Prefeitura quer restaurar estátua com placas explicando quem foi Borba Gato
Leonardo Martins
Do UOL, em São Paulo
19/08/2021 04h00
Não é de hoje que a estátua de Borba Gato na zona sul de São Paulo causa polêmica e é alvo de protestos pela sua remoção. O monumento, que traz o bandeirante em pé com uma espingarda nas mãos, já tomou banho de tinta e, recentemente, queimou em chamas ateadas por manifestantes.
O último episódio de ataque à escultura, no mês passado, reacendeu o debate sobre símbolos que exaltam pessoas ligadas à escravidão, à colônia e a outros temas sensíveis para o país e reativou o alerta na Prefeitura de São Paulo de que alguma ação deveria ser tomada para "ressignificar" a obra do escultor brasileiro Julio Guerra e acalmar os ânimos de quem se opõe à existência do monumento.
Por ora, a diretora do Departamento de Patrimônio Histórico, alocado na secretaria de Cultura da cidade de São Paulo, Maria Emília Nascimento, afirma que a pasta não cogita pedir a remoção da estátua, inaugurada em 1963, mas, sim, realizar "intervenções artísticas".
A direção do núcleo diz que quer distribuir placas ao redor do monumento com informações históricas sobre Manuel Borba Gato e dos Bandeirantes. Outros 40 monumentos considerados "sensíveis" — que trazem figuras históricas controversas — também deverão receber placas semelhantes.
A comissão de esculturas vai propor uma análise de ressignificação das obras, para fazermos placas contando a história das estátuas e trazendo as complexidades dos personagens e do período que viveram. No caso do Borba Gato, os Bandeirantes foram importantes, mas mataram e escravizaram índios. A ideia é fazer as placas com fatos históricos, é uma intervenção artística no monumento"
Maria Emília Nascimento, diretora do Departamento de Patrimônio Histórico de São Paulo
Passado o episódio do incêndio à estátua, Nascimento explica que a missão do poder público foi reestruturar a obra, que é um bem público.
"A visão do poder público é que, naquele momento, deveríamos entender o dano que foi feito. É um bem público e devemos resguardá-lo. Mas as intervenções já eram estudadas antes do incêndio, desde o ano passado. Nós sabíamos que era momento de fazer uma atuação educativa na obra", disse a historiadora, em entrevista ao UOL.
A estátua de Borba Gato é motivo de protestos, principalmente, por razões históricas. Ele era um bandeirante, grupo de homens — batizados de "sertanistas" — que desbravaram o interior da América do Sul no século 16 em busca de ouro e outras riquezas minerais.
Mas, para explorar o continente, registros históricos apontam que os bandeirantes escravizaram e mataram centenas de indígenas, além de serem contratados para capturar escravos e destruir quilombos, comunidades onde escravizados negros se reuniam para viver em liberdade após fugirem dos engenhos.
O debate sobre a estátua chegou até a Assembleia Legislativa paulista. Deputados estaduais já protocolaram pedidos de remoção do monumento, mas ainda não há decisão sobre o tema.
No incêndio, segundo Maria Emilia Nascimento, a estátua sofreu danos no revestimento de pedras de algumas partes do corpo do bandeirante, como as pernas, pés e a espingarda, mas não registrou nenhum dano estrutural.
A diretora do departamento afirmou não ter definido um orçamento total dos custos da reformulação da obra. Mas a conta deve ser paga por um empresário, que não teve a identidade revelada, e está conversando com a secretaria de Cultura para custear a reforma da estatua por meio do programa "Adote uma Obra Artística"
"Está em fase de tratativas. Verificando o preço que deverá custar a reforma e os trâmites necessários para fazer a doação pelo programa", disse a diretora.
Borba Gato, inclusive, é um dos temas a serem discutidos na "Semana de Valorização do Patrimônio", que acontece nesta semana, evento organizado pela prefeitura para discutir a "memória e a preservação na cidade".