Venezuela está entre mais votados para entrar no Brics; Lula sinaliza veto
A Venezuela aparece entre os países com significativo apoio na corrida para fazer parte do Brics, ainda que entre os candidatos latino-americanos a liderança seja de Cuba. O Brasil insiste que todas as decisões do grupo precisam ser tomadas por consenso, e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sinaliza um veto ao governo de Nicolás Maduro.
Na agenda da reunião da cúpula que ocorre nesta semana, consta a criação de um grupo de membros associados, que participariam de praticamente todas as reuniões do bloco, mas não teriam poder de veto. A ideia é a de que o grupo conte com dez países. Mas 30 governos disputam essas vagas. Mas o processo negociador foi concluído sem que uma lista definitiva tenha sido estabelecida.
Lula não viajará por conta de um acidente doméstico que sofreu no fim de semana. A delegação brasileira será chefiada pelo chanceler Mauro Vieira, enquanto o presidente participará por videoconferência.
Orientação do governo Lula
No Itamaraty, a orientação recebida a partir do Palácio do Planalto era de aplicar um veto à candidatura da Venezuela, já que nem sequer reconheceu o governo Maduro. O Brasil também considera que, mesmo que fique sozinho na rejeição aos venezuelanos, o país deveria ter um peso maior na decisão, já que se trata de uma candidatura de um sul-americano.
Mas negociadores estimam que uma decisão apenas será tomada quando os líderes se reunirem e a pressão é intensa.
Para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a situação cria uma saia-justa. Sua aposta pelo fortalecimento do Brics passa por uma relação de aliança, principalmente com a China. Um racha dessa natureza pode ser vista como uma primeira crise interna no bloco.
Grupo associado ao Brics
Todos do Brics aceitam a ideia de estabelecer uma nova categoria de membros, porém há uma disputa entre os candidatos. O Brasil não conseguiu convencer Colômbia e Angola a se apresentarem e passou a apostar na eleição de Cuba e Bolívia.
Fazendo uma forte campanha nos bastidores, a Venezuela ganhou o apoio de China, Rússia e Irã, países que reconheceram a vitória de Maduro na eleição de julho.
Há poucos meses, o governo russo enviou uma carta aos países do Brics, pedindo que cada um deles colocasse o nome dos governos que queriam ver no bloco. O Brasil se recusou a responder, alegando que a prioridade era estabelecer critérios para as futuras adesões.
Mesmo assim, o Kremlin foi adiante com a lista e, nela, a Venezuela consta como um apoio importante. Segundo o UOL apurou, o país com mais apoio foi a Turquia. Argélia é outro destaque, ainda que enfrente a resistência dos sul-africanos. Entre os candidatos latino-americanos, porém, ninguém supera o apoio recebido por Cuba.
Brasil insiste que quer critérios
A decisão sobre quem entra no grupo de parceiros do Brics será tomada pelos líderes. Nos trabalhos de negociação, a diplomacia brasileira insistiu que o foco é no estabelecimento de critérios. O processo que está sendo concluído não envolve a criação de uma lista de convidados.
Numa coletiva de imprensa, na sexta-feira, o presidente russo e presidente do Brics em 2024, Vladimir Putin, insistiu que "as portas estão abertas". "Não estamos barrando ninguém", disse. Segundo ele, 30 países querem uma cooperação maior com o Brics. Para ele, a expansão vai "aumentar a autoridade do Brics". "Atrás de cada um deles tem seus aliados", disse.
Putin rejeitou a ideia de que o bloco seja uma oposição ao Ocidente. "O que distingue Brics é que o bloco nunca foi contra alguém. Não é um grupo anti-Ocidente. É só um grupo não ocidental", insistiu.
Tensão no Brics
A tensão entre os principais atores do Brics também ficou evidenciada na Assembleia Geral da ONU, em setembro. Num encontro entre os chanceleres do bloco, um desentendimento sobre as referência à reforma do Conselho de Segurança da ONU levou o ministro russo Sergei Lavrov a se levantar, encerrar a reunião e deixar a sala.
A reunião ministerial do Brics terminou, pela primeira vez, sem a adoção de um comunicado final conjunto, numa sinalização explícita das dificuldades do bloco diante de sua expansão.
No ano passado, quando o Brics foi alvo de uma expansão, o Itamaraty demonstrou preocupação sobre o que isso poderia significar para a coesão do bloco. Também havia o temor de que, com novos membros, haveria um bloqueio ainda maior sobre uma posição conjunta em temas como a reforma do Conselho.
Por isso, negociou como critério que os novos membros teriam de apoiar a expansão do órgão com a inclusão explícita de Brasil, Índia e África do Sul como candidatos.
Essa garantia de apoiar as ambições do Brasil foi a moeda de troca que o Itamaraty estabeleceu: aceitaria a entrada de novos membros, com a condição de que todos assinassem a reivindicação brasileira por uma vaga permanente.
Naquele momento, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irã passaram a fazer parte do bloco, além dos sauditas que ainda avaliam a adesão.
Mas, em Nova York, Egito e Etiópia rejeitaram apoiar o documento da reunião que, mais uma vez, citava as aspirações do Brasil e de seus aliados para a entrada no Conselho. Os dois novos países do Brics alegaram que não tinham autorização para assinar um documento que indicava o nome da África do Sul como candidata à vaga no Conselho.
Entre os africanos, existe uma acirrada disputa sobre quem seriam os representantes do continente em uma eventual reforma do Conselho de Segurança. A União Africana, por exemplo, apenas fala da necessidade de que o novo Conselho tenha dois membros permanentes da África e mais dois assentos para não-permanentes.
O Brasil, ao lado da Índia, argumentou que esses eram os critérios para a adesão ao bloco e que, portanto, esses novos países não poderiam, agora, se dissociar ou rejeitar esse trecho do texto.
Segundo diplomatas, o primeiro mal-estar dentro do bloco começou há poucas semanas quando, numa reunião na Rússia, as referências explícitas ao Brasil, Índia e África do Sul foram substituídas por "países do Brics" como aspirantes às vagas no Conselho. A retirada do nome do Brasil gerou insatisfação dentro do Itamaraty.
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