Cisalhamento, esmagamento? Há mais de uma hipótese para dano em prédio
Maurício Businari
Colaboração para UOL
16/02/2024 11h52
Um edifício residencial em Praia Grande, com 23 pavimentos e 133 apartamentos, teve que ser interditado na terça-feira (13), após três pilares de sustentação do prédio apresentarem rupturas estruturais.
A prefeitura e o Corpo de Bombeiros afirmam que eles sofreram cisalhamento, porém, um engenheiro estrutural que esteve no local a pedido do condomínio avalia que eles sofreram ruína por compressão. Ou seja, foram esmagados. Ainda não há data para conclusão do laudo pericial, para o início das obras e muito menos para o retorno dos moradores.
O que se sabe
Ruptura por esmagamento. O UOL conversou no final da tarde de ontem com o engenheiro de estruturas e professor da Unisanta, Hildebrando Pereira dos Santos Junior, que esteve no local, para uma vistoria a pedido do condomínio. Segundo o especialista, o que ocorreu no Residencial Giovannina Sarane Galavotti, no bairro da Aviação, pode ser chamado de ruína por compressão ou ruptura por esmagamento.
Esse tipo de acidente ocorre quando os pilares internos do edifício, que ficam mais ao centro da construção, recalcam (afundam no solo). Com isso, as cargas migram para os pilares mais próximos, gerando uma sobrecarga. Como os pilares de periferia, mais próximos das fachadas, não têm como redistribuir esses esforços, ocorre a ruptura.
A engenheira civil e diretora de relações institucionais do Crea-SP (Conselho Regional de Engenheiros e Agrônomos do Estado de São Paulo), Fabiana Albano, já havia alertado que o cisalhamento seria apenas uma hipótese do que ocorreu. E que seria necessário contar com as outras hipóteses, que seriam o esmagamento e a flambagem. No caso de Praia Grande, segundo Santos Junior, aconteceu uma combinação dessas duas.
Para ocorrer o cisalhamento de um pilar é necessário existirem cargas horizontais relativamente altas atuando na estrutura. Esse tipo de ruína é muito comum em vigas, onde a carga principal é perpendicular ao elemento.
No caso de pilares, a carga atua verticalmente. Como ocorreu uma ruína na ponta [no caso do prédio de Praia Grande], o concreto foi esmagado e as armaduras flambaram. Hildebrando Pereira dos Santos Junior, engenheiro de estruturas
A ruptura estrutural por flambagem é quando uma estrutura se quebra porque se dobrou sob a ação de uma força de compressão. Essa força pode ser causada pelo peso da própria estrutura, pelo vento ou por outras cargas. Imagine uma régua fina e comprida. Se você pressionar a régua no meio, ela vai se dobrar. Isso é um exemplo de ruptura estrutural por flambagem. No caso do prédio, foram as armaduras (barras de ferro) que sofreram o processo de flambagem, como explica o professor.
Já o cisalhamento é um tipo de deformação que ocorre em um material quando ele é submetido a esforços de corte. Isso acontece quando uma força é aplicada perpendicularmente à superfície do material, como um corte com uma faca. Essa força pode ser causada por vento, terremotos ou até mesmo o peso da própria estrutura.
Quando um material é submetido a esforços de cisalhamento, as camadas da sua superfície deslizam umas sobre as outras, resultando em uma deformação transversal. Isso pode levar ao aparecimento de trincas e à perda de resistência do material. O que não é o caso do edifício em Praia Grande, segundo Santos Junior.
Investigação das causas
O que causou o recalque dos pilares centrais ainda precisa ser investigado, avisa o professor, pois podem existir uma série de fatores. Desde a colocação irregular de sapatas sob a construção, até a ausência de estudos sobre a composição do solo e erros durante o projeto ou a obra.
Na opinião da diretora do Crea-SP, entre as possibilidades de falha que podem ocasionar o rompimento dos pilares estão problemas no projeto, com cálculos e projeções imprecisos; problemas na execução da obra, ou seja, se o que foi construído está em conformidade com o projeto; e problemas durante o uso do edifício, ou seja, intervenções e reformas em desconformidade com o projeto executado.
Escoramento emergencial
A prefeitura de Praia Grande informou, em nota, que segue em andamento o processo de colocação emergencial de mais de 2 mil escoras metálicas nos trechos danificados do edifício. O condomínio protocolou na Secretaria de Urbanismo da cidade o plano emergencial de escoramento, o projeto de recuperação definitiva das estruturas danificadas, além do laudo de condição estrutural da obra.
A ação emergencial pretende reduzir o máximo possível da carga estrutural dos pilares que sofreram o cisalhamento, segundo a Prefeitura. Outra medida colocada em prática com a mesma meta foi o esvaziamento da caixa de água do edifício.
Providenciar o escoramento metálico do edifício foi uma das medidas emergenciais corretas que foram tomadas pela construtora e o condomínio para compensar a perda de resistência dos pilares, segundo Fabiana. Em seguida, será necessário fazer um levantamento de todos os cálculos e descritivos do projeto do prédio, em busca de falhas. E também fazer um estudo para reforço estrutural, tão logo seja possível executar os serviços.
Ao perder um pilar, a carga tende a migrar para os pilares mais próximos e, se eles não suportarem a carga, também se rompem, formando um efeito em cadeia. Quanto mais alto o edifício, mais difícil se torna o escoramento, pois para aliviar a carga, muitas vezes as escoras devem subir vários andares para ocorrer um alívio significativo. Às vezes, elas são colocadas até nas unidades autônomas. Hildebrando Pereira dos Santos Junior, engenheiro de estruturas
Segundo a prefeitura, técnicos estiveram no local e constataram a estanqueidade do sistema de gás encanado. O elevador também passou por inspeção e o resultado foi positivo. Os cerca de 250 residentes fixos do condomínio estão hospedados na casa de parentes.