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Venezuela acusa Brasil de 'agressão' por veto à entrada no Brics

Do UOL, em São Paulo, e colunista do UOL, em Nova York

24/10/2024 19h56Atualizada em 25/10/2024 08h18

A Venezuela afirmou nesta quinta-feira (24) que o veto do Brasil à entrada do país no Brics "constitui uma agressão" e um "gesto hostil" contra o território liderado por Nicolás Maduro.

O que aconteceu

A manifestação ocorreu por meio de um comunicado assinado por Yván Gil Pinto, ministro das Relações Exteriores da Venezuela. O texto foi divulgado em espanhol e português. O Itamaraty informou que não vai comentar oficialmente a declaração.

Comunicado agradeceu ao presidente russo, Vladimir Putin, pelo convite feito a Maduro para participar da Cúpula do Brics. Liderada em 2024 pelo Kremlin, a aliança teve sua cúpula realizada nesta semana, na cidade russa Kazan. Além de russos e iranianos, fazem parte do bloco África do Sul, Arábia Saudita, China, Índia, Egito, Etiópia, Emirados Árabes Unidos e Brasil. Como apurado pelo colunista do UOL Jamil Chade, a Venezuela chegou a aparecer entre os países com significativo apoio na corrida para fazer parte do grupo.

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No texto, o país apontou que não é apenas a maior reserva energética do mundo. Eles indicaram que também possuem uma "bandeira de valores, princípios e visão de construção de um mundo justo, multicêntrico e pluripolar", e ressaltaram que contaram com o respaldo e apoio de outros países na cúpula para a formalização da sua entrada no bloco. Além da Venezuela, a Nicarágua foi excluída da lista prévia que define os países candidatos a parceiros no bloco.

Venezuela afirmou que a decisão do Brasil "contraria a natureza e postulado dos Brics". O comunicado destacou que a medida mantém o veto que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) aplicou ao país "durante anos". Citando nominalmente o representante da chancelaria brasileira no encontro, na figura do embaixador Eduardo Paes Saboia, o país acusou o veto de reproduzir "o ódio, a exclusão e a intolerância promovida desde os centros de poder ocidentais para impedir, por enquanto, a entrada da Pátria de Bolívar na organização".

(...) [A decisão brasileira] constitui uma agressão contra a Venezuela e um gesto hostil que se soma à política criminosa de sanções impostas contra um povo corajoso e revolucionário, como o povo venezuelano. A Venezuela agracia o Sul e o Leste global com a sua firmeza na defesa da autodeterminação e da igualdade soberana dos Estados. Nenhum estratagema ou manobra concebida contra a Venezuela interromperá o curso da história. Nasce um novo mundo! A Venezuela faz parte deste mundo livre sem hegemonismo.
Comunicado da Venezuela

No fim do texto, o país voltou a apontar que o povo venezuelano "sente indignação e vergonha com esta agressão inexplicável e imoral da chancelaria brasileira (Itamaraty)". Eles ainda acusaram o governo brasileiro de "manter a pior das políticas de Jair Bolsonaro contra a Revolução Bolivariana fundada pelo Comandante Hugo Chávez".

O país ainda declarou que a cúpula foi um "sucesso retumbante". "Felicitamos o Presidente Putin e o seu governo pelas suas contribuições extraordinárias, nas palavras do El Libertador Simón Bolívar, para o equilíbrio universal."

Em entrevista à imprensa na cúpula, Maduro disse que a Venezuela "está há duzentos anos no Brics". Em vídeo compartilhado pelo partido dele, o presidente se apresenta para a opinião pública venezuelana como parte do bloco e cita "superpotências" como a China, Índia e a Rússia, e potências emergentes, como Irã, Turquia e Arábia Saudita. Ele não menciona o Brasil na declaração.

Manifestação é vista com preocupação pelo governo brasileiro

Integrantes do governo brasileiro receberam a declaração da Venezuela com preocupação. Conforme apuração do colunista do UOL Jamil Chade, o esforço do país é ainda o de ser um interlocutor entre a oposição e o regime. Mas o veto e agora a resposta de Caracas são considerados como fatores que podem afastam essa possibilidade para o governo Lula.

Ao mesmo tempo, o Palácio do Planalto considerava que o preço a ser pago pela adesão da Venezuela, principalmente com eleições municipais pelo país, seria elevado.

Numa ala do governo brasileiro, a atitude de Vladimir Putin de convidar Maduro para o evento foi visto com surpresa. Diplomatas do Itamaraty que estavam em Kasan não foram informados sobre a viagem e uma lista de convidados que circulou entre as delegações não incluía o presidente venezuelano.

Oficialmente, a Presidência do Brasil não comenta a atitude de Caracas. O Itamaraty também informou que não vai comentar oficialmente a declaração da Venezuela.

O UOL apurou que o governo da Venezuela ainda ficou irritado com parceiros regionais que, apesar do veto brasileiro, aceitaram o convite para aderir ao Brics.

O Brasil defendeu a entrada de Bolívia e Cuba. Nenhum desses países eram as preferências do Itamaraty para a adesão. O Brasil queria Colômbia e Angola. Mas ambos declinaram o convite de Lula.

No Brics, Brasil denunciou 'genocídio' em Gaza e chamou o Ocidente de conivente

O chanceler brasileiro, Mauro Vieira, usou seu discurso nesta quinta-feira (24) na cúpula do Brics para criticar os governos ocidentais. O chefe da diplomacia brasileira, sem citar o nome dos norte-americanos ou europeus, alertou para envolvimento de potências fora do Sul Global nos ataques contra Gaza. Ele ainda qualificou a situação como um "genocídio contra o povo palestino".

O discurso ocorreu durante a reunião dos governos do Brics com países convidados, em Kazan. Vieira participou do encontro no lugar do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que sofreu um acidente doméstico e não pôde viajar. No primeiro dia do encontro, no início da semana, Lula participou por videoconferência e também denunciou a situação em Gaza. Mas Vieira elevou o tom das críticas contra as potências e contra Israel.

O chanceler lembrou que, em outubro de 2023, foi o Brasil quem propôs pela primeira vez uma resolução no Conselho de Segurança da ONU sugerindo um cessar-fogo, rejeitada "pelo veto de um único país". A referência era aos EUA. Vieira ainda listou as ações dos países do Sul Global pela paz no Oriente Médio.

"Enquanto isso, o papel desempenhado por outros países tem sido no mínimo decepcionante, para não dizer conivente", disse. "Os que se arrogam os defensores dos direitos humanos fecham os olhos diante da maior atrocidade da história recente", afirmou, em uma referência indireta aos europeus, norte-americanos e outros governos ocidentais.

Cúpula denunciou Israel, omitiu Hamas e poupou a Rússia

a declaração final da cúpula do Brics fez duras denúncias contra o governo de Israel, omitiu o Hamas e poupou o governo Putin devido à invasão da Ucrânia. O bloco é formado hoje por governos como o do Irã, apontado como um financiador e aliado do Hamas e do Hezbollah.

O bloco não tomou posição sobre a guerra entre Ucrânia e Rússia e, na declaração final da cúpula, o texto apenas cita que cada país mantém suas posições nacionais, sem dizer quais são. "Recordamos as posições nacionais relativas à situação na Ucrânia e em seus arredores, conforme expressas nos fóruns apropriados, incluindo o Conselho de Segurança da ONU e a Assembleia Geral da ONU", afirmou.

"Enfatizamos que todos os Estados devem agir de forma consistente com os Propósitos e Princípios da Carta da ONU em sua totalidade e interrelação. Observamos com apreço as propostas relevantes de mediação e bons ofícios, visando uma resolução pacífica do conflito por meio do diálogo e da diplomacia", diz a declaração, sem qualquer referência explícita à invasão por parte de Putin.

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