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Com medo de barragem, agricultor deixa casa em MG: 'Prefiro a vida'

José Elivaldo Reis saiu da casa onde morou a vida toda por prevenção contra o rompimento da barragem - Lucas Borges Teixeira/UOL
José Elivaldo Reis saiu da casa onde morou a vida toda por prevenção contra o rompimento da barragem Imagem: Lucas Borges Teixeira/UOL

Lucas Borges Teixeira

Do UOL, em ParĂĄ de Minas (MG)

13/01/2022 04h00

Com uma muda de roupas e uma sacola, o agricultor José Elivaldo Reis, 67, espera uma carona na frente de sua casa, em uma estrada de terra na årea rural de Parå de Minas, a 83 km de Belo Horizonte. Parte da comunidade Carioca, seu terreno estå na årea de risco à beira da barragem da hidrelétrica de mesmo nome.

Com as fortes chuvas do final de semana, a barragem chegou a transbordar em alguns pontos e, na Ășltima terça (11), seu estado foi alternado para emergĂȘncia. A proprietĂĄria diz que a construção "permanece estĂĄvel", mas a prefeitura jĂĄ emitiu alerta de rompimento, e parte da comunidade estĂĄ sendo retirada pela Defesa Civil e pelo Corpo de Bombeiros, por prevenção.

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"Eles jĂĄ vieram aqui mais de uma vez. EstĂŁo falando que a barragem pode romper ou nĂŁo, mas que nĂŁo podem garantir. Pode acontecer daqui a uma hora ou nunca. O que eu vou fazer? Minha irmĂŁ, que mora aqui do lado, jĂĄ tirou os mĂłveis", conta o agricultor.

As chuvas que tĂȘm atingido Minas Gerais desde o final de novembro se intensificaram na regiĂŁo na Ășltima semana. A cheia no rio SĂŁo JoĂŁo, que beira ParĂĄ de Minas, ajudou a passar o limite da barragem e inundou cidades vizinhas, como Conceição do ParĂĄ.

Morador da mesma casa hå mais de 60 anos, Reis diz que nunca havia visto uma chuva como essa e que não queria deixar tudo que tem para trås, mas começou a ter medo.

"A gente viu os vĂ­deos da ĂĄgua saindo [da barragem]. Eu que nĂŁo quero ficar no caminho, que nem Brumadinho. Aqui pode ser o novo Brumadinho. NĂŁo queria perder a casa, mas nĂŁo quero isso nĂŁo. Prefiro a vida que a casa", afirma.

Como Reis, parte mais baixa da comunidade Carioca, na ĂĄrea rural de ParĂĄ de Minas, onde um possĂ­vel rompimento da barragem apresenta riscos estĂĄ sendo evacuada.

"Ali para baixo jĂĄ tiraram todo mundo", aponta a dona de casa Marlene Santos, moradora do Carioca hĂĄ 50 anos. Segundo ela, a ĂĄrea principal da comunidade, onde hĂĄ uma escola municipal e uma UBS (unidade bĂĄsica de saĂșde), nĂŁo vai precisar ser evacuada por ficar em uma ĂĄrea mais alta.

Ainda assim, nĂŁo se livraram da chuva. "NĂŁo parou de chover nem um minuto vĂĄrios dias. Alagou minha cozinha, a rua aqui parecia um riacho", conta.

Com apenas dois pontos de entrada, o Carioca ficou ilhado por pelo menos trĂȘs dias. O acesso pela Rodovia Gustavo Capanema, onde mora Elivaldo Reis, teve partes alagadas e com tanta lama que impedia a passagem de veĂ­culos.

JĂĄ o acesso pela MG-262, tambĂ©m de terra, foi interrompido por uma cratera na pista, onde passa um riacho, que tambĂ©m encheu, e, tamanha violĂȘncia da ĂĄgua, levou parte da estrada. O caminho segue inviĂĄvel, mesmo a pĂ©.

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Cratera foi aberta apĂłs chuvas do final de semana e fechou um dos acessos Ă  comunidade Carioca
Imagem: Lucas Borges Teixeira/UOL

Barragem em estado de emergĂȘncia

O alerta de rompimento foi emitido pela Prefeitura de ParĂĄ de Minas no Ășltimo domingo (9), dia mais forte de chuvas, quando o rio SĂŁo JoĂŁo transbordou e destruiu casas, estradas e pontes de diferentes municĂ­pios.

Na Ășltima terça (11), a Companhia de Tecidos Santanense, proprietĂĄria da usina hidrelĂ©trica, publicou um comunicado que afirma que a barragem segue "estĂĄvel, sem rompimento", mas, dado o alto volume de chuva em outros pontos segue, a população deveria seguir longe das ĂĄreas de inundação apontadas pela Defesa Civil.

Na quarta (12), a empresa alterou, junto Ă  Aneel (AgĂȘncia Nacional de Energia ElĂ©trica) o nĂ­vel de segurança de alerta para emergĂȘncia "por cautela e primando pela segurança da comunidade".

Ainda assim, segundo a Santanense, a barragem segue "estĂĄvel". Quarta-feira foi o primeiro dia sem chuva na regiĂŁo desde o final de semana.

Elivaldo Reis, que vai ficar na casa de uma outra irmĂŁ na comunidade rural de Capoeira Grande, em Onça de Pitangui, cidade vizinha, diz esperar "trĂȘs, quatro dias no mĂĄximo". "Se nĂŁo chover, eu volto", diz.

O UOL procurou a Defesa Civil estadual e a Prefeitura de Parå de Minas para saber qual o protocolo em relação à população retirada de casa e quantas famílias ao todo foram deslocadas, mas não obteve resposta até o fechamento.

"Coisa de gente de fora"

Nem todos na região estão tão preocupados com a situação. Geraldo Lopes, 61, mora e trabalha na região hå 20 anos e diz não acreditar em rompimento.

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Geraldo Lopes nĂŁo acredita em rompimento da barragem: "coisa de gente de fora"
Imagem: Lucas Borges Teixeira/UOL

"Não tenho medo, não. Isso é coisa de gente de fora. Jå conversei com muitas pessoas e eles tão falando que vai romper, não", diz Lopes. A região onde ele trabalha e mora fica entre as comunidades Torneiros e Carioca, próxima à cratera aberta pelas chuvas. Ali não estå entre as åreas de evacuação.

"JĂĄ teve essa histĂłria antes. Choveu como nunca tinha visto, mas agora parou. Se nĂŁo rompeu, nĂŁo rompe mais", afirmou.


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