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Testemunha vê racismo em retirada de mulher negra de voo da Gol

Colaboração para o UOL

29/04/2023 22h03

A jornalista Elaine Hazin, que gravou um vídeo mostrando a retirada de uma passageira negra de um voo da Gol, classificou a ação dos policiais federais como "racismo violento". O Ministério das Mulheres solicitou apuração do caso.

O que diz a testemunha:

  • Nas redes sociais, a jornalista disse que presenciou ontem à noite um caso "extremamente violento de racismo", sofrido por uma mulher negra no voo 1575 da Gol.
  • Ela afirmou que, após uma hora de atraso no voo, Samantha Vitena Barbosa não encontrava lugar para colocar sua mochila, onde estava seu laptop de trabalho. Segundo a jornalista, a tripulação do voo alegou que o voo estava cheio e que a passageira seria o motivo do atraso da partida.
  • A jornalista relata então ter conseguido, com a ajuda de outras mulheres, um lugar no bagageiro para guardar a mochila de Barbosa. No entanto, mais uma hora se passou sem que a Gol desse satisfação aos passageiros, disse Hazin.
  • Três homens da Polícia Federal entraram no avião "de forma truculenta" para retirar Barbosa. Alguns passageiros pediram para que a PF não levasse Barbosa. "Ela se defende mas não reage, alguns pedem para ela não ir [na maioria mulheres], eu me desespero, todas com muito medo, apreensão e os policiais ameaçam algemá-la", relatou Hazin.
  • Os agentes afirmaram que a ordem de desembarque partiu do próprio comandante, mas não explicaram as razões, segundo a jornalista.

Samantha era uma ameaça por ser uma mulher, ser preta, ter voz. Ela foi levada pela polícia, eu quase fui levada junto por defendê-la, me agrediram, me ameaçaram. A mãe de Samantha chorava desesperada ao telefone por não saber o destino de sua filha. Eu chorava também. Outras mulheres e homens se desesperavam. O que eles não sabiam é que Samantha há não estava só --é que enquanto pudermos, enquanto tivermos forças vamos lutar todos juntos contra o racismo.
Elaine Hazin, jornalista

O que dizem Gol e PF

A Gol informou que a cliente não aceitou a colocação da sua bagagem nos locais corretos e seguros destinados às malas e, por medida de segurança operacional, não pôde seguir no voo. A companhia lamentou o transtorno e afirmou que segue apurando cuidadosamente os detalhes do caso.

Segundo a empresa, Barbosa acomodou a bagagem em local que obstruía a passagem, "o que trazia risco a segurança do voo". A Gol disse ter oferecido a ela despacho gratuito da bagagem; que o computador fosse retirado da mochila e troca de assento para acomodação da bagagem.

"A companhia informou, por fim, que ela teria que desembarcar para que o avião pudesse partir. A impossibilidade de chegar a um acordo e a necessidade de se reestabelecer a ordem fez com que a Polícia Federal fosse acionada", disse a Gol, em nota.

A PF informou que a retirada da passageira foi efetuada a pedido da Gol, porque Barbosa não teria acatado ordens do comandante do voo 1575, referentes à segurança de acomodação de bagagens. O caso está sendo apurado pela corporação.

Advogado de Barbosa vê racismo estrutural

  • Ela é coordenadora educacional da ONG Instituto Identidades do Brasil, professora e aluna de mestrado em bioética na Fiocruz. Ela mora em São Paulo e estava em Salvador a trabalho.
  • O advogado dela disse, em entrevista à TV Globo, que sua cliente avisou que ela tinha um computador na mochila e que as próprias companhias aéreas não recomendam o despacho desse tipo de material.
  • Ele afirma que, em nenhum momento, Barbosa quis desobedecer as autoridades e que apenas questionou o motivo de estar sendo retirada do avião. Ele vê racismo estrutural na abordagem dos policiais federais.

O racismo é um indutor, principalmente na sua perspectiva estrutural, que define como cada grupo humano será tratado. Samantha é uma mulher negra que foi vista como potencial pessoa perigosa e perturbadora da paz. Se ela fosse branca, seria considerada perigosa e retirada do avião?
Fernando Santos, advogado da passageira expulsa

Repúdio e apuração

  • Nas redes sociais, órgãos governamentais e entidades ligadas à defesa dos direitos humanos e igualdade racial repudiaram a forma que a passageira foi tratada.
  • O Ministério das Mulheres denunciou a ocorrência de racismo e misoginia e declarou que a cena é uma afronta a Barbosa e a todas as mulheres negras. A pasta informou que pedirá providências à companhia aérea e à PF --o ministério aponta que a empresa e a corporação devem desculpas e explicações após a abordagem.
  • A Fiocruz afirmou que a aluna foi vítima de racismo e violência contra a mulher. A instituição declara que nem Barbosa, nem nenhuma mulher negra, deveria passar por momentos como este. E acrescenta que, todos os dias, a Fiocruz e a sociedade brasileira devem reafirmar seu compromisso com a democracia, a equidade, a justiça racial e de gênero.
  • A Educafro considerou a atitude contra a passageira como "repugnante e inadmissível em pleno século 21" e disse que o caso é resultado do racismo.
  • A Secretaria Nacional do Consumidor disse que já notificou a companhia aérea a prestar esclarecimentos.