Pastor prega no Muro das Lamentações e é expulso; por que ato é ofensivo?

Alan Chaves, pastor conhecido na internet por seus vídeos em que aparece fazendo pregação evangélica em locais públicos de grande movimento, foi expulso por judeus enquanto tentava pregar em frente ao Muro das Lamentações, em Israel. O caso foi publicado na rede social do pastor no dia 23 de junho.

O que aconteceu:

Alan e seu filho, Isaque Chaves, estão em viagem missionária para pregar nos EUA e em Israel. Enquanto dizia em inglês "O nome de Jesus é: maravilhoso, conselheiro, Deus forte, Pai da eternidade e Príncipe da paz", com a Bíblia aberta, começou a ser repreendido por judeus que tradicionalmente fazem suas orações naquele local.

No Instagram, Alan publicou: "Nos expulsaram do Muro das Lamentações porque falamos de Jesus. Três judeus nos perseguiram tentando nos agredir". Em outro post ele escreveu: "Em Jerusalém, eu estava dizendo: 'Jesus morreu pelos nossos pecados', mas os judeus não quiseram, antes, porém zombaram e me expulsaram dali."

O vídeo repercutiu negativamente nas redes sociais. Na publicação do pastor, uma mulher comentou: "Mania de invadir espaço alheio"; outra pessoa opinou: "Faltou-lhe ética e preparo missionário".

Desrespeito ao espaço de culto

O rabino Rogério Cukierman explica que o pastor estava em um espaço de culto judeu, e não se deve confundir a autorização para visitação de pessoas de outras religiões com liberdade para a prática de culto que não seja da religião judaica.

Quem quiser ir visitar o Muro das Lamentações precisa respeitar as regras daquele lugar. Alguém ir a uma igreja católica, fazer uma pregação evangélica anticatólica, uma pregação judaica, ou uma pregação muçulmana, não parece ser uma abordagem correta, ao contrário, é uma atitude ofensiva. Rogério Cukierman

André Daniel Reinke, historiador e doutor em teologia com ênfase em história das teologias e religiões, concorda com o rabino e aponta para uma possível confusão da liberdade de pregação em espaço público no Brasil, em virtude da laicidade que vigora no país, com a ideia de que em Israel também funcionaria da mesma forma.

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A praça, no Brasil, é um lugar laico, onde cada um pode apresentar seus pontos de vista, sejam religiosos ou não. Mas o Muro Ocidental, ou Muro das Lamentações, é um lugar levado em alta conta porque é ali que os judeus ortodoxos agradecem pela retomada de Jerusalém e oram voltados para o que seria o antigo Santo dos Santos do templo de Herodes. André Daniel Reinke

Desse modo, de acordo com o historiador, "abrir a Bíblia cristã e pregar o Messias que o judaísmo rejeitou não é evangelizar, é um ato de provocação. Seria como um rabino ir à Basílica do Santo Sepulcro e começar a gritar que Jesus nunca ressuscitou".

Sobre as músicas cantadas pelos judeus que expulsaram o pastor do local, segundo o rabino, uma dizia "nós somos pessoas que acreditam, filhos de pessoas que acreditam e nós não temos ninguém que nos traga a redenção a não ser o nosso pai que está nos céus" e a tradução da outra música cantada pelas pessoas seria "o povo judeu vive e os nossos patriarcas ainda vivem".

Israel não é um país cristão

Com o crescimento da ala evangélica, passou-se a ver com maior frequência bandeiras de Israel sendo incorporadas como uma estética cristã evangélica no Brasil o que, no entendimento do rabino Rogério Cukierman, revela uma confusão e a "criação do judeu imaginário".

Se as pessoas soubessem que em Israel o aborto é legalizado em muitas condições e que todos os hospitais públicos oferecem serviço de aborto, que o exército tem mulheres, que as pessoas vão para a praia fazer topless. Israel não é esse país bíblico e imaginário.

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O historiador André Daniel Reinke também chama atenção para o fato de uma infração que o pastor Alan Chaves cometeu enquanto pregava: "Havia crianças entre os judeus e a lei israelense proíbe o proselitismo de menores de 18 anos. Ele poderia ser deportado por ter feito aquilo."

O rabino diz que em um dos vídeos publicados por Alan Chaves, uma pessoa teria dito em hebraico: "é contra a lei".

De acordo com o rabino, essa confusão faz com que a extrema-direita brasileira, a qual parte dos evangélicos fazem parte, adotem uma narrativa da identidade israelense, ignorando a realidade do Estado de Israel e, segundo ele, tal imaginário leva muitos a "conclusão que, de fato, Israel é um país evangélico, cristão".

O lado masculino do Muro das Lamentações
O lado masculino do Muro das Lamentações Imagem: Getty Images/iStockphoto

Caminhos para o diálogo inter-religioso

Tanto para o rabino, quanto para o historiador evangélico, a postura do pastor foi equivocada e não contribui para o estabelecimento de um diálogo inter-religioso pautado no respeito e na preservação da sacralidade do espaço de culto do outro.

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O rabino explica que o pastor poderia ter procurado grupos judaicos envolvidos no diálogo inter-religioso, mas, "certamente não vai ser no Muro das Lamentações. Vai ser em outro espaço [...] A relação inter-religiosa sempre tem que se dar com uma base de respeito".

André ressalta que sempre houve um respeito entre as religiões e que todos os anos milhares de evangélicos e católicos visitam o Muro das Lamentações e agem de forma respeitosa com o lugar e as pessoas que ali vivem. "Esse cidadão é apenas mais um 'fora da curva' a nos envergonhar".

O que diz o pastor

Alan Chaves disse à reportagem que acredita ter sido expulso "por pregar a mensagem de Jesus, pois outros pregadores são hostilizados em qualquer lugar de Israel se falarem de Jesus abertamente."

"O que fiz não foi um crime, mas o judaísmo maltrata as pessoas pela sua tradição. Fui expulso pelos tradicionais que rejeitaram e rejeitam Jesus [...] Se houvesse cometido crime teria saído de lá algemado".

O pastor disse não ter procurado nenhuma comunidade judaica, pois não estaria aberto ao diálogo inter-religioso. "Se Deus não quiser, não irei mais. Já fui três vezes e fui expulso as três", concluiu o pastor assembleiano.

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