Bolsonaro repete antecessores e impõe sigilo em custo de viagem ao exterior
O Ministério das Relações Exteriores decretou sigilo nos custos das viagens feitas pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) nos cinco primeiros meses de governo.
O pedido dos dados, feito pelo UOL por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação), foi negado com a justificativa de que poderia colocar em risco a segurança das operações de futuros deslocamentos do presidente. As viagens, já realizadas, foram, contudo, amplamente divulgadas.
Ao impedir a divulgação dessas informações, Bolsonaro repete seus antecessores, Michel Temer (MDB) e Dilma Rousseff (PT), que também restringiram o acesso aos gastos de seus giros internacionais.
A transparência quanto a esses dados era algo comum durante os sete mandatos de Bolsonaro como deputado federal. Ele declarava os gastos de suas movimentações por meio do sistema de prestação de contas da Câmara dos Deputados.
No pedido feito ao Itamaraty, o UOL perguntou o valor total de gastos e o descritivo das despesas com hotel, passagens aéreas, alimentação e transporte, sem a necessidade de qualquer identificação do esquema operacional das viagens do presidente --apenas os valores.
Apesar da argumentação de que divulgar os custos das viagens ameaça a segurança do presidente, roteiros e locais de hospedagem são amplamente divulgados pelo governo durante as viagens presidenciais. Nomes de hotéis, por exemplo, não são dados somente aos jornalistas que acompanham a viagem. É comum ver manifestantes de apoio e de oposição na porta dos estabelecimentos em que qualquer presidente se hospede.
Bolsonaro já visitou Suíça, durante o Fórum Econômico em Davos, Israel, Chile e duas vezes os Estados Unidos. Na quinta, estará em Buenos Aires, onde será recebido pelo presidente Mauricio Macri.
Um dos filhos do presidente, o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) já divulgou valores de hospedagem do pai em seu Twitter, comparando com os custos de viagens de Dilma.
Segundo a LAI, a classificação como "reservado", estabelecida na recusa do pedido da reportagem, prevê o sigilo durante cinco anos. No caso dos custos de viagens de Bolsonaro, os gastos serão mantidos secretos "até o término do mandato em exercício ou do último mandato, em caso de reeleição".
De acordo com a lei, o Itamaraty teria ainda a opção de conceder acesso aos dados de forma parcial --por exemplo, divulgando apenas os valores totais de hotéis e passagens, sem detalhar onde e como foram gastos. Mas isso não foi feito.
Manoel Galdino, diretor-executivo da Transparência Brasil, avalia que "dizer somente que coloca em risco o presidente não é suficiente para decretar sigilo de uma informação".
"Eles precisariam dizer o motivo pelo qual revelar o gasto com hotel ou passagem aérea, por exemplo, ameaça a vida do presidente. Se fossem os dados de segurança, por exemplo, seria possível entender o sigilo, já que um valor baixo poderia sinalizar uma segurança mais fraca. Mas não é o caso", explica Galdino. "Por que dizer o quanto é gasto com hotel é sigiloso?"
Araújo gastou ao menos R$ 27,4 mil ao acompanhar Bolsonaro
Servidores públicos, inclusive ministros, têm suas contas declaradas no Portal da Transparência, ligado à Controladoria-Geral da União, e no Painel de Viagens, mantido pelo Ministério da Economia. A proposta é de transparência nos gastos com o dinheiro do contribuinte.
As viagens do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, estão declaradas em ambos os sites. O chanceler, além de missões diplomáticas, acompanhou Bolsonaro em suas visitas internacionais.
Segundo o Painel de Viagens, o Itamaraty gastou, entre janeiro e abril deste ano, ao menos R$ 13,8 milhões, com 2.189 viagens nacionais e internacionais --os lançamentos de maio ainda não constam no sistema.
As viagens internacionais de Araújo nesse período somam R$ 47,3 mil. Deste montante, R$ 37,7 mil foram pagos em diárias de hospedagem e R$ 9,5 mil em passagens aéreas --a única passagem declarada foi em Davos. Ainda não entraram nessa conta viagens para Itália, Polônia, França e EUA, esta última com Bolsonaro, realizadas em maio.
Do total gasto pelo chanceler, R$ 27,4 mil foram para acompanhar Bolsonaro. Mas este valor pode ser maior, porque não há valores declarados das passagens de Araújo para os EUA, Israel e Santiago. A equipe do Painel de Viagens foi questionada sobre a falta dos dados, mas não respondeu até a última atualização desta reportagem.
Telegramas de Araújo permanecem secretos
O Itamaraty já havia se recusado a divulgar os telegramas emitidos por Araújo enquanto era funcionário da embaixada brasileira em Washington. No sistema da Lei de Acesso à Informação, no qual é possível consultar todos os pedidos feitos, as solicitações foram negadas --a maior parte delas com a justificativa de que se trata de pedidos "desproporcionais ou desarrazoados".
"Para ser atendido, o pedido não deve 'comprometer significativamente a realização das atividades rotineiras da instituição requerida, acarretando prejuízo injustificado aos direitos de outros solicitantes'", diz a negativa às solicitações.
Por lei, o Ministério das Relações Exteriores deve divulgar, quando solicitados por cidadãos, "telegramas, despachos telegráficos e circulares telegráficas" de ostensivo, com tarja de eventuais informações pessoais ou protegidas por sigilo legal. Para isso, é preciso definir os parâmetros de interesse de pesquisa, como delimitar uma data ou intervalo de tempo para as buscas, o nome de um funcionário ou uma palavra-chave, além dos postos diplomáticos quando necessário.
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