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Atirador de Aracruz (ES) tentou esconder suástica para evitar identificação

Do UOL, em Aracruz (ES)

27/11/2022 08h37

O atirador de 16 anos que matou quatro e feriu 12 em um ataque a duas escolas em Aracruz (ES) tentou esconder os vestígios após cometer o crime, segundo policiais militares que participaram da apreensão dele.

Filho de PM, o adolescente usou as duas armas e o carro do pai no atentado. Após cometer o crime, estacionou o carro na garagem, recarregou as armas e as guardou no mesmo local. A fita vermelha usada para formar a imagem de uma suástica no braço direito foi retirada da roupa camuflada usada no crime e guardada em uma gaveta.

O material foi apreendido pelos agentes na casa da família no bairro Coqueiral, próximo à segunda escola atacada, disse o tenente Adriano de Farias Santos em entrevista ao UOL Notícias. Ele é comandante da 3ª Companhia do 5º BPM, responsável pelo policiamento de uma região com cerca de 8.000 moradores e conhecida justamente por ser uma área com poucos registros de crimes.

"O revólver foi guardado no armário do pai com um cadeado. Ele [o atirador] deixou a pistola na mesma posição onde ela havia sido guardada e a recarregou. A fita vermelha [usada para fazer o símbolo da suástica] estava em uma gaveta junto com a máscara que ele usou quando cometeu o crime", disse.

A Polícia Civil do Espírito Santo irá investigar se o atirador tinha facilidade de acesso às armas do pai, um tenente da PM do Espírito Santo. "Vamos investigar não só se o pai foi quem ensinou [o suspeito] a dirigir como também se foi o pai quem o instruiu a utilizar a arma. Se ficar provado, certamente responderá também. Obviamente que é difícil fazer isso sem o conhecimento de alguém. Vamos investigar", disse José Darcy Arruda, delegado-chefe da Polícia Civil do estado.

Pai compartilhou livro de Hitler. O pai do atirador compartilhou em uma rede social a imagem do livro "Minha Luta" (ou "Mein Kampf, em alemão), escrito em 1923 por Adolf Hitler, no qual o ditador nazista descreve ideais antissemitas. A venda e a circulação da obra é proibida em algumas cidades do país, como ocorre no Rio de Janeiro. Após o crime, a publicação foi apagada. Fazer apologia ao nazismo é crime, conforme a lei nº 9.459/97. A pena prevista é de 2 a 5 anos de reclusão, além de multa. Ler a obra não configura crime.

Mãe foi professora e atirador era ex-aluno. A mãe do atirador já havia sido professora na escola estadual Primo Bitti, palco do primeiro ataque. O adolescente era um ex-aluno, que havia abandonado os estudos há seis meses a pedido dos pais. A motivação ainda não foi esclarecida pela família ou pela polícia.

"Foi uma cena de guerra", diz PM

adriano, tenente - Brisa Dultra/UOL - Brisa Dultra/UOL
Tenente Adriano de Farias Santos, da PM de Aracruz (ES), participou da ação em que o atirador das escolas atacadas foi apreendido
Imagem: Brisa Dultra/UOL

O tenente Adriano de Farias Santos relembra como foi informado sobre o caso. Ele disse que estava dirigindo quando recebeu uma ligação. Do outro lado da linha, estava um professor da escola Primo Bitti, palco do primeiro ataque. "Ele ligou e disse: 'tem uma pessoa armada atirando em todo mundo dentro da escola'", lembra.

Cerca de cinco minutos depois, quando já havia mandado viaturas ao local e se deslocava até lá, o tenente disse ter recebido outra ligação. Dessa vez, do seu filho, que estuda no Centro Educacional Praia de Coqueiral, onde ocorreu o segundo atentado. "Ele disse: 'pai, tem um atirador na escola.' Aí, mudei a rota e fui até lá", conta.

Ao chegar no local, já havia policiais de folga prestando os primeiros socorros.

Foi uma cena de guerra. Foi chocante até para os policiais, que têm treinamento para lidar com esse tipo de situação. Mas precisamos deixar de lado a emoção para que possamos fazer o nosso trabalho. Não haverá sensação de impunidade, porque o autor foi identificado e responderá pelos seus atos"
Tenente Adriano de Farias Santos

Ataque escola ES - mapa -  -

Como a polícia identificou o veículo. Após o crime, houve uma força-tarefa em conjunto entre a Polícia Civil, Polícia Militar e PRF (Polícia Rodoviária Federal). Com o auxílio de câmeras de monitoramento de uma empresa privada, foi possível identificar o deslocamento de um veículo Renault Duster de cor prata se deslocando no mesmo horário do ataque. Mas o carro estava com a placa coberta por um adesivo.

Após crime, atirador foi para casa de praia com os pais

Em seguida, foi feito um rastreamento em um banco de dados e identificado um veículo com as características do que possui o pai do atirador, que morava a pouco mais de um quilômetro do local do crime. Os policiais militares foram ao local, mas não havia ninguém por lá.

Em outra pesquisa no banco de dados, os policiais descobriram que o pai do atirador também tinha uma casa de praia em um bairro próximo e decidiram ir ao local. Lá, encontraram o atirador com a família.

Segundo a PM, o adolescente aproveitou o momento em que os pais saíram de casa na manhã de sexta-feira para cometer o crime. Depois, tentou ocultar os vestígios e aguardou pela chegada deles, no fim da manhã. Em seguida, os acompanhou em outro veículo da família até a casa de praia.

Frieza: como foi a confissão

Os policiais militares então foram à casa de praia onde estava o adolescente. Lá, perceberam que a sua compleição física era compatível com a do atirador flagrado nas imagens das câmeras de segurança de uma das escolas. Um detalhe reforçou as suspeitas: ele usava o mesmo chapéu em que aparecia no vídeo.

Após ser confrontado pelas informações obtidas pela investigação, ele acabou confessando e indo com os policiais até a casa, para mostrar onde guardou as armas, a roupa camuflada, a fita vermelha usada para formar a imagem de uma suástica e a máscara em que aparece no vídeo.

A ação contou com elementos não muito usuais em operações policiais. Até um juiz e um promotor acompanharam as buscas na casa do atirador. Após o crime, foi criado um gabinete de crise na escola Primo Bitti, com interlocução com o comando-geral da PM do Espírito Santo, a Secretaria de Segurança Pública e até com o governador Renato Casagrande (PSB).

"Ele [o atirador] estava muito tranquilo. Demonstrou frieza. Não parecia alguém que havia cometido um crime desse tipo", diz o tenente Adriano de Farias Santos.

Na escola onde estudou, o adolescente era visto como um aluno tímido, aplicado e educado. Como é menor de idade, ele responderá por ato infracional análogo ao crime de homicídio triplamente qualificado por motivo fútil, perigo comum e impossibilidade de defesa às vítimas.