Não confunda com o diabo: quem é Exu, a entidade que gerou polêmica no RS

A realização de uma festa de Exu em um salão paroquial de Vacaria (RS) gerou revolta entre fiéis católicos e abriu um novo capítulo sobre a intolerância religiosa no Brasil. Mas afinal, quem é Exu?

O que aconteceu

A polêmica começou quando o salão paroquial da Igreja Nossa Senhora de Fátima foi alugado para um evento do terreiro de umbanda Ogum Megê e Oxum. O espaço foi utilizado para a celebração do terceiro aniversário do terreiro, mas a divulgação de imagens nas redes sociais mostrando rituais religiosos causou indignação entre católicos da cidade. O caso gerou ataques e acusações de desrespeito, levando até mesmo a associação de Exu com forças malignas.

A discussão evidenciou o desconhecimento sobre Exu, uma das entidades mais importantes das religiões de matriz africana. Diferentemente da visão difundida em setores conservadores, Exu não é uma figura demoníaca, mas sim um orixá no candomblé e uma entidade na umbanda, responsável pela comunicação entre os mundos espiritual e material.

No candomblé, Exu é um orixá, uma divindade ligada ao movimento, à transformação e à comunicação. Ele não incorpora nos fiéis e é considerado o grande mensageiro entre os homens e os demais orixás. Cada casa de candomblé cultua Exu de maneira específica, sendo chamado de Bará em algumas tradições.

Na umbanda, Exu pode ser um orixá ou uma entidade espiritual que incorpora nos médiuns e trabalha ajudando aqueles que o procuram. Ele é visto como um guia que auxilia na superação de dificuldades e na abertura de caminhos, sempre dentro do princípio da reciprocidade.

Muitas das entidades conhecidas como Exus na umbanda são espíritos que em vidas passadas tiveram experiências à margem da sociedade e hoje buscam evolução ajudando os outros. Segundo explicou o babalorixá Marcello D'Ògún Oníré ao UOL, em 2022, Exu é fundamental dentro das religiões afro-brasileiras porque possibilita a comunicação entre os mundos material e espiritual.

É o mensageiro, o orixá que caminha junto de nós, dono dos caminhos e a chave que abre tudo. É o que traz movimento a tudo e é considerado o mais humano de todos.
Marcello D'Ògún Oníré

Leitura equivocada

Uma das principais confusões sobre Exu é associá-lo ao mal. "Isso vem de uma leitura cristã equivocada que demonizou Exu, pois ele lida com as dualidades da vida, com a ordem e o caos, com o caminho aberto e o fechado. Mas ele não é o mal, ele é o equilíbrio", esclarece o babalorixá.

Continua após a publicidade

No candomblé, Exu é uma força da natureza, ligada ao movimento, enquanto na umbanda são espíritos que trabalham na vibração dos orixás. "Os Exus que incorporam na umbanda não são os orixás Exus do candomblé. Eles são entidades que trabalham na linha da esquerda, ajudando as pessoas a lidar com questões da vida material", detalha Oníré.

A visão negativa de Exu tem origem na influência cristã sobre a cultura brasileira. O cristianismo associa figuras ligadas à dualidade, ao caos e ao desafio das normas sociais a imagens do mal. Essa interpretação foi usada historicamente para demonizar religiões africanas, reforçando preconceitos que persistem até hoje.

Exu é movimento, comunicação, transformação. Demonizá-lo é uma forma de racismo religioso. Ele não é bom nem mau, ele apenas faz cumprir o equilíbrio do universo.
Marcello D'Ògún Oníré

*Com reportagem de Splash em 2022

Deixe seu comentário

O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.