Oposição venezuelana se reinventa com cozinhas que oferecem sopas gratuitas aos pobres
Miguel Castillo correu como uma flecha em uma empoeirada rua em um bairro pobre da capital da Venezuela carregando um garoto que se agarrava a ele como se sua vida dependesse disso.
Castillo, um membro do movimento de oposição do país, trouxe o seu filho Tomas, 6, para um refeitório lotado com aproximadamente uma centena de crianças magras sentadas em mesas colocando colheres de sopa com carne e arroz em suas bocas. Tomas, que estava com febre e precisava de comida, precisou de ajuda para chegar ao refeitório devido a uma deficiência que o deixou incapaz de andar.
"Nunca imaginei que meu país se tornaria algo assim", disse Castillo em um dia recente. "Esse é meu jeito de fazer alguma coisa".
Para a oposição da Venezuela, esse é um novo tipo de política – que oferece refeições gratuitas e exames médicos na tentativa de se conectar com os pobres. O objetivo é ajudar a mudar a percepção negativa que muitos venezuelanos têm de uma oposição que não conseguiu influenciar novas mudanças, pois o presidente Nicolás Maduro ainda está consolidado no poder.
Membros do partido Primero Justicia [Primeiro Justiça] criaram uma cozinha de sopas que até agora forneceu 4.000 refeições para jovens pobres em Caracas, enquanto os líderes do partido Voluntad Popular [Vontade Popular] dizem que estão caminhando para fornecer 40.000 por semana, em bairros de toda a Venezuela. A comida é fornecida com a ajuda de empresas locais e venezuelanos que vivem no exterior. Os médicos membros dos partidos de oposição estão dando atendimento gratuito para crianças e idosos.
A inflação na Venezuela deverá superar 2.000% este ano, e estima-se que a economia tenha encolhido em 12%. A escassez de alimentos, medicamentos e bens básicos tornou-se terrível em meio as ações de Maduro para reprimir a dissidência.
"Nossa política está em crise e nossos políticos estão em crise", disse Henrique Capriles, ex-candidato presidencial e organizador da cozinha de sopa visitada por Castillo.
Muitos membros da oposição agora veem sua busca pela relevância política intimamente ligada aos seus esforços para ajudar diariamente os venezuelanos no que o político opositor e médico, Winston Flores, chama de "uma política de soluções".
Em um dia recente, Flores forneceu exames médicos gratuitos em um campo improvisado do bairro, usando o seu celular como lanterna para examinar a garganta de uma mulher idosa.
"Existem algumas pessoas que caminham como zumbis à procura de alimentos e medicamentos", disse ele, acrescentando que a oposição recente oferece outra maneira de fazer política.
O foco crescente nos pobres parece familiar para muitos que já viram políticas similares implementadas por líderes socialistas que a oposição tem lutado por anos para remover do poder.
Durante os seus 14 anos no cargo, o falecido presidente Hugo Chávez lançou inúmeros programas destinados a prestar assistência médica gratuita e serviços sociais aos venezuelanos mais necessitados, enquanto Maduro regularmente promove iniciativas para fornecer comida e moradia.
Capriles nega que os esforços de divulgação se assemelham ao mesmo populismo de Maduro e diz que ele simplesmente continua as políticas que ele implementou como governador do estado central de Miranda de 2008 até 2017.
"Eu não sou o 'político desconectado'", disse ele. "Eu nunca fui um, e nunca estive isolado da realidade das pessoas que eu sirvo".
Mas a oposição descobriu, por conta própria, que fazer discursos inflamados foi ineficiente para fomentar apoio entre o eleitorado venezuelano.
Os partidos de oposição sofreram derrotas contundentes nas eleições governamentais e de prefeito deste ano, deixando os membros divididos sobre como avançar antes da corrida presidencial do próximo ano.
Eles ainda têm que se reunir atrás de um candidato que possa desafiar Maduro, que deverá buscar um segundo mandato de 6 anos.
Mesmo assim, alguns analistas políticos são céticos de que a última estratégia de boa vontade é suficiente para mudar o status quo.
John Magdaleno, diretor de uma consultoria local 'POLITY', elogiou as iniciativas, mas disse que elas não conseguem superar uma crise mais profunda.
"Até que a liderança política possa concordar, as chances que temos de iniciar uma transição para uma democracia são mínimas", afirmou Magdaleno.
Flores, médico e político de oposição, disse que os políticos estão tentando afastar as pessoas de seu "estado catatônico" e estimulando elas a reivindicar os seus direitos.
"Existem soluções para se construir um país melhor", disse ele. "Todos esses grãos de areia se somam e ajudam a aliviar essa miséria, essa necessidade de alimentos, medicamentos e oferecer suporte".
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