CEO antes do Titan implodir: 'Ninguém vai morrer sob a minha supervisão'
Do UOL, em São Paulo
23/09/2024 14h06
Então CEO da OceanGate, Stockton Rush afirmou em uma reunião em 2018 que "ninguém morreria" sob a supervisão dele. Declaração veio a público após a Guarda Costeira dos Estados Unidos divulgar a transcrição da conversa durante a audiência que investiga a implosão do submersível Titan, em junho de 2023.
O que aconteceu
Declaração do CEO ocorreu durante discussão com funcionário da OceanGate. A conversa foi gravada. Na ocasião, o então diretor de operações marítimas da empresa, David Lochridge, afirmou, segundo a transcrição, que havia feito um "relatório de inspeção de qualidade" que apontava problemas no design e nos testes do Titan.
Stockton Rush, uma das vítimas da implosão, não teria gostado das ponderações de Lochridge. A gravação mostra que o ex-diretor de operações criticou que suas preocupações haviam sido "descartadas" pelos colegas. O documento com a transcrição foi publicado no site da investigação na sexta-feira (20). Mas apenas nesta segunda-feira (23), a Guarda Costeira confirmou à BBC quem eram as pessoas envolvidas naquela reunião de 19 de janeiro de 2018.
"Ninguém vai morrer sob a minha supervisão, e ponto final", declarou o CEO da OceanGate aos questionamentos de Lochridge. "Não tenho desejo de morrer... Acho que esta é uma das coisas mais seguras que farei", afirmou sobre o Titan. Rush continuou dizendo: "Tudo o que fiz neste projeto foi as pessoas me dizendo que não iria funcionar - você não pode fazer isso. [...] Entendo esse tipo de risco, e vou encarar isso de olhos abertos. Posso inventar 50 razões pelas quais temos que cancelar e fracassar como empresa. Não estou morrendo. Ninguém está morrendo sob minha supervisão - ponto final."
Lochridge foi demitido após a reunião. Durante o seu depoimento à Guarda Costeira dos EUA, ele afirmou que levou suas preocupações à Administração de Segurança e Saúde Ocupacional dos EUA. Mas, segundo o ex-diretor de operações, a agência do governo dos EUA foi lenta e falhou em agir. No final de seu depoimento, ele disse que se as autoridades tivessem investigado adequadamente a OceanGate, a tragédia teria sido evitada.
Audiências começaram na segunda-feira (16)
As audiências da Guarda Costeira dos Estados Unidos tiveram início no dia 16 de setembro. O objetivo é investigar as causas da implosão do submersível Titan, da OceanGate, em 2023. As autoridades vão analisar questões prévias ao acidente, examinar a estrutura da embarcação e ouvir testemunhas ao longo das próximas duas semanas.
Objetivo é evitar que casos como o do Titan voltem a acontecer. Jason Neubauer, presidente do Conselho de Investigação Marinha dos EUA, disse no domingo (15) que a ideia é fornecer a agências federais e internacionais as recomendações de segurança necessárias para que "nenhuma família passe por uma perda como esta novamente".
Circunstâncias tornam a investigação complexa para a Guarda Costeira. A profundidade extrema em que o Titan implodiu, por exemplo, dificulta a recuperação de provas, acrescentou Neubauer.
Audiência vai determinar a dimensão de uma eventual negligência. Durante o processo, serão analisados eventos prévios ao acidente, a conformidade do Titan à regulamentação, as qualificações da tripulação, os sistemas mecânicos e estruturais e a resposta à emergência, segundo a Guarda Costeira.
Se a investigação identificar algum crime, o caso será encaminhado ao Departamento de Justiça. Engenheiros e executivos da OceanGate vão ser ouvidos. Entre os convidados, estão o cofundador da empresa, Guillermo Söhnlein. Após a implosão, ele defendeu o presidente da OceanGate, Stockton Rush, morto no acidente. "Sempre fomos muito transparentes com qualquer pessoa que fosse se juntar a nós nas expedições sobre os riscos envolvidos", disse Söhnlein, que deixou a empresa em 2013.
Especialistas já apontaram fatores que podem ter levado à implosão. Entre eles, de acordo com a NBC News, estão o fato de que o submersível de 23 mil libras (cerca de R$ 170 mil, pela cotação atual) foi feito com materiais experimentais, como fibra de carbono, que ainda não foi testada em profundidades extremas. Vale lembrar que os destroços do Titanic estão a cerca de 4 km da superfície do mar.
Vídeo mostra momento em que submersível é encontrado
Um vídeo divulgado pela Guarda Costeira dos Estados Unidos mostra a carcaça do submersível Titan.
Vídeo mostra momento exato no qual destroços são achados. Registro da câmera usada marcam data e hora como 22 de junho, às 15h50. No início da semana, fotos já haviam sido divulgadas pela Guarda Costeira.
Cauda do submersível ficou parcialmente preservada. A carcaça e outras partes do Titan foram localizadas quatro dias após o incidente, em 22 de junho de 2023, por um veículo operado remotamente pelas equipes de busca.
Um piloto e quatro passageiros faziam parte da expedição. São eles: Stockton Rush, presidente da OceanGate; o bilionário Hamish Harding; Shahzada e Suleman Dawood, um empresário paquistanês e seu filho; e Paul-Henry Nargeolet, ex-comandante da Marinha Francesa e considerado um dos maiores especialistas do naufrágio do Titanic.
Essa descoberta levou à conclusão definitiva da perda catastrófica do submersível Titan e à morte de todos os cinco tripulantes a bordo, diz trecho do relatório da investigação. Os destroços do Titan estavam a 3,2 km de profundidade e a cerca de 480 metros do Titanic.
As audiências sobre a implosão do Titan devem acabar em duas semanas e determinar a dimensão de uma eventual negligência. Depois, a Guarda Costeira americana envia o relatório final e recomendações para o governo dos EUA. Se algum crime for identificado, o caso será encaminhado ao Departamento de Justiça.
Especialistas já apontam fatores que podem ter levado à implosão. Entre eles, de acordo com a NBC News, estão o fato de que o submersível foi feito com materiais experimentais, como fibra de carbono, que ainda não foi testada em profundidades extremas. Já se sabe que o veículo implodiu por causa da pressão da água.
Tripulação falou em última mensagem que estava 'tudo bem'
Pouco antes do acidente, quando a embarcação já estava a quase 2.500 metros de profundidade, um dos ocupantes disse estar "tudo bem aqui". As mensagens foram divulgadas pela Guarda Costeira.
Titan e navio Polar Prince trocaram mensagens durante a submersão. A maioria dos textos usa códigos, como "a", que significa "recebi sua última mensagem", e "aa" (abreviação informal do código Morse para "fim da linha"). As duas partes também utilizaram a letra "k" para confirmar que os respectivos sistemas de comunicação estavam funcionando normalmente.
Submersível chegou a ficar 15 minutos sem responder. Às 9h53, o Polar Prince enviou a primeira mensagem perguntando se o Titan conseguia localizá-lo em seu sistema de comunicação. Sem resposta, o navio repetiu a pergunta diversas vezes. O retorno do Titan — "k" — só veio 15 minutos depois, às 10h08.
Polar Prince cobrou retornos melhores do Titan. O submersível, então, justificou a demora na resposta dizendo que havia "perdido" o sistema e as configurações do chat com o navio de apoio. Depois, PH — que, acredita-se, era Paul-Henry Nargeolet, considerado um dos maiores especialistas do naufrágio do Titanic — escreveu: "Está tudo bem aqui".
Última mensagem foi enviada pelo Titan às 10h47. A embarcação avisou ao Polar Prince que havia jogado fora dois pesos de queda — uma prática adotada em submersíveis para torná-los mais leves e, assim, ajudar no controle da flutuabilidade e no processo de descida e subida, por exemplo. Naquele momento, o Titan estava a uma profundidade de pouco mais de 3.300 metros.