Com medo de barragem, agricultor deixa casa em MG: 'Prefiro a vida'
Com uma muda de roupas e uma sacola, o agricultor José Elivaldo Reis, 67, espera uma carona na frente de sua casa, em uma estrada de terra na área rural de Pará de Minas, a 83 km de Belo Horizonte. Parte da comunidade Carioca, seu terreno está na área de risco à beira da barragem da hidrelétrica de mesmo nome.
Com as fortes chuvas do final de semana, a barragem chegou a transbordar em alguns pontos e, na última terça (11), seu estado foi alternado para emergência. A proprietária diz que a construção "permanece estável", mas a prefeitura já emitiu alerta de rompimento, e parte da comunidade está sendo retirada pela Defesa Civil e pelo Corpo de Bombeiros, por prevenção.
"Eles já vieram aqui mais de uma vez. Estão falando que a barragem pode romper ou não, mas que não podem garantir. Pode acontecer daqui a uma hora ou nunca. O que eu vou fazer? Minha irmã, que mora aqui do lado, já tirou os móveis", conta o agricultor.
As chuvas que têm atingido Minas Gerais desde o final de novembro se intensificaram na região na última semana. A cheia no rio São João, que beira Pará de Minas, ajudou a passar o limite da barragem e inundou cidades vizinhas, como Conceição do Pará.
Morador da mesma casa há mais de 60 anos, Reis diz que nunca havia visto uma chuva como essa e que não queria deixar tudo que tem para trás, mas começou a ter medo.
"A gente viu os vídeos da água saindo [da barragem]. Eu que não quero ficar no caminho, que nem Brumadinho. Aqui pode ser o novo Brumadinho. Não queria perder a casa, mas não quero isso não. Prefiro a vida que a casa", afirma.
Como Reis, parte mais baixa da comunidade Carioca, na área rural de Pará de Minas, onde um possível rompimento da barragem apresenta riscos está sendo evacuada.
"Ali para baixo já tiraram todo mundo", aponta a dona de casa Marlene Santos, moradora do Carioca há 50 anos. Segundo ela, a área principal da comunidade, onde há uma escola municipal e uma UBS (unidade básica de saúde), não vai precisar ser evacuada por ficar em uma área mais alta.
Ainda assim, não se livraram da chuva. "Não parou de chover nem um minuto vários dias. Alagou minha cozinha, a rua aqui parecia um riacho", conta.
Com apenas dois pontos de entrada, o Carioca ficou ilhado por pelo menos três dias. O acesso pela Rodovia Gustavo Capanema, onde mora Elivaldo Reis, teve partes alagadas e com tanta lama que impedia a passagem de veículos.
Já o acesso pela MG-262, também de terra, foi interrompido por uma cratera na pista, onde passa um riacho, que também encheu, e, tamanha violência da água, levou parte da estrada. O caminho segue inviável, mesmo a pé.
Barragem em estado de emergência
O alerta de rompimento foi emitido pela Prefeitura de Pará de Minas no último domingo (9), dia mais forte de chuvas, quando o rio São João transbordou e destruiu casas, estradas e pontes de diferentes municípios.
Na última terça (11), a Companhia de Tecidos Santanense, proprietária da usina hidrelétrica, publicou um comunicado que afirma que a barragem segue "estável, sem rompimento", mas, dado o alto volume de chuva em outros pontos segue, a população deveria seguir longe das áreas de inundação apontadas pela Defesa Civil.
Na quarta (12), a empresa alterou, junto à Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) o nível de segurança de alerta para emergência "por cautela e primando pela segurança da comunidade".
Ainda assim, segundo a Santanense, a barragem segue "estável". Quarta-feira foi o primeiro dia sem chuva na região desde o final de semana.
Elivaldo Reis, que vai ficar na casa de uma outra irmã na comunidade rural de Capoeira Grande, em Onça de Pitangui, cidade vizinha, diz esperar "três, quatro dias no máximo". "Se não chover, eu volto", diz.
O UOL procurou a Defesa Civil estadual e a Prefeitura de Pará de Minas para saber qual o protocolo em relação à população retirada de casa e quantas famílias ao todo foram deslocadas, mas não obteve resposta até o fechamento.
"Coisa de gente de fora"
Nem todos na região estão tão preocupados com a situação. Geraldo Lopes, 61, mora e trabalha na região há 20 anos e diz não acreditar em rompimento.
"Não tenho medo, não. Isso é coisa de gente de fora. Já conversei com muitas pessoas e eles tão falando que vai romper, não", diz Lopes. A região onde ele trabalha e mora fica entre as comunidades Torneiros e Carioca, próxima à cratera aberta pelas chuvas. Ali não está entre as áreas de evacuação.
"Já teve essa história antes. Choveu como nunca tinha visto, mas agora parou. Se não rompeu, não rompe mais", afirmou.
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