rondando desde o final do primeiro mandato do prefeito. Na época, queriam cobrar R$ 50 mil de propina para não cassarem meu alvará. Mas eu expliquei que não tinha essa quantia e que iria consultar meu filho, que cuida das finanças", declarou Donizete.

Por meio de nota, a prefeitura de Bertioga informou que o vídeo que está circulando e a versão apresentada ao Ministério Público configuram um "ataque político midiático" e que o Executivo "repudia veementemente qualquer tipo de prática de corrupção".

O empresário do Pastel do Trevo contou ao UOL que ficou indignado e ofendido com a atitude do suposto assessor e logo entendeu que deveria deixar registrada a ação em vídeo. Donizete relata que, procurado novamente por Dias, fez um acordo de pagamento dos R$ 10 mil e, no dia do acerto, deixou seu celular ligado, registrando tudo.

"Na verdade, não é só o 'Perninha' que vem fazendo esse tipo de achaque. O fiscal da prefeitura C vivia 'dando carteirada' nos meus funcionários. Ele fazia ameaças de despejo e pegava produtos sem pagar", acrescenta Donizete. A reportagem não encontrou o fiscal citado para ouvir sua defesa, por isso seu nome será preservado e ele será identificado como C.

Inaugurado há 33 anos, quando Bertioga ainda era distrito de Santos, o Pastel do Trevo é um dos estabelecimentos comerciais mais conhecidos e tradicionais do litoral paulista. Já foi citado em reportagens nacionais e internacionais e, segundo Donizete, era uma das atrações da cidade, ajudando a divulgar Bertioga.

Visita do fiscal da prefeitura

Donizete afirma que foi surpreendido, na última quarta-feira, com a visita do fiscal C, que queria lhe entregar uma intimação para que removesse seu equipamento para outro local, no prazo de 30 dias. Donizete diz que se recusou a assinar, pois entendeu que aquilo seria uma provocação, provavelmente para lhe tirar mais dinheiro, e resolveu denunciar o caso ao Ministério Público, citando nominalmente 'Perninha', o fiscal C, o prefeito e o presidente da Câmara.

"Por isso que registrei tudo, sabia que ia voltar a acontecer. Poxa, sou um cidadão honesto, pago em dia todas as taxas, licença, impostos, os salários dos mais de 30 funcionários, os encargos. Foi aí que pensei: 'Quer saber? Agora vou fazer todo mundo saber quem é essa gente'".

Empresário diz receber ameaças

Ainda segundo a versão contada por Donizete, ontem 'Perninha' apareceu na porta de sua residência, para fazer ameaças veladas de morte, as quais registrou no BO. Segundo o comerciante declara em seu depoimento à polícia, 'Perninha', muito alterado, teria dito: "Você é moleque. Eu estou acabado na cidade, mas agora você vai pagar".

Procurado, o presidente da Câmara de Bertioga, Carlos Ticianelli, não havia respondido até o fechamento desta matéria. Segundo publicações na imprensa local, ele está em isolamento desde o dia 11, após ter contraído covid-19.

Por meio de nota, a prefeitura de Bertioga informou que "o prefeito Caio Matheus determinou abertura imediata de sindicância para apuração dos fatos relacionados a suposto envolvimento de servidor, bem como elaboração de boletim de ocorrência e propositura de ação criminal por denunciação caluniosa. O cidadão 'Perninha', que se apresenta como assessor do vereador citado, não exerce e jamais ocupou qualquer cargo na prefeitura durante esta gestão".

Sobre a intimação recebida pelo comerciante, a prefeitura informou que a área é pública e que o comerciante já havia movido processo de usucapião contra a Prefeitura em 2007, julgado improcedente. E que a desocupação da área é necessária para construção do Portal de Entrada da Cidade e um novo receptivo turístico.

'Não sei do que se trata', diz autônomo

O autônomo José Maria Santana Dias, 48 anos, citado pelo comerciante como interlocutor do prefeito e do vereador, afirmou hoje (15) que não recebeu nenhuma intimação, aviso ou comunicação a respeito das denúncias.

Alegando estar em isolamento por ter contraído covid-19, ele diz que vai esperar até terça-feira, quando termina o período de quarentena, para se inteirar do que que aconteceu.

Ao ser indagado sobre sua relação com o prefeito e o presidente da Câmara, foi evasivo. "Não sei do que se trata, não fui comunicado. Não posso falar a respeito de algo que nem estou sabendo".

Conhecido como "Perninha" por amigos e conhecidos, e apesar do apelido constar da denúncia feita ao Ministério Público, do Boletim de Ocorrência registrado pela Delegacia de Bertioga e também da nota oficial emitida pela prefeitura, José Maria diz que não gosta da alcunha, pois a considera preconceituosa.

"Sou deficiente físico, tenho um problema na perna que dificulta a minha locomoção. Esse problema complica muitas coisas, até no trabalho. Então não gosto quando me chamam assim, porque só eu sei as dificuldades que enfrento para conseguir sustentar meus filhos, minha família".