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Cientistas registram chuva tóxica após nuvem de poeira: '100 vezes mais'

Após a formação da nuvem de poeira, cidade no interior de São Paulo registrou chuva intensa - Igor do Vale/Estadão Conteúdo
Após a formação da nuvem de poeira, cidade no interior de São Paulo registrou chuva intensa Imagem: Igor do Vale/Estadão Conteúdo

Colaboração para o UOL

08/10/2021 12h04Atualizada em 20/10/2021 17h06

Se, por um lado, as chuvas que caíram no dia 26 de setembro em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, trouxeram melhora da qualidade do ar - que vinha sendo classificada como péssima no período de seca do inverno -, por outro despertaram a preocupação de pesquisadores por conta da toxicidade presente nas gotículas de água.

A chuva caiu no mesmo dia em que uma tempestade de areia ergueu um muro de partículas em suspensão no ar com centenas de metros de altura e avançou sobre a cidade, assustando os moradores e cobrindo as ruas e edificações com muito pó e detritos.

Os moradores consideraram a chuva um alívio, por conta da qualidade do ar, que oscilava entre moderada, ruim e péssima desde julho, por conta de uma estiagem severa. Porém, ao analisar a água da chuva, pesquisadores da USP (Universidade de São Paulo) acenderam mais um alerta conectado aos efeitos das mudanças climáticas.

"A gente teve 13, 14 vezes mais espécies de cálcio e magnésio. Das espécies orgânicas já tivemos dezenas. A gente está analisando os dados e essas concentrações chegaram a 100 vezes mais do que as chuvas de mesmo volume. Essa chuva de domingo, digamos que ela estourou a escala de tudo aquilo que a gente já tinha visto", explicou a professora de química da USP Maria Lúcia Arruda, ao EPTV, da TV Globo.

Ela explica que as partículas encontradas na água ficaram suspensas na atmosfera por causa dos ventos, que chegaram ao 100 km/h. "A gente pode ter uma chuva que tem bastante solo [cálcio e magnésio] e uma chuva que tem bastante queima de vegetação, biomassa. Nessa, tinha os dois".

Em contato com o UOL, a pesquisador esclareceu ainda que a toxicidade, no caso dos seres humanos, é considerada em "correlação com a ingestão, inalação ou contato com a derme", destacando que no caso da tempestade, ninguém coletaria a água para beber.

Partículas causam inflamação pulmonar

A médica pneumologista Rosângela Villela Garcia afirmou ao EPTV que, quando as pessoas inalam essas partículas, algumas ficam retidas nas vias respiratórias principais e o corpo consegue eliminar.

"Mas aquelas partículas muito pequenininhas conseguem chegar lá no fundo do pulmão. Isso causa, a curto prazo, uma inflamação pulmonar, gerando sintomas como tosse, secreção pulmonar, catarro, piora da falta de ar, principalmente nas pessoas que já têm alguma doença respiratória", esclareceu a médica.

Maria Lúcia declarou que os efeitos da tempestade de areia foram amenizados em Ribeirão Preto porque a chuva ocorreu mais rápido do que em outras cidades do interior, como Franca, cujos moradores foram expostos por mais tempo à tempestade de partículas.

"Em Ribeirão, ventou por alguns minutos e choveu. A gente teve uma alta exposição por pouco tempo. Quem estava dentro de casa estava protegido, mas teve lugares na região que ficou muito tempo ventando e sem chuva. Essas pessoas foram mais expostas", diz Maria Lúcia.

A professora alerta que eventos climáticos extremos estão se tornando cada vez mais comuns. E estão obviamente conectados à conduta do ser humano em relação ao meio ambiente.

"A gente falava de mudanças climáticas como uma coisa de futuro, e o futuro chegou. Está bem claro para nós que as mudanças climáticas estão sendo sentidas e nós estamos sofrendo os impactos. É um ponto de reflexão sobre as nossas atitudes com relação ao meio ambiente."