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No Dia de Finados, raro cemitério de gatos deve ficar quase vazio, em SC

Cemitério dos gatos de Blumenau (SC) deve ser um dos poucos a ficar vazio neste dia de finados - Giorgio Guedin
Cemitério dos gatos de Blumenau (SC) deve ser um dos poucos a ficar vazio neste dia de finados Imagem: Giorgio Guedin

Giorgio Guedin

Colaboração para o UOL, em Blumenau

01/11/2021 05h00

No Dia de Finados, um cemitério em Blumenau (SC) passa ao largo da tradicional visita em massa no feriado e deve ficar (quase) vazio. A administração municipal, que cuida do espaço, até recebe pedidos de enterro no local, mas, desde 1957, não há novos sepultamentos no local. Sob os jazigos, apenas felinos. O que faz do Cemitério dos Gatos, um dos mais diferentes do mundo.

Integrante do complexo do Museu da Família Colonial, que recebeu, entre 2019 e 2021, mais de 12 mil visitas, o Cemitério dos Gatos é desconhecido por parte da população ou dos turistas que visitam a cidade - geralmente à procura de cerveja, comida típica alemã e da Oktoberfest.

Nos últimos anos, moradores do município chegaram a fazer solicitação de sepultamento 10 vezes — tudo para manter a memória do bichano 'concretizada' ali. Por se tratar de reduto histórico, todos os pedidos foram negados.

Nós não aceitamos o sepultamento de outros gatos. Recebemos pedidos de famílias, vizinhos da região. São apenas os nove jazigos do cemitério. As pessoas gostariam de ver seus animais de estimação sendo sepultados ali, mas não é permitido.
Sueli Petry, historiadora

No local, os visitantes podem ver estátuas, fotos e pequenos perfis dos "donos" daquelas terras. Pepito, Mirko, Bum, Peterle, Musch, Schnurr, Sittah, Putze e Mirl, os nove sepultados, ganharam nova "vida" alimentando a cultura local e encontando visitantes.

Parte da história de Blumenau

Edith - Arquivo histórico de Blumenau - Arquivo histórico de Blumenau
Edith Blumenau, criadora dos animais e fundadora do cemitério dos gatos
Imagem: Arquivo histórico de Blumenau

O Cemitério dos Gatos foi criado a partir do carinho e afeto de Edith Gaertner. Sobrinha-neta de Hermann Blumenau, fundador da cidade que leva o seu sobrenome, ela nasceu em 1882, sendo a caçula de um cônsul e da fundadora do teatro do município. Órfã ainda jovem, ela rumou à Argentina, com 18 anos, se inspirou na italiana Eleonora Duse para seguir a carreira de atriz e emendou um curso de Artes Cênicas na Alemanha, o que a permitiu atuar em teatros de toda a Europa.

Gato - Arquivo histórico de Blumenau - Arquivo histórico de Blumenau
Gatos são homenageados com identificação em cada lápide
Imagem: Arquivo histórico de Blumenau

Por conta do estado de saúde dos dois irmãos, teve que voltar ao Brasil em 1925. E foi justamente o choque de cultura que a fez voltar-se aos felinos. "Ela vinha de uma vivência europeia, uma vida cultural intensa. E voltava para uma Blumenau provinciana, passando a se dedicar à leitura, aos grandes clássicos. Com passar dos anos, com temperamento muito forte, não casou, se isolou e passou a dedicar aos animais, preferencialmente aos gatos", conta Sueli Petry, atual diretora de Patrimônio Histórico-Museológico de Blumenau, em entrevista ao UOL.

O amor de Edith resistiu ao tempo. Ela registrava em fotos todos eles e os enterrava nos fundos da casa,a à medida que eles morriam. Estima-se que a atriz tenha sepultado mais de 50 gatos e nove deles foram preservados e estão em lápides que podem ser visitados hoje no Centro Histórico de Blumenau.

Rito funeral

Gatos - Arquivo histórico de Blumenau - Arquivo histórico de Blumenau
Museu detém imagens de bichanos, com identificações, e da tutora, Edith
Imagem: Arquivo histórico de Blumenau

Se hoje os ritos funerais sofreram mudanças com a pandemia, o mesmo não poderia afirmar com o velório dos gatos de Edith. Para cada sepultamento, um ritual de enterro. "Como ela se isolou, um grupo restrito de amigos sempre acompanha cada sepultamento, duas a três famílias, geralmente com pessoas de mais idade", afirmou Sueli.

Com a finalidade de preservar o espaço — e o apreço pelos felinos —, Edith doou, antes de morrer, o local ao poder público. Após sua morte, em 1967, o local foi transformado em um cemitério pela prefeitura, fazendo parte do complexo do Museu da Família Colonial, no Centro Histórico da cidade.

O cemitério é aberto ao público. Já o interior do museu funciona de terça a domingo, das 10h às 16h, na Alameda Duque de Caxias, 78.