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Família sentiu 'gosto estranho' ao comer bolo no RS; veneno tem sabor?

Suspeita é que Deise Moura dos Anjos tenha envenenado farinha usada em bolo de Natal com arsênio - Divulgação / Polícia Civil Suspeita é que Deise Moura dos Anjos tenha envenenado farinha usada em bolo de Natal com arsênio - Divulgação / Polícia Civil
Suspeita é que Deise Moura dos Anjos tenha envenenado farinha usada em bolo de Natal com arsênio Imagem: Divulgação / Polícia Civil

Do UOL, em São Paulo

16/01/2025 05h30

O envenenamento de comidas causou a morte de oito pessoas no Piauí e no Rio Grande do Sul. No segundo caso, a família notou um "gosto estranho" ao comer um bolo de Natal, segundo a polícia.

Venenos têm gosto?

"Tudo tem gosto", diz químico. "Cheiro e sabor são reações químicas. Quando eles alcançam os receptores olfativos ou gustativos geram uma cadeia de reações no cérebro que faz com que você seja capaz de interpretá-los", explica Ubiracir Fernandes Lima, do Conselho Federal de Química.

Se esse sabor é bom, ou não, depende de quem sente. Mas somos naturalmente inclinados a perceber gostos desagradáveis quando algo não está em condições de ser consumido. "Essas substâncias que chamamos de veneno causam uma sensação de repulsa no corpo, porque são desagradáveis e amargas ao paladar", diz Lima.

Quando o produto é diluído nos alimentos, no entanto, fica mais difícil perceber seu odor e sabor. "Dependendo da quantidade, passa despercebido", explica o toxicologista Rinaldo Tavares, professor de toxicologia clínica da UFF (Universidade Federal Fluminense).

Por isso, ao menor sinal de que há algo errado com a comida, o ideal é parar de consumi-la. "Percebeu um azedo ou sabor que não é normal, não coma mais. Pode estar estragado", afirma Lima.

Relembre os casos

Nora é a principal suspeita do caso de envenenamento e morte de quatro pessoas da mesma família com arsênio, em Torres (RS). A suspeita é que Deise Moura dos Anjos tenha envenenado farinha usada em bolo de Natal com arsênio.

Grandes concentrações da substância foram encontradas no doce e no sangue das vítimas e dos familiares hospitalizados após o consumo, segundo as investigações. Ela está presa temporariamente por 30 dias, com possibilidade de prorrogação pelo mesmo período.

Antes do envenenamento, Deise teria pesquisado "arsênio e similares" na internet. Segundo um relatório preliminar das investigações, as buscas foram descobertas após extração dos dados do celular da suspeita.

Sogro morreu em setembro de 2024, e outras três pessoas em dezembro. No caso mais recente, grandes concentrações de arsênio foram encontradas em um bolo consumido por cinco familiares. As vítimas fatais eram irmãs e sobrinha da sogra da suspeita: Maida Berenice Flores da Silva, 58 anos, Tatiana Denize Silva dos Santos, 43 anos, e Neuza Denize Silva dos Anjos, 65. Zeli dos Anjos, 61, sogra de Deise, também foi hospitalizada, mas recebeu alta, assim como uma criança de 10 anos.

Divergências familiares antigas teriam motivado o envenenamento, ainda segundo os investigadores. "Esta é uma investigação difícil pelo fato de a família ter, segundo os depoimentos coletados, uma convivência muito harmoniosa, (...) mas com divergências causadas basicamente por uma única pessoa", afirmou o delegado do caso em coletiva de imprensa na semana passada, em referência à Deise.

No Piauí, Francisco de Assis Pereira da Costa foi preso sob suspeita de envenenar a família com arroz contaminado por terbufós, inseticida de alta toxicidade. O crime aconteceu no dia 1º de janeiro, após a ceia de Ano-Novo.

A casa onde o crime ocorreu abrigava 11 pessoas. Francisco vivia com sua esposa, Maria dos Aflitos, os seis filhos dela e três netos. As vítimas foram Francisca Maria da Silva, 32 (enteada de Francisco); Manoel Leandro da Silva, 18 (irmão de Francisca); e duas crianças, filhas de Francisca: Igno Davi Silva, de 1 ano e 8 meses, e Maria Lauane Fontenele, de 3.

O padrasto tinha um relacionamento conturbado com os enteados. Segundo o delegado Abimael Silva, Francisco nutria um ódio particular por Francisca Maria, uma das vítimas.

A investigação indicou a presença de veneno no arroz. O terbufós é um agrotóxico de uso restrito no Brasil, autorizado apenas para aplicações agrícolas. Sua comercialização é permitida apenas para produtores rurais devidamente cadastrados e treinados para seu manuseio seguro. Apesar das restrições, há registros de comercialização ilegal de terbufós no Brasil. Ele é vendido irregularmente na forma do chamado "chumbinho", um veneno clandestino utilizado como raticida, segundo a Anvisa. A venda e o uso do "chumbinho" são proibidos e configuram crime, devido aos graves riscos à saúde pública.


Cotidiano